O Estado de S.Paulo
O aumento da oferta mundial de petróleo, especialmente com a retomada gradual do padrão das exportações da Rússia a partir do segundo trimestre, e o ritmo menor da demanda global pela commodity, decorrente da prometida imposição de tarifas a produtos importados pelos EUA, devem derrubar o preço do barril do Brent (tipo de óleo que é referência para o mercado brasileiro) neste ano.
Na última segunda-feira, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Países Aliados (Opep+) decidiu aumentar a produção a partir de abril, citando como justificativa “os fundamentos saudáveis de mercado”. Em nota, porém, a Opep+ ressaltou que “o aumento gradual pode ser pausado ou revertido” se isso for necessário.
A associação de produtores informou que aumentaria a produção em 2,2 milhões de barris por dia, ou cerca de 2% da demanda global, até 2026. Isso seria uma boa notícia para os consumidores, que geralmente se beneficiam quando essa fonte de energia custa menos, mas reduziria os lucros dos produtores de petróleo e dos países e Estados onde essas empresas operam.
A decisão teve efeito imediato no mercado e os preços atingiram o nível mais baixo do ano nos EUA: US$ 68,37 por barril na segunda-feira, queda de 2%. Uma ótima notícia para Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, que vinha pressionando por reduções no preço da commodity. A esse valor, em geral, é lucrativo perfurar novos poços nos Estados Unidos, que produzem mais petróleo do que qualquer outro país – muitos outros poços deixam de ser lucrativos quando o petróleo é vendido a US$ 60 por barril ou menos.
Para Kim Fustier, chefe de pesquisas na Europa para petróleo e gás do HSBC, a média da cotação do barril do tipo Brent será de US$ 70 até o fim de 2025. A redução ocorrerá pelo aumento da produção mundial de petróleo – de 102,6 milhões de barris por dia, em 2024, para 103,9 milhões de barris por dia neste ano. Enquanto isso, a demanda global avançará em menor velocidade no período, passando de 102,8 milhões de barris por dia para 103,8 milhões de barris por dia.
IMPACTO DAS TARIFAS. A adoção de tarifas a importados pelos EUA pode provocar uma desaceleração do nível de atividade em vários países e, consequentemente, reduzir a demanda mundial por petróleo. “Há um grande risco de ocorrerem guerras comerciais. Tarifas gerais podem atingir o crescimento global, o comércio internacional e a demanda pela commodity”, disse Eric Lee, estrategista global de energia do Citi. O banco estima que o Produto Interno Bruto (PIB) americano vai desacelerar de uma alta de 2,8%, em 2024, para 1,5% neste ano.
“O setor de energia dos Estados Unidos pode ser afetado por tarifas ao aço importado, um custo importante à indústria americana de petróleo e gás natural, o que poderá aumentar os preços de derivados aos consumidores do país”, diz. Ele estima que a cotação média do barril do Brent baixará de US$ 68, no segundo trimestre, para US$ 60 entre outubro e dezembro.
O governo americano já adotou tarifas de 20% sobre importados da China. Taxas de 25% sobre o aço exportado por diversos países aos EUA começarão a valer este mês. Donald Trump também implementou uma alíquota ao redor de 25% sobre automóveis fabricados no exterior, embora tenha adiado por um mês a sua vigência para veículos feitos no México e no Canadá – que promete voltarão a ser aplicadas em abril.
Essa política comercial tem impactos diretos na produção industrial da Europa e da China, e terá efeitos na demanda global de diesel e gasolina, destacou Joel Hancock, analista de petróleo do banco Natixis. “A menor atividade das fábricas nesses mercados atingirá a renda real dos consumidores, o que diminuirá suas compras de gasolina.”
As tarifas a importados deverão elevar a inflação nos EUA, reduzindo a capacidade de aquisição de derivados pelos seus cidadãos, diz Hancock. “O consumo de gasolina no país representa 10% de toda a demanda global de petróleo. Qualquer grande impacto nesse mercado pode ter efeitos sobre a tendência da demanda mundial do petróleo”, disse.
Para o Natixis, o CPI (Índice de Preços ao Consumidor) dos EUA terá uma pequena redução neste ano, passando de 2,9%, em 2024, para 2,6%. Isso deve levar o Federal Reserve (Fed, o BC americano) a cortar juros somente em setembro e dezembro.
FATOR CHINA. A tendência de menor demanda global por petróleo ante a oferta mundial neste ano também decorre das dificuldades econômicas da China, que poderão ser agravadas pela adoção de tarifas pelos EUA às suas exportações. “As tarifas causam incertezas, especialmente para investimentos em novas fábricas na China, que ficaram mais arriscados agora e podem ser o fator de maior repercussão negativa à sua economia no curto prazo”, comentou Jim Burkhard, vice-presidente da S&P Global Commodity Insights.