Valor Econômico
Em um mercado que ultrapassou a marca de 200 mil carros elétricos em 2025 e quase triplicou o número de unidades entre o fim de 2023 e de 2024, a demanda por infraestrutura de carregamento disparou no Brasil. Com isso, um mercado até então acessório tomou fôlego e entrou na mira de mais investidores: os pontos de recarga elétrica, eletropostos ou “hub” de recargas.
O ganho de escala da frota tem despertado o interesse de gigantes do setor de energia para esse segmento de mercado, como Vibra e Raízen. Empresas menores e startups, no entanto, continuam presentes, nas diferentes frentes de atuação: há as que fabricam os equipamentos; as fornecedoras da energia elétrica; as que prestam serviço de recarga – como os postos tradicionais -; e as que oferecem os aplicativos para compra do combustível, por exemplo.
“Quando cresce a frota e a preferência do consumidor por veículos plug-in e elétricos ‘puros’, é o momento dessas grandes redes de combustíveis começarem a participar e investir também”, afirma o presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Bastos.
Em fevereiro, o Brasil tinha 2.430 pontos de recarga rápida (tipo DC, que permite carregar um carro em menos de uma hora), mais do que o dobro dos 1.109 de agosto de 2024 (119% de aumento). Cada eletroposto pode ter um ou mais desses pontos.
Já os pontos de recarga semirrápidos (do tipo AC, onde a recarga pode levar algumas horas) somavam 12.397 em fevereiro, alta de 30,4% ante agosto de 2024, mostram estatísticas da ABVE em parceria com a Tupi Mobilidade. Os números consideram apenas os pontos de recarga públicos (sem incluir aqueles em casas e condomínios fechados, por exemplo).
Mercado de recarga era incipiente, mas hoje demanda aqueceu”
— Carlos José Grillo
Foi só a partir de 2024 que os dados passaram a separar os tipos de pontos de recarga, com perfis muito diferentes. A potência de um carregador AC varia entre 3,7 kW a 22 kW, enquanto a do tipo DC pode chegar a 640 kW, de acordo com a capacidade do equipamento. Um carregador mais potente pode custar até R$ 300 mil. Atualmente, quem carrega seu carro paga pouco mais de R$ 2 por kWh.
“O mercado de recarga era incipiente, mas hoje a demanda aqueceu. Agora, a recarga de veículos é um negócio à parte, não depende mais só das montadoras”, afirma o diretor superintendente de digital e sistemas da WEG, Carlos José Bastos Grillo, que produz equipamentos de recarga.
Até pouco tempo atrás, o mercado era mais pulverizado e dedicado aos modelos ACs, com pequenas empresas, formato semelhante ao observado na energia solar. Barros vê uma onda de investimentos em carregadores rápidos.
“O negócio de pontos de recarga é muito pulverizado, por isso é difícil fazer estimativas de expansão. Agora, o crescimento não vai ser explosivo, mas de qualidade, em carregadores rápidos. A democratização com novos entrantes continua, mas entram no mercado também as grandes redes, que são especialistas e fazem abastecimento de combustível líquido”, diz Grillo.
De olho nesse mercado, a Vibra investiu R$ 15 milhões na EZVolt, startup que presta serviço de recarga elétrica. Foram duas rodadas de investimentos: R$ 5 milhões em 2022 e R$ 10 milhões em 2023. Em 2024, a EZVolt faturou R$ 20 milhões.
“Temos Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização] positivo desde março de 2024 e a previsão é que nosso faturamento dobre para R$ 40 milhões em 2025”, afirma o fundador da startup, Gustavo Tannure, que se prepara para levantar mais recursos no mercado. “Nosso mercado cresce exponencialmente. Quanto mais investimento, mais a gente consegue avançar.”
A empresa inaugurou em fevereiro um eletroposto com seis pontos de carregamento rápido na Barra da Tijuca, bairro da zona oeste do Rio. Em visita do Valor, havia uma fila de motoristas.
A unidade é parte do projeto Eletroposto Carioca, fruto do Sandbox.Rio, programa da Prefeitura do Rio para incentivar adoção de novas tecnologias com inovação e sustentabilidade, que tem o apoio da rede de cidades C40 (ler Poder público avança em parcerias no setor).
Vice-presidente executiva de comercial varejo da Vibra, Vanessa Gordilho diz que o carregamento de veículos elétricos é parte da estratégia de plataforma multienergia da empresa. A parceria com a EZVolt, informa, permite oferecer um “portfólio robusto” e contribuir para o futuro do setor.
“O objetivo da Vibra é se tornar um provedor de soluções de recarga elétrica e suprimento de energia no Brasil, por meio de uma rede de recarga pública robusta, disponível e conectada”, afirma ela, ao citar o aumento da demanda em diferentes regiões do país.
Hoje, quase metade (49,6%) dos pontos de recarga está na região Sudeste, com destaque para as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. As regiões Sul (22,2%) e Nordeste (18%) vêm em seguida.
Ao lado da Vibra, a Raízen também se movimenta e investiu R$ 10 milhões, em 2023, na startup Tupinambá, hoje Tupi Mobilidade. A Raízen Power, marca para energia elétrica renovável, ficou com a rede de recarga de veículos elétricos da startup. Procurada, a empresa não deu informações atualizadas sobre este nicho do negócio.
Após a venda da rede, a Tupi se concentrou no negócio de tecnologia, com aplicativo para usuários finais – pesquisa sobre a rede de pontos de carregamento e pagamento – e software de gestão dos carregadores elétricos. Nessa segunda frente, presta serviços para os chamados CPO, ou Charge Point Operator, em inglês, responsáveis pela gestão dos pontos.
“O negócio atrai gigantes, mas também muito negócio pequeno, como um banco, por exemplo”, afirma o fundador e diretor de relações institucionais da Tupi Mobilidade, Davi Bertoncello.
Unidades de varejo como shopping centers, supermercados e farmácias têm investido na aquisição dos pontos de recarga para atrair e aumentar o tempo de permanência de clientes, explica.
Outra frente de atuação no ecossistema de recargas elétricas é a fabricação dos equipamentos, onde a WEG é a única brasileira a operar. O volume de produção aumentou quatro vezes em 2024, ante 2023. Sem informar receita nem investimentos, Grillo diz que o nicho de eletrificação de motores e de aparelhos de recarga tem “participação relevante” na receita da WEG.