Fonte: Valor Econômico
Dona das maiores reservas de petróleo do mundo ¬ estimadas em 300 bilhões de barris ¬ a Venezuela vê a sua produção petroleira diminuir, o que ameaça a já crítica situação econômica do país e complica a situação política do presidente Nicolás Maduro.
Com a previsão de que produção petroleira deste ano será a menor em mais de duas décadas, a estatal PDVSA trabalha com três de suas quatro refinarias operando no mínimo. Segundo a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), de 1998 até maio deste ano, a produção de petróleo caiu 30%, indo de 3,1 milhões de barris diários para 2,18 milhões. Isso é uma realidade muito diferente do planos traçados há sete anos, de ter hoje uma produção de 6 milhões de barris/dia. A consultoria Oxford Economics estima que o país encerrará o ano produzindo não mais que 2,1 milhões de barris/dia. O petróleo responde por 94% das receitas de exportação.
Ha uma controvérsia em relação à produção da Venezuela. A PDVSA não divulga regularmente dados de produção. Em seu relatório mensal, a Opep diz que a produção declarada pela Venezuela foi de 2,18 milhões de barris/dia, mas o mesmo relatório cita fontes secundárias dizendo que a produção poderia ser menor ainda, abaixo de 2 milhões de barris diários.
“A indústria petroleira venezuelana está em um estado precário devido a anos de falta de investimentos, à falta de recursos humanos adequados e a uma excessiva politização da PDVSA”, afirma Kenetth Ramírez, especialista em energia e presidente do Conselho Venezuelano de Relações Internacionais. “De 2015 para cá, a produção caiu uma média de 500 mil barris diários, o que equivalente a toda a produção do Equador.”
Das quatro principais refinarias, três trabalham em níveis baixos por conta do mal funcionamento de equipamentos e falta de peças de reposição. Relatório da PDVSA de maio mostra, por exemplo, que o centro de Paraguana, que inclui as refinarias Cardon e Amuay, está processando 409 mil barris/dia, o que representa 43% de sua capacidade de 955 mil barris/dia.
Segundo Ramírez, quatro motivos explicam a queda da produção: falta de investimento por parte do Estado, carência de capital humano qualificado na PDVSA, projetos novos que não decolaram e empresas de serviços petroleiros que foram estatizadas e se tornaram improdutivas. “Os projetos de estatização tiveram um impacto negativo na produção tanto em
novos como em velhos projetos”, diz.
Ele observa que mesmos os contratos de joint-venture entre a PDVSA e empresas chinesas, russas, indianas e americanas não conseguiram aumentar a produção, uma vez que a Lei de Hidrocabonetos venezuelana determina que 60% do consórcio deve ficar com a PDVSA. Sem capital para investir, os projetos atrasam.
“Como a PDVSA é capturada pelo governo, que a usa para atividades não comerciais, como investimento na região e projetos sociais, a produção não aumenta porque os recursos são utilizados para outras atividades que não as de exploração ou produção”, acrescenta Luiz Pinto, especialista em países exportadores de petróleo do Brookings Doha Center.
Membro Opep, a Venezuela concordou com o corte de produção do cartel, de 1,8 milhões de barris diários no primeiro semestre do ano, com possibilidade de extensão por seis meses. O corte foi uma tentativa de elevar os preços.
O preço de produção do barril de petróleo na Venezuela varia de US$ 23 a US$ 25, afirma Raúl Gallegos, analista da consultoria Control Risks. Com o barril do petróleo venezuelano cotado em cerca de US$ 40, a atividade ainda é lucrativa para o governo Maduro.
Para Ramírez, a queda dos preços desde 2014 foi responsável por uma transição política na Venezuela, que começou com a vitória da oposição na eleição da Assembleia Nacional em dezembro de 2015. A questão é se o nível baixo de produção, que reduz a receita para importar alimentos e remédios, pode levar a uma mudança de poder, observa. No último ano, essas importações caíram 52%.
Com o modelo econômico que desestimula os investimentos e com o tipo de governança da Venezuela, Pinto afirma que é muito difícil que o país consiga aumentar sua produção petroleira. “São necessários recursos líquidos para importar, principalmente petróleo leve, que é utilizado no processamento do petróleo pesado”, observa. Segundo o especialista, o governo venezuelano é extremamente sensível politicamente a demandas sociais, e a PDVSA é a estrutura do governo com maior capacidade de entregar esses bens e serviços.
“No lugar de investimento em produção, a tendência é a PDVSA usar recursos em caixa para o setor social”, diz. “A pergunta que fica é quanto tempo o governo consegue se manter com uma produção já bastante baixa, muito menor do que o suficiente para as importações necessárias e para o pagamento dos compromissos internacionais, principalmente os relacionados aos bônus soberanos e aos da dívida da PDVSA.”