Fonte: O Estado de S.Paulo
Estimativa de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) aponta que o óleo que atinge 178 pontos do litoral nordestino teve origem entre 600 e 700 quilômetros da costa, na altura de Sergipe e Alagoas.
O vazamento de óleo que atingiu o litoral do Nordeste pode ter ocorrido em uma região entre 600 km e 700 km da costa, na altura dos Estados de Sergipe e Alagoas. A estimativa foi feita por pesquisadores do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Os cientistas trabalharam com uma tecnologia conhecida como modelagem inversa, que parte dos pontos de chegada das manchas nas praias e faz o caminho para trás, estimando o ponto de origem desse óleo. O estudo foi encomendado pela Marinha à Coppe/UFRJ. Até quarta-feira, 178 localidades haviam sido atingidas pelas manchas, segundo o Ibama.
O cálculo usou como ponto de partida o mapa atualizado pelo órgão ambiental que mostra os dias e locais em que as manchas estão chegando às praias. Considerando condições oceânicas, como correntes marinhas, temperatura da superfície da água e ventos, os pesquisadores desenharam o caminho para trás. Ao cruzar essas trajetórias, eles chegaram a uma região onde provavelmente o vazamento ocorreu. A análise permite estimar também o dia em que houve o acidente: por volta de 14 de junho.
O engenheiro Luiz Landau, que coordena o Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia da Coppe, explica que se trata de uma estimativa, mas busca reproduzir do modo mais fiel possível o evento. “Não sabemos, por exemplo, exatamente a que horas as manchas chegaram à costa, mas, mesmo dentro dessas limitações, testamos vários cenários e chegamos a uma região provável da origem desse óleo.”
O trabalho não indica exatamente um ponto do vazamento, mas uma região provável – um retângulo cujo lado maior tem cerca de 100 km. “Com mais investigação, podemos chegar a um raio menor, mas, para dar uma resposta rápida nesse momento de crise, é o que conseguimos mostrar”, disse o oceanógrafo Luiz Paulo Assad, colaborador do laboratório e professor do Departamento de Meteorologia da UFRJ.
Segundo ele, a análise corrobora informações do governo de que não foi possível ver a mancha antes de as praias começarem a ser contaminadas. Logo após o vazamento, o óleo, ainda bastante fluido, fica na superfície, o que até permitiria sua visualização por satélites. Mas, segundo Assad, há poucos satélites voltados para o alto-mar.
“Depois de um tempo, o óleo sofre com intemperismo e afunda, movendo-se na subsuperfície, o que o deixa invisível para sensores remotos de satélites. Por um momento, que não sabemos quanto, ele de fato ficou visível, mas em região em que não há monitoramento frequente por satélite. Teria de dar sorte de bem na hora estar passando um por lá, mas é quase como achar agulha no palheiro.”
Ele apontou ainda para a necessidade de monitoramento permanente do mar. “Se tivéssemos um sistema de monitoramento de óleo no mar, que evidentemente contaria com a ajuda de instituições de pesquisa e outros segmentos da sociedade civil, a gente poderia ter rotinas de monitoramento que poderiam envolver a aquisição de imagens de regiões em altomar propícias a passagens de embarcações que transportam óleo.” Segundo Assad, o País tem expertise para ter um monitoramento do mar proativo e não reativo, como ocorre agora.
Causa. Pesquisadores acreditam que o mais provável é que tenha ocorrido um grande vazamento neste local, talvez durante operação malsucedida conhecida como ship-to-ship, em que o óleo é transferido de uma embarcação a outra em alto-mar.
O próximo passo, agora, é tentar fazer o caminho oposto e estimar para onde a mancha pode se encaminhar.
Barril é achado; Shell alega venda a terceiros
A Marinha confirmou ontem que o navio patrulha Guaíba recolheu um tambor de 200 litros de óleo na Ponta de Tabatinga, a 7,4 km da costa de Natal (RN). Esse apresentava o logotipo da Shell, estava cheio e não apresentava vazamentos.
Amostras do conteúdo foram enviadas para análise no Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira. A Marinha ressaltou, no entanto, que “os dados disponíveis até o momento não permitem concluir se o episódio tem relação com outros tambores encontrados no litoral de Sergipe (que também tinham o logo da Shell) ou com o óleo que tem se espalhado pelas praias do Nordeste”.
A Shell havia informado que os tambores encontrados em Sergipe eram originalmente embalagens de lubrificantes para navios, de um tipo que não é produzido no Brasil. A empresa disse também que não havia reutilizado seus tambores.
Em nota divulgada nesta quinta-feira, a Shell afirmou que recebeu a informação de que um novo barril havia sido encontrado. “Trata-se de embalagem de Omala S2 G 220, uma outra linha de lubrificantes”, esclareceu, lembrando que, segundo a própria Marinha, o tambor estava fechado e não apresentava vazamento.
Oriente Médio. Mas o Estado obteve com exclusividade a informação de que os barris achados foram produzidos e comercializados por empresas do grupo Shell localizadas na Europa e no Oriente Médio. Em documento sigiloso, a Shell encaminhou ao governo brasileiro dados de dois compradores dos produtos encontrados no Brasil. A primeira é a empresa Hamburg Trading House FZE, uma distribuidora com base nos Emirados Árabes, que adquiriu 20 tambores. O segundo cliente é a empresa Super-Eco Tankers Management, com base em Monróvia, na Libéria, que comprou cinco tambores do lote da Shell.
O lote de tambores, que tem data de 17 de fevereiro de 2019, foi produzido em Dubai pela Shell Markets. No documento, a Shell informa que o primeiro tambor encontrado com a logomarca da empresa “não foi produzido ou comercializado pela Shell Brasil” e se trata, efetivamente, de um “produto líquido límpido, de coloração âmbar”, diferente do que está invadindo o litoral do Nordeste.