Petróleo barato deve pressionar preços das refinarias para baixo

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Fonte: Valor Econômico

A desvalorização do petróleo, desencadeada pela guerra de preços entre russos e sauditas, na disputa por um mercado combalido pela epidemia do novo coronavírus, pode impactar diretamente os planos da Petrobras de vender suas refinarias. Segundo duas fontes que participam das negociações, o cenário de baixa da commodity não é favorável para o lado vendedor e, se persistir pelos próximos meses, pode desvalorizar os ativos colocados à venda pela estatal. A expectativa é que as ofertas venham abaixo do esperado e que a petroleira pode optar, nesse contexto, por adiar por alguns meses as negociações, à espera que o mercado se acalme.
Distribuidoras como a Raízen e Ipiranga; tradings como a Glencore, Vitol e Trafigura; fundos de investimento; e produtoras de petróleo interessadas em construir uma cadeia verticalizada, como a PetroChina e a Total, são algumas das potencias compradoras.
Ao todo, a Petrobras está vendendo oito de suas 13 refinarias, que correspondem a metade de sua capacidade instalada, como parte de um compromisso de abertura do mercado assumido junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O setor de refino é o carro-chefe do programa de desinvestimentos da empresa. É com o dinheiro da venda desses ativos que ela espera reduzir a dívida bruta de US$ 87 bilhões para menos de US$ 60 bilhões e intensificar o pagamento de dividendos a partir de 2021.
A meta da companhia é assinar os contratos para venda das refinarias ainda neste ano e concluir os negócios em 2021. A estatal espera receber as ofertas vinculantes pelas oito refinarias em meados de abril. A data inicialmente estipulada para a apresentação das ofertas era 6 de março, mas a Petrobras adiou o prazo a pedido de participantes que negociavam a entrada de novos parceiros nos consórcios.
Segundo as duas fontes consultadas pelo Valor, sob condição de anonimato, o cenário de baixa dos preços do petróleo deve levar as concorrentes a apresentar valores inferiores ao previsto. Nessa situação, a tendência é que a Petrobras avalie cada uma das propostas. Caso elas não atendam aos interesses, ela poderá adiar os processos.
Questionada, a Petrobras informou que ainda considera prematuro fazer projeções sobre eventuais impactos estruturais no mercado, associados à recente e abrupta variação nos preços do petróleo, “uma vez que ainda não estão claras a intensidade e a persistência do choque nos preços”. A companhia esclareceu que segue monitorando o mercado e implementando seu plano estratégico, “que a prepara para atuar com resiliência em cenários de preços baixos”.
Com capacidade menor de geração de caixa operacional, frente à queda dos preços, a estatal é pressionada a acelerar os desinvestimentos para levantar dinheiro e cumprir a meta de desalavancagem. Se os preços do petróleo se mantiverem em baixa, portanto, caberá à petroleira decidir se vale a pena assumir ofertas eventualmente mais baixas e levantar recursos para pagar as dívidas; ou postergar a meta de redução do endividamento e esperar um momento mais favorável à venda.
O sócio da área de energias e recursos naturais da KPMG, Anderson Dutra, acredita que os preços do petróleo podem até recuperar parte das perdas recentes, se Arábia Saudita e Rússia chegarem a um acordo sobre as cotas de produção, mas dificilmente a cotação do barril voltará à faixa dos US$ 60 tão rápido. Ontem, o barril o tipo Brent recuperou parte das perdas do dia anterior e fechou com alta de 8,3%, a US$ 37,22. Seguindo a tendência dos preços internacionais, as ações preferenciais da Petrobras subiram 9,4% (R$ 17,56) e as ordinárias, 8,5% (R$ 18,36), ante a queda de 29,7% na segunda-feira.
Dutra aposta, no entanto, que o petróleo em baixa não será suficiente para esvaziar o processo de desinvestimentos da Petrobras no refino. Ele alega que o número de interessados nos ativos surpreendeu as expectativas iniciais e que as empresas já estão mergulhadas nesse processo há algum tempo. Ele acredita, porém, que a queda dos preços pode puxar para baixo o valor dos ativos vendidos.
“Os fundamentos técnicos do ‘valuation’ [precificação] dos ativos não são afetados, mas nesse cenário de preços o investidor tende a se aproveitar dos custos de oportunidade, do momento de apreensão no mercado, para colocar um preço menor. Pode fazer sentido para a Petrobras segurar um pouco [os prazos para negociação]”, afirma.
O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Edmar Almeida, destaca, por sua vez, que o cenário de preços baixos é bom para o negócio de refino e que, por isso, a queda do barril não necessariamente deve derrubar o interesse pelos ativos. “Refino é um ativo que gosta de preços baixos, porque o petróleo, para o refinador, é insumo. Quando o preço desse insumo cai, as margens tendem a aumentar nesse segmento. Mas eventualmente alguns desinvestimentos podem ser adiados, sem dúvida”, afirma.
O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse há três semanas que a estatal vem recebendo “muitas propostas” e que nenhuma das refinarias “ficou órfã” de interessados. Dutra, da KPMG, por sua vez, aposta no sucesso dos desinvestimentos da Petrobras, mas não acredita que as refinarias colocadas à venda receberão muitas ofertas. Segundo ele, a tendência é que, em geral, apenas uma proposta seja apresentada por unidade e que, em alguns casos, haja competição entre dois competidores, no máximo.
O especialista destaca que a Regap (MG), localizada no Sudeste, que concentra os maiores centros de consumo e produção de óleo e gás do país, desponta como ativo mais atrativo. Ele também cita o potencial da Repar (PR), capaz de atender parte de São Paulo e ao agronegócio. Para o especialista, a Rnest (PE), por sua vez, mescla qualidades interessantes com algumas incertezas. É ao mesmo tempo a refinaria mais nova da Petrobras e está próxima a descobertas promissoras de óleo e gás, na Bacia de Sergipe-Alagoas, mas atende a um mercado consumidor não tão grande quanto o Sudeste e que compete muito com produtos importados. Dutra também aposta que a Reman (AM) pode atrair distribuidoras regionais.
O sócio da KPMG considera, por outro lado, que existe a chance de que nem todas as refinarias despertem o interesse do mercado. Segundo uma fonte que acompanha as negociações, a SIX (PR), de industrialização de xisto, e a Lubnor (CE) estão na lista de ativos de baixo interesse.

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