Folha de São Paulo
Opinião – Roberto Furian Ardenghy
O país tem avançado em pontos importantes da agenda político-econômica, como testemunhamos com a aprovação da reforma tributária no final de 2023. Foi um passo importante em razão do potencial de modernização do sistema tributário brasileiro sobre o consumo e uma sinalização positiva para a economia.
Entretanto a busca pelo equilíbrio tributário não pode onerar atividades industriais estratégicas que atraem grandes volumes de investimentos, geram emprego, renda e rompem fronteiras tecnológicas.
Uma medida que afetará negativamente a indústria com desdobramentos em diversos elos da cadeia produtiva é a possível incidência do imposto seletivo no setor de óleo e gás, que está na base de uma infinidade de setores.
A introdução do imposto seletivo terá impacto direto na competitividade do setor, pois o aumento de carga tributária poderá gerar um efeito cascata de ampliação de custos sobre diversos segmentos econômicos. E o resultado certamente será o encarecimento dos preços ao consumidor. Esse novo imposto torna o mercado brasileiro de óleo e gás menos atrativo para os investidores, além de refletir negativamente na balança comercial, já que o petróleo é um dos principais itens de exportação do país.
Na realidade, exportaremos tributo, já que o projeto de lei complementar 68/2024 propõe a incidência do imposto seletivo no petróleo que será comercializado para o exterior. E isso é péssimo para a competitividade do produto e para a economia brasileira.
A indústria de óleo e gás já é altamente tributada, grande pagadora de impostos, além de royalties e participações especiais, taxações estas que têm como objetivo justamente compensar potenciais danos socioeconômicos e ambientais. Portanto, não nos parece fazer sentido imputar mais uma taxação ao setor de óleo e gás, que possui cobrança com objetivos semelhantes.
O setor é impactado com até 70% de carga tributária sobre a renda de óleo e gás, incluindo nesse pacote: 1 – compensações financeiras: royalties e participações especiais; 2 – tributos sobre a renda: IRPJ, CSSL, Cide; e 3 – tributos sobre o consumo: IPI, PIS/Cofins, ICMS e ISS. Somente nos últimos cinco anos, o setor de óleo e gás arrecadou R$ 395 bilhões em royalties e participação especial.
Outro efeito do imposto seletivo recairá sobre projetos de reindustrialização do país. A taxação do petróleo e do gás natural, insumos importantes para as indústrias, acabará por gerar impactos negativos em programas do governo como “Gás para Empregar” e o “Gás para Indústria”.
Além do mercado de gás natural, que sofrerá desestímulo em sua produção, a geração de energia elétrica e a fabricação de fertilizantes também podem ser impactadas porque demandam gás nos processos de geração via termelétricas e na produção de insumos.
O impacto nas cadeias produtivas —e não só na do gás natural— é extremamente prejudicial para a economia do país, traduzindo-se em oneração de preços de bens e serviços, somada a possibilidade de cumulatividade tributária ao longo da cadeia.
A produção de derivados de petróleo (combustíveis líquidos, gás de cozinha, asfalto, borracha, lubrificantes) também sofrerá com a incidência do imposto seletivo. Dada a relevância do segmento de combustíveis para a movimentação da economia, em que todos os setores dependem em maior ou menor medida, a cobrança do novo imposto impactará diretamente os custos de transporte de cargas, fretes, mercadorias e pessoas.
Como podemos ver, a incidência do imposto seletivo sobre a extração de petróleo e gás natural vai contra a essencialidade dos produtos gerados para a matriz energética nacional e gera fortes impactos na economia brasileira. É muito diferente da natureza e do propósito de tributos semelhantes no exterior: sobretaxar produtos nocivos que sobrecarregam os sistemas de saúde, tais como bebidas alcoólicas e cigarros.
A racionalidade e a simplificação que a reforma tributária almeja passam também por evitar a oneração de atividades industriais que são a base para o crescimento da economia do país e a geração de empregos.