Projetos de hidrogênio verde travam sob impasse de quem pagará a conta

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Aneel cobra aumento de contrapartidas de empresas e quer dividir financiamento dos projetos com ANP; há pressão pela entrada de instituições como Finep e BNDES

Folha de S. Paulo 

Mais de uma dúzia de projetos para instalação de unidades de hidrogênio verde no Brasil está paralisada à espera de uma definição sobre quem, afinal, vai bancar a conta dos empreendimentos, estimada em mais de R$ 1, 4 bilhão. O impasse envolve a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e a ANP (Agência Nacional de Petróleo).

Em dezembro, a área técnica da Aneel aprovou 13 projetos de plantas de hidrogênio verde. Foi o primeiro pacote no país voltado para a produção do insumo, que é visto como uma das principais promessas para substituir combustíveis fósseis e reduzir emissões de gases de efeito estufa.

A previsão era que R$ 1, 119 bilhão do valor total saísse do Programa de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Aneel, um fundo que é bancado com recursos recolhidos pelo consumidor de energia, por meio da conta de luz. Os demais R$367 milhões seriam investidos diretamente pelas empresas, como contrapartida de cada projeto. O plano era iniciar as construções neste ano.

O diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, porém, pediu vistado processo por entender que os projetos consumiriam cerca de 30% dos recursos de pesquisa recolhidos pela agência pelo prazo de até quatro anos.

A avaliação foi que se trata de um valor alto para bancar projetos que, na prática, estariam mais atrelados a setores como siderurgia, indústria alimentícia e petroquímica.

Outra queixa diz respeito ao baixo nível de contrapartida das empresas. A maior parte tem contrapartidas entre 10% e 13%, sendo o mínimo exigido pelo edital de 10%. Apenas a Petrobras tem uma participação maior, com 52% de recursos diretos. Na média, o aporte das empresas ficou em torno de 24, 7% do valor total.

Um terceiro fator diz respeito ao papel de cada agência. Uma lei de 2024 delegou à ANP a regulação do hidrogênio de baixo carbono, enquanto a Aneel seguirá responsável apenas pela parte relacionada ao uso da eletricidade na produção desse hidrogênio.

Além de cobrar o aumento das contrapartidas, a pressão é para que novas fontes de financiamento entrem na equação para bancar os projetos, como a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), além da própria ANP.

O tema é acompanhado de perto pelo setor. “Terei reunião na próxima semana para tratar desse assunto com a Aneel. São projetos muito importantes para o setor elétrico, afinal essas áreas são eletrointensivas”, diz Fernanda Delgado, diretora-executiva da ABIHV (Associação Brasileira da Indústria de Hidrogênio Verde).

“Essas inovações só têm a acrescentar ao setor elétrico, porque não concorrem. Pelo contrário, só trazem inovação e desenvolvimento a todo o setor”, completa.

Para entrar em acordo, as duas agências reguladoras avaliam a possibilidade de publicar uma portaria conjunta para coordenar recursos, além de ranquear os projetos mais relevantes.

A ANP disse acompanhar “estreitamente as discussões sobre o desenvolvimento de projetos de hidrogênio de baixo carbono” e manter diálogo com a Aneel para avaliar possíveis sinergias.

Dentro de seu setor, a ANP afirmou que já tem portfólio com 35 projetos e mais de R$ 420 milhões investidos na temática do hidrogênio, recurso que sai da obrigação das empresas do segmento investirem 1% da receita bruta em projetos de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação.

“Quanto às tratativas entre a ANP e a Aneel, a ANP segue à disposição para aprofundar eventual proposta para estabelecimento de portaria conjunta, que vise à coordenação de esforços e a otimização da aplicação de recursos de PD&I, sempre com foco no avanço tecnológico e na competitividade do setor energético brasileiro”, afirmou a agência do setor de petróleo e gás.

A Aneel disse que seu diretor-geral, Sandoval Feitosa, tem se reunido com as empresas dos 13 projetos, com a ANP e com órgãos de fomento (BNDES e Finep), para avaliar “eventual potencialidade de melhorar a efetividade dos incentivos providos pelo Programa de PD&I Aneel e ampliar as contrapartidas”.

Petrobras é dona do maior projeto, que prevê a construção de uma planta-piloto para produzir hidrogênio de for ma integrada a uma refinaria de petróleo da empresa, no Rio de Janeiro, para uso do insumo pelo setor petroquímico.

São R$ 497 milhões nessa iniciativa, dos quais R$ 259 milhões serão injetados como contrapartida pela petroleira.

A Neoenergia, que é dona da Itapebi Geração de Energia, hidrelétrica na divisa da Bahia e Minas, teve quatro projetos aprovados. Três projetos da China Three Gorges (CTG Brasil), dona da Rio Paraná Energia, também passaram pelo crivo da comissão. A meta é erguer plantas em Mato Grosso do Sul e Pernambuco.

A Eneva, que atua na extração de gás no Maranhão, teve sinal verde para tocar duas plantas-piloto, em São Paulo e no Ceará. À unidade cearense deve se voltar para a produção de hidrogênio que ajude na descarbonização da indústria de alimentos, enquanto a base paulista mira a produção do insumo para usos múltiplos.

Os outros três projetos aprovados pertencem à Cemig, à Eletronorte e a Furnas. O prazo para execução de todos os projetos é de até 48 meses e começa a valer em 2025.

‘Essas inovações só têm a acrescentar ao setor elétrico, porque não concorrem. Pelo contrário, só trazem inovação e desenvolvimento a todo o setor’

Fernanda Delgado

diretora-executiva da ABIHV

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