Brasil é peça-chave para petroleiras na redução de CO2

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Valor Econômico

De olho no movimento de transição energética, as grandes petroleiras europeias – BP, Equinor, Shell e Total – anunciaram este ano compromissos para zerar as respectivas emissões líquidas de carbono até 2050. Figuras presentes nos leilões de petróleo no Brasil, nos últimos três anos, as multinacionais também olham para o mercado brasileiro como peça-chave dentro dos esforços de descarbonização e têm se mantido ativas no negócio de renováveis no país.

BP, Equinor Shell e Total têm montado, aos poucos, as respectivas carteiras de projetos no Brasil. A energia solar desponta como unanimidade, mas biocombustíveis e eólicas offshore – que guardam sinergia com a especialidade das empresas em operar em alto-mar – também estão no radar.

A investida das petroleiras europeias em renováveis se dá em meio à pressão em torno do cumprimento das metas de descarbonização e do olhar dos investidores às empresas que cumprem as práticas de responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês). “A transição energética vai precisar que todo mundo empurre e faça parte da solução, das empresas de energia aos governos, e temos visto uma agenda crescente de investidores e consumidores nesse sentido [ESG]”, disse o diretor de novas energias da Shell Brasil, Guilherme Perdigão.

Nessa equação, as empresas olham, também, para as expectativas de declínio do consumo de petróleo a longo prazo. A Equinor anunciou este mês, por exemplo, que está se preparando para o declínio gradual da demanda da commodity a partir de 2030.

O consumo por petróleo pode ter atingido o pico e nunca mais recuperar os patamares anteriores à pandemia de covid-19. É o que aponta um dos três cenários de transição energética projetados pela BP, no estudo “Energy Outlook” – que aponta para um novo momento na história moderna, marcado pelo declínio petrolífero. Esse movimento será puxado, sobretudo, pela retração do uso de combustíveis no transporte, como reflexo da propagação de veículos elétricos.

Ainda sem uma expertise desenvolvida na área de renováveis, as petroleiras têm recorrido, em alguns casos, a parceiros estratégicos. Assim foi com a BP, que formou uma joint venture com a Bunge no mercado brasileiro de biocombustíveis e com a Lightsource para investimentos em solar. A Shell também cogita parcerias.

“Reconhecemos que trazemos algumas competências, forças que podem ser um diferencial [na transição]. A marca Shell é forte, temos solidez financeira grande, mas ao mesmo tempo estamos começando a desenvolver os projetos no Brasil. Por isso estamos abertos a modelos de negócios 100% Shell ou em parcerias com empresas do setor”, afirmou Perdigão.

A empresa é sócia desde 2011 da Cosan em biocombustíveis, por meio da Raízen. A grande prioridade da petroleira, hoje, contudo, é o negócio de energia solar. A Shell tem em carteira 24 projetos de usinas fotovoltaicas que somam 1,12 gigawatts (GW), com foco em Minas Gerais. A ideia é viabilizá-las por meio de leilões e contratos no mercado livre.

Perdigão disse que o objetivo da Shell é ser uma das maiores comercializadoras de energia do Brasil, uma das quatro regiões prioritárias da empresa em geração de energia, ao lado dos Estados Unidos, Europa e Austrália.

No aspecto regulatório, Perdigão destaca que o Brasil possui um “arcabouço desenhado” e um mercado livre de energia consolidado, mas que vê necessidade de aperfeiçoamentos. Ele defende novos avanços nos limites mínimos para migração de consumidores para o ambiente livre e cita a ausência de uma regulamentação sobre eólicas offshore. O Ibama disponibilizou o termo de referência, com as diretrizes para a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), mas a regulação do setor ainda engatinha.

A Equinor tem planos de se consolidar como líder global no segmento e está atenta aos desdobramentos da regulamentação. A norueguesa iniciou o licenciamento de dois parques (Aracatu I e II), que somam 4 GW no Rio de Janeiro e Espírito Santo. A empresa tem como meta investir entre 15% e 20% do orçamento global em fontes renováveis e de baixo carbono até 2030. A companhia espera atingir uma capacidade de geração de 12 GW a 16 GW em 2035, ante os 0,5 GW de 2019. “É importante reforçar que [a eólica offshore] se trata de um negócio de longo prazo e o Brasil ainda está desenvolvendo a estrutura regulatória”, informou a multinacional, em nota.

O presidente da BP no Brasil, Mario Lindenhayn, afirmou que o ambiente regulatório no Brasil tem mostrado “grandes avanços”, como o programa de biocombustíveis RenovaBio, mas que ainda há “muito espaço para aperfeiçoamento”. ”Um elemento importante nesta equação, que deve ganhar novos capítulos nos próximos anos, é o desenvolvimento e a integração dos mercados globais de carbono”, disse, por e-mail.

Ele citou o potencial do Brasil em ser fornecedor de soluções climáticas naturais – ações de conservação e gerenciamento de ecossistemas – e se tornar um dos maiores centros de créditos de carbono do mundo. A BP é uma das petroleiras mais ativas no processo de transição energética e tem como meta aumentar em dez vezes o investimento anual em energia de baixo carbono, para U$ 5 bilhões, em 2030; e elevar em vinte vezes a capacidade de geração de energia renovável, para 50 GW em 2030.

Lindenhayn destaca a vocação brasileira para os biocombustíveis, setor em que a BP estreou em 2008 e no qual deu novo passo em 2019, ao formar joint venture com a Bunge, que a consolidou como segunda maior produtora sucroenergética do país, atrás da Raízen. “O Brasil tem grande potencial de se tornar economia neutra em carbono, ou de até carbono negativo a custo relativamente baixo.”

A BP monitora também oportunidades em eólicas e tem investido no mercado brasileiro de solar. Em 2019, por meio da Lightsource bp, comprou da Enerlife cerca de 2 GW de projetos em desenvolvimento no Brasil. A companhia aposta tanto nos leilões de energia quanto em geração distribuída.

A Total também monitora o setor. “Com um portfólio de 300 MW em projetos de solar e eólica atualmente em operação ou em construção, a Total Eren desenvolveu uma forte experiência no país e agora busca acelerar seu crescimento, tanto em solar como em eólica, para atender à expansão do livre mercado local”, afirmou o diretor da Total Eren do Brasil, Pierre-Emmanuel Moussafir, em nota.

Os investimentos em renováveis, porém, não são um consenso entre as petroleiras. ExxonMobil e a Petrobras têm defendido esforços de descarbonização por meio de soluções dentro da própria indústria de óleo e gás. O presidente da estatal brasileira, Roberto Castello Branco, repete com frequência que, enquanto os ativos do pré-sal garantem taxa de retorno de 15% a 20%, investimentos em renováveis, menos de 10%.

Em meio às pressões do mercado para que as empresas adotem políticas de sustentabilidade, a Petrobras criou gerência-executiva para tratar de mudanças climáticas. O foco tem sido reduzir a intensidade de carbono das operações da companhia, mas não pretende trabalhar com metas para zerar emissões líquidas no longo prazo.

“Nossa estratégia é olhar para nossa competência, para engenharia de processos, indústria química, em como encontrarmos formas de fornecer soluções”, reforçou a presidente da ExxonMobil Brasil, Carla Lacerda, em setembro.

Um dos principais desafios das petroleiras será fazer a transição sem comprometer a rentabilidade e afastar investidores. “Nossa estratégia passa por continuar sendo uma empresa que atraia investidores e os investimentos só serão feitos se trouxerem retorno adequado”, disse Perdigão da Shell. Ele acredita ser possível atingir entre 8% e 12% de retorno no segmento de energia.

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