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Em 1924, a Usina Serra Grande, em Alagoas, já produzia álcool para abastecer veículos do Nordeste, escreve Bruno Blecher

Poder 360

Pouca gente sabe, mas cerca de 50 anos antes do lançamento do Proálcool, em 1975, o Brasil já produzia e consumia o biocombustível feito a partir da cana-de-açúcar.

Datada de 1925, a foto em preto e branco de um Ford de 4 cilindros, com duas faixas afixadas nas laterais -‘Álcool’ e ‘Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio – Estação Experimental de Combustíveis e Minérios’- é uma das imagens mais antigas da saga brasileira da bioenergia.

Segundo relatos históricos, o ‘fordeco’ participou de uma corrida no Circuito da Gávea, rodando 230 km em prova promovida pelo Automóvel Clube do Brasil. Movido a álcool etílico hidratado 70%, o carro também fez bate-voltas entre Rio e São Paulo, Rio e Barra do Piraí e Rio e Petrópolis.

Um artigo do jornalista Neldson Marcolin na Revista Pesquisa, da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), de março 2018, descreve a conjuntura da época:

‘As primeiras experiências com esse carro ocorreram na Estação Experimental de Combustíveis e Minérios (EECM), organismo governamental de pesquisa que se transformou no Instituto Nacional de Tecnologia em 1933’.

A motivação não era muito diferente da de hoje, explica Marcolin. O então presidente Epitácio Pessoa (1919-1922) reclamava em 1922 da ‘colossal importação de gasolina no Brasil’, aludia ao ‘uso do álcool em seu lugar’ e estimava o ‘amparo que a solução prestaria à indústria canavieira’.

O texto da revista ainda diz que ‘o governo seguinte, de Arthur Bernardes (1922-1926), encomendou à EECM um projeto de desenvolvimento de motores a álcool, que pudesse também servir de base para a legislação sobre o assunto’.

500 réis/litro

Em 1924, a Usina Serra Grande, no município de São José da Laje, em Alagoas, já produzia, em nível experimental, o Usga, biocombustível à base de álcool etílico, éter etílico e óleo de mamona, que em 1927 passou a abastecer centenas de veículos em bombas instaladas no Recife e em Maceió. O biocombustível era vendido a 500 réis o litro, bem mais em conta que a gasolina (900 réis/litro).

Um anúncio de jornal dos anos 1920 mostra um automóvel de luxo sendo abastecido e exalta as qualidades do combustível Usga nacional (iniciais da Usina Serra Grande).

‘Fabricado por Carlos de Lyra & Cia, o pioneiro dos combustíveis nacionais à base de álcool cuja eficiência já está provada em 1 ano de ascendente consumo em Pernambuco e Alagoas. Usar combustível nacional é dever dos bons patriotas’, diz o anúncio.

Divulgação

Na imagem, carro da Ford movido a álcool etílico hidratado 70%, em 1925

De 1920 a 1939, o número de carros, só no Estado de São Paulo, saltou de 5.000 para 43.000, boa parte deles da Ford. A montadora, que se instalou no Brasil em 1919, fabricava 5.000 veículos por ano, em 1924. A GM chegou em 1925.

Em 1931, o governo brasileiro decretou a mistura de 5% de álcool nacional à gasolina importada, o que aumentou a demanda e o preço do biocombustível.

Superada a Grande Depressão (1929-1932), os preços da gasolina despencaram, e o álcool sumiu do mercado, voltando à moda durante a 2ª Guerra (1939-1945), por conta da dificuldade do Brasil em importar petróleo. Em alguns Estados, a porcentagem de álcool na gasolina chegou a 42% nessa época.

Proálcool

Em 1975, o mundo vivia a crise mundial do petróleo, que fez os preços da gasolina e do diesel dispararem. O decreto 76.593 de 1975 criou o Proalcool, o super programa do governo brasileiro para intensificar a produção de álcool-combustível e substituir a gasolina.

No final da década de 1970, segundo a Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia), a produção de álcool atingiu 12,3 bilhões de litros. O Proálcool cumpria a sua missão de reduzir o impacto da crise global do petróleo no Brasil.

Na metade dos anos 1980, porém, o preço do petróleo começou a cair e o do açúcar subir, comprometendo o Proálcool. O álcool combustível ficou menos vantajoso não só para o consumidor como também para o produtor, e o biocombustível começou a faltar nas bombas.

O resgaste do álcool veio em 2003, com o lançamento do 1º veículo flex, capaz de rodar com etanol, gasolina e a mistura em qualquer proporção dos 2 combustíveis.

Hoje, mais de 22 milhões da frota de 34 milhões de veículos do país são flex. Segundo a Unica, o uso do etanol hidratado (utilizado diretamente no tanque dos veículos) e do etanol anidro (adicionado à gasolina) conseguiu evitar mais de 240 milhões de toneladas de gases causadores do efeito estufa.

Esse é um dos benefícios destacados na campanha ‘Vai de Etanol’, lançada na semana passada pela Unica, com anúncios na TV, no rádio e nas redes sociais.

A ideia é mostrar ao consumidor que, ao abastecer seu veículo com etanol, ele contribui para reduzir a poluição e o número de internações e mortes por doenças cardiorrespiratórias. Além disso, ao diminuir o consumo de combustíveis fósseis, o etanol ajuda a atenuar o aquecimento global. E, dependendo da época, é mais barato do que a gasolina.

O Brasil é o 2º maior produtor de etanol do mundo. Perde só para os Estados Unidos. Na safra 2022/2023, o volume produzido no país atingiu 31,2 bilhões de litros.

O setor sucroalcooleiro vê oportunidade para um crescimento maior do consumo. Relatório da IEA (Agência Internacional de Energia) indica que a demanda global de biocombustíveis deverá crescer 22% até 2027, o equivalente a 35 bilhões de litros/ano. Brasil, Canadá, Estados Unidos, Indonésia e Índia vão representar 80% da expansão total do uso de biocombustíveis.

Um estudo do Centro Brasileiro de Infraestrutura mostra que o Brasil tem potencial para liderar a produção mundial de biocombustíveis. Mas para isso é preciso que o etanol (de cana e de milho) tenha mais apoio das políticas públicas no programa de transição energética.

‘Nesses 100 anos de história no Brasil, de forma muitas vezes imperceptível, o etanol esteve por trás de muitos avanços tecnológicos, ganhos econômicos, ambientais e de saúde. O futuro é ainda mais promissor, por ser um excelente carregador de hidrogênio’, diz Plinio Nastari, Mestre e doutor em economia agrícola e presidente da DataAgro.

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