Folha de São Paulo
A cotação dos créditos de carbono do setor de combustíveis, conhecidos como Cbios, disparou nas últimas semanas, jogando mais pressão sobre os preços da gasolina e do diesel no país, já que a compra obrigatória dos títulos tem impacto nos custos das distribuidoras dos produtos.
Na segunda-feira (7), o preço médio do Cbio chegou a R$ 78,79, no sétimo pregão com cotação acima dos R$ 70. O valor representa uma alta de 34% em relação ao último pregão de 2021 e equivale a quase o dobro da média daquele ano, de R$ 39.
A alta preocupa o setor de combustíveis, principalmente por ocorrer em um período atípico, de poucas negociações. Geralmente, os preços tendem a subir no fim do ano, quando as distribuidoras correm ao mercado para comprar os títulos que faltam para cumprir suas cotas anuais.
O programa prevê que distribuidoras de combustíveis comprem certificados para compensar a emissão de poluentes no consumo dos produtos. O objetivo é transferir recursos da venda de combustíveis fósseis para a produção de energia renovável, barateando seu custo e incentivando o consumo.
Os Cbios começaram a ser negociados em 2020, em um momento conturbado após o início da pandemia e em meio a um embate entre o setor de combustíveis e os produtores de etanol e biodiesel, que são os vendedores dos títulos. Com a queda no consumo, o governo chegou a reduzir as metas logo no primeiro ano do programa.
Cada Cbio equivale à emissão de uma tonelada de carbono na atmosfera. As metas de cada distribuidora são calculadas de acordo com o volume de combustíveis fósseis que cada uma põe no mercado. Em 2022, elas terão que comprar cerca de 36 milhões de títulos.
“Estamos muito preocupados com a escalada, sem explicação, dos preços dos Cbios e o impacto na saúde financeira das empresas distribuidoras regionais e no preço final dos combustíveis”, diz Abel Leitão, presidente da Brasilcom, federação que reúne distribuidoras de médio e pequeno porte.
Para o setor, a falta de prazo para negociação dos títulos pode ser um dos fatores por trás da escalada de preço. As regras determinam que os produtores de biocombustíveis emitam Cbios de acordo com sua produção, mas não definem quando os papéis devem ser levados a mercado.
O mercado calcula que cerca de 12 milhões de Cbios já foram emitidos em 2022, mas apenas 7 milhões foram oferecidos às distribuidoras. A definição de prazos para comercialização é defendida pelas empresas como medida para resolver o problema.
O MME (Ministério de Minas e Energia) diz que o preço é formado por mecanismos de oferta e demanda. “O aumento de preço se justifica pela maior procura pelo produto neste início de ano”, afirma, em nota enviada à Folha, na qual nega que faltem títulos no mercado.
Segundo o ministério, já foram negociados 7,5 milhões de Cbios em 2022, o equivalente a 20,9% da meta estabelecida para o ano.
Para especialistas, a tendência de alta nos preços deve ser manter. A consultoria Datagro, por exemplo, fala em redução da oferta de títulos como um fator de pressão sobre as cotações. Em 2022, diz, o volume emitido deve ficar 12% abaixo do registrado no ano anterior.
A evolução das conversas sobre a implantação de um mercado global de carbono também pressiona as cotações. Embora não deva ser o principal título desse mercado no país, o Cbio já é usado por empresas que desejam compensar parte de suas emissões.
“Na medida em que a gente vai avançando, em nível nacional, em uma regulamentação de mercado [de carbono], a tendência de preços é de alta”, acrescenta Leonardo Werneck, CEO da consultoria I Care. “E isso não é só no Brasil, a gente vê na Europa e em outros lugares os preços aumentando.”
Com os Cbios se aproximando de R$ 80, o mercado calcula que o impacto no preço dos combustíveis fique em torno de R$ 0,06 por litro, também o dobro da média de 2021. Quanto mais alto o valor, maior o repasse às bombas do custo de compra dos títulos.
A escalada do preço dos combustíveis está no foco das atenções do governo Jair Bolsonaro (PL), pelo risco de contaminação do debate eleitoral, e vem gerando desentendimentos entre a ala política e a ala econômica do governo.
Na semana passada, com apoio do Planalto, o deputado federal Christino Áureo (PP-RJ) apresentou projeto de lei que atropela o Ministério da Economia ao prever a redução ou isenção de impostos sobre gasolina, diesel, etanol e gás de botijão sem necessidade de compensação pela receita perdida.
A amplitude do projeto gerou críticas na equipe do ministro Paulo Guedes (Economia), que queria limitar o subsídio ao diesel, reduzindo o impacto do benefício sobre as contas públicas.