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‘A idade da pedra não acabou por falta de pedra. A idade do petróleo irá acabar muito antes que o mundo fique sem petróleo’. A frase, atribuída ao sheik Ahmed Zaki Yamani, ex-ministro do Petróleo da Arábia Saudita, ilustra bem o processo de transformação pelo qual passa a indústria automotiva hoje, tentando descartar o uso da gasolina e do diesel.
Neste cenário, dois novos combustíveis podem fazer do Brasil a grande potência energética mundial.
Foi com a impactante frase acima que o gerente de Engenharia de Processos da Reunion Engenharia, Murilo Borges, iniciou sua apresentação ‘Hidrogênio Verde – Perspectivas e Possibilidades’, na quinta-feira (17), durante o Seminário STAB Industrial, na 29ª Fenasucro & Agrocana, que se realiza em Sertãozinho, no interior de São Paulo.
‘Uma coisa não precisa acabar para começarmos a desenvolver outra. Se o mercado está pedindo soluções sustentáveis, é para lá que nós vamos’, afirmou Borges.
Novos combustíveis: Brasil apresenta grande vantagem competitiva na produção do hidrogênio verde
Um estudo internacional realizado em 2020, projetando qual seria o custo de produção de hidrogênio em 2030, colocou o Brasil no topo do ranking, com o menor custo.
Borges explicou que existem diferentes formas de produzir o hidrogênio. Uma delas é pela eletrólise da água. Mas, para isso, é preciso muita água e eletricidade.
No setor sucroenergético, as principais formas de produção de hidrogênio verde (H2V) são pela reforma do metano, do biometano, do etanol e do bagaço da cana-de-açúcar.
Majoritariamente empregado nas próprias usinas atualmente, o H2V tem um enorme potencial de mercado a ser desenvolvido para o setor automotivo. Com a vantagem adicional de contar com a rede de distribuição nos postos de combustíveis do etanol.
O etanol pode ser convertido em hidrogênio por meio de um processo químico chamado reforma a vapor – quando o etanol, submetido a condições de temperatura e pressão específicas, reage com água dentro de um reator.
A energia decorrente do processo é armazenada em células de combustível, para posteriormente alimentar motores elétricos. Entenda melhor como funciona aqui.
O desafio agora, segundo Borges, é alinhar o desenvolvimento tecnológico com a viabilidade econômica, além de encontrar métodos seguros de armazenamento e de transporte.
Novos combustíveis: inovação brasileira, etanol de segunda geração é ainda mais sustentável
O Brasil também é líder mundial em produção de etanol de segunda geração, o E2G. O biocombustível é produzido a partir do bagaço da cana-de-açúcar.
Ou seja, com uma matéria-prima de baixo impacto ambiental, já que é feito com os resíduos da fabricação do etanol comum e do açúcar.
Trata-se de um combustível com menor pegada de carbono, quando comparado à gasolina e ao diesel.
Durante a 2ª edição do ‘Visão Agro Talk’, o diretor corporativo de Renováveis da Raízen, Luciano Zamberlan, palestrou sobre o tema ‘Desafios e Oportunidades na Produção do E2G’.
A fabricação desse biocombustível tem tecnologia proprietária da companhia e o executivo anunciou a construção de 20 fábricas de E2G acopladas aos seus bioparques até 2030.
A expansão terá um investimento total de R$ 24 bilhões, sendo R$ 1,2 bilhão por planta.
De acordo com Zamberlan, o objetivo da empresa é produzir mais etanol sem precisar plantar mais cana-de-açúcar e, ainda, reduzir a pegada de carbono. Afinal, o E2G é produzido com o reaproveitamento de recursos, minimizando desperdícios e impactos ambientais.
‘É uma alternativa segura, rentável e replicável. Assumimos o desafio de produzir o E2G nos últimos dez anos e, até hoje, teve uma evolução bastante expressiva. Com as 20 fábricas, teremos capacidade para produzir 1,6 bilhão de litros de etanol de segunda geração’, destacou Zamberlan.
A diferença entre o etanol de primeira e o de segunda geração
Quimicamente, o etanol de segunda geração (E2G) é como o etanol de primeira geração (E1G). A diferença está na forma de produzi-los.
O E2G utiliza biomassa vegetal lignocelulósica, reaproveitando resíduos vegetais, como palha, folhas, bagaço, cavaco, entre outros. Na Raízen, essa biomassa é obtida a partir do que sobra do processo produtivo do E1G e do açúcar.
Em resumo, o etanol de primeira geração (E1G) e o açúcar são produzidos a partir da cana-de-açúcar, enquanto o E2G é feito da palha e do bagaço da cana-de-açúcar (resíduos da produção de E1G e açúcar). Os processos de produção são diferentes, mas os usos são os mesmos.
O reconhecimento do etanol de segunda geração se deve, principalmente, ao seu potencial sustentável. Em resumo:
Baixa pegada de carbono – A pegada de carbono é uma medida que avalia quanto um processo produtivo emite de carbono (CO2) ou outro gás equivalente na atmosfera. O etanol de segunda geração tem uma pegada de carbono 30% menor quando comparado ao de primeira geração, e até 80% menor do que combustíveis fósseis, como a gasolina.
Reaproveitamento de resíduos – Por utilizar os subprodutos do etanol comum e do açúcar, o E2G leva ao maior aproveitamento energético da planta (cana), o que resulta em uma maior eficiência agrícola. Traz , ainda, vantagem logística para a empresa fabricante e contribui com a economia circular.
Aumento da produtividade – Como o E2G possui a mesma composição química e usos que o E1G, é possível aumentar sua produtividade em até 50%, sem aumentar o tamanho da área plantada, já que não é preciso nenhuma cana-de-açúcar a mais para produzi-lo.
Além disso, o E2G soluciona uma disputa presente no setor agroenergético sobre o uso da terra agricultável.
Há uma dualidade entre a produção de alimentos ou energia, mas o E2G não cria uma concorrência entre matéria-prima e alimentos, visto que os seres humanos não consomem celulose. Assim, a área de plantio utilizada traz resultados econômica e socialmente favoráveis.
Protagonismo e liderança brasileira – O Brasil está em posição de destaque na produção do biocombustível com relação a outras nações, o que contribui para o desenvolvimento do país e o coloca como um dos representantes do mercado mundial de E2G.