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Em vez de importar o carro elétrico a bateria, devemos desenvolver um modelo centrado no etanol em benefício da nossa economia e meio ambiente, escreve Sergio Balaban

Poder 360

‘Tudo aqui é importado, tudo, o relógio, o gravador. E quando não importado, é copiado do original que vem de fora. E o resto mais é importado, o café é importado, a cana de açúcar é importada, o eucalipto é importado, os carros são importados?’.

A frase de Tom Jobim, em uma de suas últimas entrevistas, em novembro de 1994, não poderia ser mais atual. Infelizmente, quase 30 anos depois, o Brasil segue o mesmo padrão quando, em meio à transição energética, discute incentivos para substituição da sua frota de carros flex por elétricos a bateria, os queridinhos da indústria automobilística na Europa, China e EUA.

Os carros flex, que representam cerca de 85% da frota de veículos leves, colocariam o Brasil muito à frente dos outros países, considerando as alternativas de motorização ‘limpas’, se houvesse empenho em dar mais competitividade à produção e ao consumo do etanol. De 2022 para cá, seguimos na direção oposta ao incentivarmos os combustíveis fósseis.

Esse incentivo se evidencia na nova política de preços da Petrobras, com valores abaixo do mercado internacional. Como gasolina e etanol são concorrentes, o etanol perde competitividade. O setor sucroenergético ainda não se recuperou do trauma dos primeiros anos da década passada, quando houve a tentativa de controlar a inflação de forma artificial, segurando os preços dos combustíveis, provocando uma enorme quebradeira de usinas.

No 1º trimestre deste ano, o valor das vendas de combustíveis fósseis foi o maior da história, enquanto despencou o consumo de etanol. É o lema do Proálcool, ‘o álcool é nosso’, às avessas.

Desprezamos o etanol e discutimos diversas propostas de incentivos fiscais para produção, importação e aquisição de carros elétricos a bateria. Adicionalmente, tramitam dezenas de projetos de lei para facilitar ou obrigar a instalação de pontos de recarga para carros elétricos em vias públicas, ambientes residenciais e comerciais.

Como se sabe, a produção dessas enormes baterias envolve um processo de alto impacto ambiental. Além do enorme gasto de água para extração de metais como o lítio, há o grande desafio da reciclagem das baterias e os sérios riscos de contaminação do solo e dos lençóis freáticos se esses equipamentos não forem descartados corretamente.

Em relação ao custo da infraestrutura de abastecimento dos carros elétricos, a Empresa de Pesquisa Energética estima cifras acima de R$ 1 trilhão. Enquanto isso, o país já conta com mais de 40.000 postos de etanol em funcionamento, criando emprego e renda em mais de 1.200 municípios.

Adriano Pires, em artigo recente publicado pelo Poder360, divulgou estudo realizado pela Stellantis, proprietária de 16 grandes marcas automobilísticas, sobre as emissões de CO2 de carros com os seguintes combustíveis: etanol, gasolina C brasileira, e eletricidade com a matriz energética brasileira e a europeia. Os resultados apontam que o etanol deveria estar no centro das políticas brasileiras para a transição energética.

O carro a gasolina, com emissão total de 60,64 kg de dióxido de carbono equivalente (kgCO2e), é o mais poluente. Em 2º lugar, o carro elétrico abastecido com energia europeia, com emissões de 30,41 kgCO2. O carro a etanol e o elétrico abastecido com energia brasileira são os mais limpos. Emitem, respectivamente, 25,79 kgCO2e e 21,45 kgCO2e.

As emissões do etanol podem ser reduzidas em 30% com a adoção do etanol de 2ª geração, e até tornadas negativas com a captura e o armazenamento geológico do CO2 produzido na fermentação do etanol. Ou seja, em breve, o carro brasileiro movido a etanol poderá ser o mais limpo do planeta.

O Instituto Francês de Petróleo também divulgou estudo, em maio de 2022, apontando o carro híbrido movido a Etanol (E85), combustível com mistura de 85% de etanol anidro e 15% de gasolina pura, como mais sustentável que os elétricos a bateria em termos de emissões totais de gases de efeito estufa.

Tecnologias automotivas podem ampliar ainda mais a vantagem do etanol: o motor de alta eficiência (turbo) e a sua evolução para um modelo híbrido. O passo final da evolução seria um grande salto tecnológico, com o uso do etanol em células a combustível para produzir energia para motores elétricos.

O Brasil é atualmente o 2º maior produtor mundial de etanol. Um protagonismo construído desde o século 16, quando a cana-de-açúcar se adaptou à Zona da Mata do Nordeste, em virtude da qualidade do seu solo e do clima tropical, propiciando participação superior a 90% da produção mundial de açúcar na época.

A indústria canavieira foi fundamental para a economia do país ao longo dos séculos, como destaca Celso Furtado, em seu clássico ‘Formação Econômica do Brasil’ (1959). A partir da criação do Proálcool, em 1975, a indústria canavieira tornou-se definitivamente sucroenergética – sua produção foi suficiente para abastecer 94% da frota brasileira.

A transição energética criará oportunidades e custos para a sociedade. Sem dúvida alguma, no caso do Brasil, as oportunidades superarão os custos e, se bem aproveitadas, darão ao país o status de potência econômica e ambiental. Porém, não podemos perder o bonde da história importando os modelos errados, como é o caso dos carros elétricos a bateria.

Na seleção de tecnologias automotivas é preciso ter claro que a avaliação dos riscos ambientais e das emissões de CO2 deve considerar todo o ciclo de vida, desde o processo de produção, passando pela vida útil do automóvel, até a reciclagem ou descarte.

Se contabilizarmos todas essas etapas, não restará qualquer dúvida: importar o modelo de carro elétrico a bateria não é a melhor solução. Devemos desenvolver um modelo centrado no etanol, o Proálcool 2.0, mais afinado com a nossa economia e com o meio ambiente.

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