Valor Econômico
A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a tributação dos combustíveis tem um importante caráter simbólico, avalia-se na área econômica. Ficou claro à Esplanada que a pasta não cederá recursos a cada nova demanda de “bondade” que surgir, pois isso seria negativo para a credibilidade da política fiscal.
Na solução anunciada na terça-feira, o retorno parcial dos tributos federais sobre gasolina e etanol será compensado com a cobrança do Imposto de Exportação sobre os embarques de óleo cru.
Sabe-se no Ministério da Fazenda que a solução não é a ideal e gerará ruído, especialmente a partir das empresas do setor.
A literatura econômica recomenda que esse tipo de medida não seja adotado por prazos muito longos, pois gera distorções na economia. No entanto, o plano é que essa tributação vigore por quatro meses apenas.
A medida é, além disso, polêmica. A economista Elena Landau, que em 2022 formulou o programa econômico da candidata Simone Tebet, disse que o governo copiou o modelo da Argentina. Já o economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, avaliou que a medida não levará nenhum investidor a se desfazer de ações da Petrobras e tampouco deve tornar-se um precedente.
Na avaliação da equipe econômica, essa fórmula permite onerar o setor produtor de petróleo sem que o impacto seja repassado para o consumidor brasileiro. Isso porque o petróleo e seus derivados que serão produzidos ou importados nos próximos quatro meses já estão contratados. O mesmo ocorre com parte do petróleo que será exportado nos próximos quatro meses. Assim, não é esperado grande impacto nos embarques de óleo cru.
Havia a opção de taxar os ganhos extraordinários obtidos pelas petroleiras no pós-pandemia, a exemplo do que foi feito na Europa. No entanto, avaliou-se que essa medida acabaria sendo repassada aos consumidores.
Outras três opções estavam sobre a mesa, conta uma fonte. A primeira seria prorrogar novamente a desoneração de combustíveis. Haddad e sua equipe argumentaram, nas discussões internas do governo, que essa opção equivaleria a repassar a conta aos contribuintes em geral. E forçaria cidadãos que nem têm carro a pagar em parte a fatura da “bondade” aos consumidores de gasolina e álcool.
Além de tudo, essa opção manteria em vigor uma medida do governo de Jair Bolsonaro que consideram equivocada.
A medida onera mais os que têm renda mais baixa e vai na contramão das políticas ambientais mais modernas. Desonerar gasolina corresponde a subsidiar o consumo de combustível poluente.
A outra opção seria repassar a conta ao consumidor, reinstituindo integralmente os impostos federais sobre gasolina e etanol.
Nesse ponto, pesou o quadro político. Avaliou-se que a população ainda está muito dividida entre apoiadores de Lula e de Bolsonaro. Nesse cenário, tornou-se importante para o governo preservar o apoio da classe média, o grupo que oscila entre um e outro polo político. Por isso, houve cuidado para provocar o menor impacto possível na ponta consumidora.
Uma terceira opção seria passar a conta para a Petrobras. Ou seja, reduzir os preços dos combustíveis e manter o impacto da tributação na empresa, de forma que o consumidor nem sentiria a volta dos impostos.
A dúvida, nesse caso, era quanto os preços poderiam ser reduzidos dentro das normas atualmente adotadas pela estatal.
Citada várias vezes por Haddad, reportagem publicada pelo Valor na última segunda-feira trouxe especialistas dizendo que os preços da Petrobras poderiam cair de R$ 0,25 a R$ 0,28 dentro da política de Paridade de Preços Internacionais (PPI) adotada pela empresa. No entanto, o corte anunciado ontem pela estatal ficou menor: R$ 0,13.
Foi uma redução insuficiente para acomodar a volta da tributação sem impacto na ponta. E, àquela altura da discussão, não foi feita pressão por um corte maior. Todo cuidado foi tomado para não haver uma invasão, pelo governo, na governança da empresa. Os limites foram estritamente observados, afirmou a fonte.
Esse ponto, porém, será discutido proximamente, com a criação de um grupo de trabalho que avaliará a aplicação do PPI.
O governo anunciou na terça-feira que voltaria a cobrar hoje o PIS/Cofins sobre gasolina e etanol. A tributação havia sido zerada no ano passado, a elevado custo fiscal, quando o então presidente Jair Bolsonaro estava em desvantagem na corrida eleitoral. Seria reinstituída em 1º de janeiro deste ano. No entanto, por pressão da ala política, a volta dos combustíveis foi adiada para hoje.
O retorno dos impostos não foi total. O PIS/Cofins sobre a gasolina ficou em R$ 0,47 (era R$ 0,69) e o do etanol, em R$ 0,02 (para respeitar o diferencial de R$ 0,45 em relação à gasolina, estabelecido na Constituição). Ao mesmo tempo, a Petrobras cortou os preços na refinaria, de forma que o efeito final foi um aumento de R$ 0,34 para a gasolina. A tributação sobre o etanol subiu menos do que a da gasolina, para estimular o consumo do combustível ambientalmente sustentável.
Para compensar a tributação menor do que o esperado, será cobrado o Imposto de Exportação de 9,2% sobre embarques de óleo cru durante quatro meses. A arrecadação estimada é de R$ 6,6 bilhões.