O Estado de São Paulo
Empresas do setor de petróleo agem nos bastidores da Câmara para barrar de vez a votação do projeto que cria diretrizes de preços para o diesel, a gasolina e o gás liquefeito de petróleo. Integrantes do mercado apontam aos parlamentares brechas no texto que forçam a mudança na política de preços da Petrobras, alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro, de lideranças do Congresso e da oposição.
O argumento é de que o texto, aprovado no Senado há 11 dias no auge da disparada de preços por conta da guerra da Rússia e Ucrânia, é confuso, fragiliza a política de liberdade de preços e contém zonas cinzentas ao determinar que os preços internos praticados por produtores e importadores devem ter como referência as cotações médias do mercado internacional, os custos internos de produção e os custos de importação “conforme aplicáveis”.
A leitura é de que esse ponto do texto — “conforme aplicáveis” — poderá ser usado de qualquer maneira colocando uma “espada na cabeça” para um controle de preços no futuro. Por outro lado, a criação da conta de estabilização, prevista no projeto com receitas do governo para reduzir o impacto da volatilidade de preços, não é impositiva: depende do interesse do governo na sua regulamentação.
Uma das preocupações é com o risco de as zonas cinzentas do projeto promoverem uma diferenciação entre os refinadores integrados (quem refina e produz) e os demais participantes do mercado para aplicar apenas os custos internos da produção na definição do preço.
Hoje, somente a Petrobras tem a condição de refinador integrado. Com isso, a empresa poderia mudar a sua política de preços sem alterar a lei das estatais e, em última instância, com a possibilidade de o custo ser bancado com subsídio do governo.
Durante a tramitação do projeto, o líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ), apresentou uma emenda para evitar que refinadores integrados tivessem de adotar preços abaixo do mercado. Mas ele admitiu que a Petrobras não considera ainda que esse risco esteja afastado.
A emenda foi aceita pelo relator, mas com uma redação diferente. Ao Estadão/Broadcast, Portinho afirmou que a alteração foi apresentada para incentivar o refino no Brasil e que a versão aprovada é suficiente. “A Petrobras ainda acha que podem ser praticados preços diferentes entre quem importa e quem refina aqui. Eu achei que não. Achei que a redação está a contento”, afirmou o senador.
Representantes do setor, que falaram na condição de anonimato porque os rumos do projeto ainda não estão totalmente definidos, consideram que brechas permanecem.
Para o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, a proposta é muito ruim e, para cumpri-lo, seria necessário criar uma “fórmula” para poder juntar as três diretrizes. “É horrível, está promovendo uma intervenção de preço.” Procurada, a Petrobras não atendeu a reportagem para falar das preocupações com o texto.
Subsídio
O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), já disse que o projeto está “fora de radar” no momento e não há necessidade “ávida” para colocá-lo em votação.
Lira defendeu a criação de um subsídio bancado pelo governo. Na área econômica, como revelou o Estadão, a preferência é por um subsídio direto para os mais pobres e caminhoneiros. Como mostrou o a reportagem, o temor de ingerência política nos preços é a razão principal da queda das ações da Petrobras mesmo com alta do petróleo, na contramão da maioria das empresas petroleiras de óleo e gás em todo o mundo.
Na segunda-feira, 16, Bolsonaro afirmou que aguarda uma consulta feita ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para saber se pode reduzir o imposto sobre o combustível em ano eleitoral. “Pode ser crime”, considerou o presidente, em entrevista coletiva na frente do Palácio da Alvorada, residência oficial.
O governo estuda a possibilidade de desonerar o PIS/Cofins sobre a gasolina. O impacto da desoneração da gasolina poderá alcançar R$ 23,84 bilhões de PIS e Cofins e mais R$ 3,01 bilhões da Cide.