Perda de ICMS faz Estados acenderem alerta

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Valor Econômico

As mudanças no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em combustíveis, energia e telecomunicações reduziram a arrecadação própria dos Estados em 2022, enquanto as despesas de pessoal, o mais importante gasto corrente dos governos estaduais, avançaram. Incertezas sobre o imposto devem afetar a arrecadação do principal tributo estadual ainda este ano e fazem os governadores buscarem alternativas de recomposição de receitas. No radar de quem observa essas contas, começa a surgir preocupação em relação à situação fiscal dos Estados.

A receita corrente dos 26 Estados e Distrito Federal alcançou no ano passado R$ 1,15 trilhão, com alta de 2,3% reais – descontada a inflação – em relação a 2021. A variação no campo positivo foi possibilitada pelas transferências correntes, que avançaram 13,8% e representaram um quarto da receita corrente. A arrecadação própria, porém, dada pela receita com impostos, taxas e contribuições de melhoria, responsável por 59,1% da receita corrente, caiu 4,7% em termos reais.

O desempenho foi afetado principalmente pelo ICMS, que responde por 76,4% da receita tributária própria do conjunto dos Estados, cuja arrecadação recuou 7,9%. Sempre contra 2021, em termos reais. A evolução do ICMS em 2022 contrasta com a do ano anterior, quando a receita com o imposto avançou 15,2%.

Do lado do gasto, a situação também não foi muito favorável aos Estados. As despesas correntes estaduais avançaram 2,2% em termos reais, puxadas por alta de 5,8% em pessoal e encargos sociais. Esse item representa 55,6% das despesas correntes. Em 2021 havia caído 3,7%. Na conta de despesas de capital, os investimentos avançaram 37,7% em 2022, numa base relativamente alta de comparação. Em 2021 avançaram 86% contra o ano anterior, sempre em termos reais.

Os dados foram levantados pelo Valor com base nos relatórios entregues pelos Estados à Secretaria do Tesouro Nacional, considerando receitas realizadas e despesas empenhadas. As atualizações são pela variação média do IPCA.

Os dados dos relatórios, diz Juliana Damasceno, economista da Tendências, mostram de forma clara os impactos das mudanças de ICMS impostas aos Estados por meio da Lei Complementar (LC) 192/22 e da LC 194/22. O repasse do Fundo de Participação dos Estados (FPE) – que compõem as receitas de transferências correntes -, destaca, contrabalançou um pouco o efeito da redução de ICMS, como reflexo do bom desempenho de arrecadação do Imposto de Renda (IR) pelo governo federal, em razão do resultado de empresas ligadas a commodities.

O efeito das duas leis fica mais claro quando se olha a evolução dos dados no decorrer do ano passado, ressalta. Segundo os relatórios, a receita corrente agregada dos Estados subiu 7,3% no primeiro semestre do ano passado contra igual período de 2021, com estabilidade – alta de 0,1% – na arrecadação tributária própria e queda de 0,6% na receita de ICMS. Na segunda metade do ano passado, porém, a variação da receita corrente foi para o campo negativo, com recuo de 2,1%. A receita de ICMS amargou perda de 14,1% e a arrecadação de tributos caiu 9,3%.

A queda no ICMS no segundo semestre foi generalizada, diz Juliana, com recuo em 24 dos 27 entes e estabilidade nos demais. Em 16 Estados a queda ultrapassou os 10%. “O movimento mostra o forte impacto sobre as blue chips da arrecadação [energia, combustíveis e telecomunicações], que sustentam a receita própria dos Estados.”

Ela lembra que o Estados são responsáveis por boa parte da prestação de serviços em saúde, educação e segurança, áreas que demandam grande capital humano. São áreas que devem pressionar a despesa de pessoal, diz, num momento em que os Estados tiveram suas receitas “minoradas de forma permanente”. Juliana ressalta que para 2023 se espera normalização de fatores atípicos que favoreceram mais a arrecadação até meados de 2022. Além da alta das commodities, a inflação e a retomada após o período mais agudo da pandemia, exemplifica.

Para Juliana, os Estados deverão reagir a esse quadro. Parte disso já foi feita com aumento da alíquota modal de ICMS em pelo menos 12 Estados. A reação vem num momento, aponta, que a União tem restrições para socorrer, em boa parte pela dificuldade fiscal.

Os dados levantados pelo Valor mostram que a despesa com pessoal ganhou ritmo maior na segunda metade de 2022. Enquanto essas despesas cresceram 4,5% de janeiro a junho, no segundo semestre avançaram 7,1%. Represados pela Lei Complementar 173/ 2020, que restringiu reajustes e contratações até o fim de 2021, os gastos de pessoal recuaram 4,8% e 2,2% no primeiro e segundo semestres de 2021, respectivamente, sempre em termos reais, contra mesmos períodos do ano anterior.

George Santoro, secretário de Fazenda de Alagoas, explica que, em razão das restrições eleitorais, os reajustes do setor público foram concedidos em 2022 até abril. O efeito mais cheio dos aumentos aconteceu, portanto, no segundo semestre do ano passado.

“E a despesa de pessoal vai continuar avançando em 2023”, avalia Renê Garcia Junior, secretário de Fazenda do Paraná. Além de demandas por novos aumentos, em razão do longo período anterior sem reajustes e da inflação ainda alta, há a pressão de novos pisos para categorias importantes.

Do lado das receitas, diz Garcia, ainda há definições importantes a serem discutidas no decorrer de 2023. Os Estados defendem a reinclusão das tarifas Tusd e Tust – encargos sobre a distribuição (Tusd) e transmissão de energia (Tust) – na base para o cálculo do ICMS da energia elétrica e a classificação da gasolina como item não essencial. Ao definir como essenciais energia, combustíveis e telecomunicações, a LC 194/22 limitou o ICMS sobre esses itens à alíquota-padrão de cada Estado. São definições, diz, “sujeitas a chuvas e trovoadas”. Mesmo que resolvidas no decorrer deste ano, acrescenta, não deverão ter efeitos na receita de 2023.

Para Garcia, será “impossível” a recuperação de receitas neste ano ao nível de 2022. O Paraná, diz, elevou a alíquota modal de ICMS de 18% para 19%, mas mesmo assim a estimativa é de perda de R$ 7 bilhões em relação a 2022. “O ajuste será feito do lado das despesas”, diz. Ele ressalta, porém, que este ano os Estados ainda enfrentarão o impacto da inflação no custeio e nos insumos para investimentos.

Em razão de base de comparação mais alta, ressalta Santoro, os dados dos Estados deverão mostrar arrecadação em queda ao menos nos primeiros meses do ano. Em Alagoas, diz, houve redução de 20% na receita de ICMS de energia, telecomunicações e combustíveis em janeiro, contra igual mês de 2022. O recuo nominal na arrecadação total do imposto, porém, foi de 3,7%. Segundo ele, a perda não foi pior porque o turismo ajudou.

O quadro para 2023, porém, diz, será desafiador. “Os Estados vão começar 2023 com menos dinheiro em caixa e menos receita, o que tende a estressar um pouco a melhora fiscal conseguida a partir de 2020. Os Estados terão que fazer ajustes.” Em Alagoas, uma das medidas para recomposição de receita foi o aumento da alíquota modal de ICMS de 17% para 19%.

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