O Estado de São Paulo
Dezoito anos após o lançamento de sua pedra fundamental pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e 16 anos após o início das obras, o antigo Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), atual Gaslub, vai iniciar a primeira operação comercial com o processamento de gás natural vindo do pré-sal na próxima quarta-feira, 11. O projeto agora é uma versão que une a produção de gás natural e lubrificantes. Ao Estadão/Broadcast, a diretora de Engenharia, Tecnologia e Inovação da Petrobras, Renata Baruzzi, informou que a nova data para que todo o projeto entre em operação é 2029.
A expectativa é a de que o presidente Lula, que em 2006 colocou a pedra fundamental da obra, participe na sexta-feira, 13, de uma cerimônia para marcar o início da operação. Nos corredores da empresa, também vem sendo comentado que a intenção da estatal é mudar novamente o nome do polo, mas que a presidente, Magda Chambriard, ainda não havia batido o martelo.
Quando as obras foram iniciadas em 2008, no segundo mandato de Lula, o Comperj tinha previsão para entrar em operação em 2012. O complexo chegou a ser um dos símbolos da corrupção que originou a Operação Lava Jato na Petrobras, em 2014. Ao ser lançado, o investimento girava em torno dos US$ 6 bilhões, valor que foi sendo escalonado até cerca de US$ 14 bilhões, apesar do projeto não ter saído do papel. Atualmente, a empresa não informa quanto já investiu ou planeja investir no Gaslub.
Inicialmente, o projeto foi idealizado com objetivo de atrair o setor petroquímico para Itaboraí, um município pobre do Estado do Rio de Janeiro. Após interromper as obras por suspeitas de corrupção, o empreendimento ficou resumido à Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN), e agora ganha uma nova configuração com unidades de produção de combustíveis e lubrificantes, além de duas térmicas que aguardam o leilão de reserva de capacidade do governo, sendo uma de 600 megawatts e outra de 1.200 megawatts.
Com o início das operações, serão processados 10,5 milhões de metros cúbicos diários (m3/d) de gás natural, volume que sobe para 21 milhões quando o segundo trem da UPGN ficar pronto, o que deve ocorrer no próximo mês, segundo Baruzzi.
O volume produzido ajudará a substituir importações da estatal para atender seus clientes, mas terá sobra para o mercado, garantiu a diretora. Desse total, 18 milhões de metros cúbicos por dia virão do pré-sal, e mais 3 milhões de m³/d do Terminal de Cabiúnas, também da Petrobras, unidade que forneceu o gás para o comissionamento, uma etapa antes da operação comercial.
Afastada há dez anos do setor de engenharia, a diretora foi convocada em junho pela presidente da Petrobras, Magda Chambriard, para acelerar as obras da estatal. Ela conta que, para conseguir entregar a UPGN, o canteiro de obras trabalhou praticamente 24 horas por dia nos últimos meses. Ao todo, são 3.500 pessoas envolvidas. Quando todas as unidades estiverem sendo construídas, a expectativa é que esse número chegue a 10 mil trabalhadores. “E sempre com muita conformidade, sem atropelar nada. Esse é um mantra nosso. Vamos fazer rápido, mas dentro da conformidade”, ressaltou.
Segundo Baruzzi, ainda não é possível estimar o valor total do Gaslub, já que terá que desfazer parte do que já foi construído. “Você imagina uma obra que está parada há dez anos. O que eu vou ter que desfazer para depois fazer, né? É mais do que qualquer valor que eu vá falar”, explicou.
Operação
Depois do comissionamento para fazer os últimos ajustes necessários e vistoria da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para a concessão da autorização, a UPGN foi liberada para operar e vai processar o gás extraído no pré-sal, escoado pela Rota 3, um gasoduto de cerca de 355 quilômetros de extensão total, sendo 307 km referentes ao trecho marítimo e 48 km referentes ao trecho terrestre.
A obra da UPGN, interrompida pela primeira vez em 2014, foi retomada em 2020 por um consórcio formado pela chinesa Kerui e a brasileira Método, mas desentendimentos com a Petrobras levaram ao rompimento do contrato em julho de 2022, e a obra foi suspensa novamente. Em março do ano passado, com a nova gestão, a Petrobras assinou contrato com a empresa japonesa Toyo Setal, que concluiu a UPGN.
“Hoje, a Petrobras atende o gás que ela vende com produção interna, Gasbol (Gasoduto Bolívia-Brasil), e eventualmente precisa se suprir com alguma coisa de importação. Então, a Petrobras compõe esse pool e entrega para os clientes. Quando o Rota 3 entrar, vai entrar também nesse pool de venda”, informou a diretora. “Como a Petrobras não importa os 21 milhões que a unidade vai processar, haverá adição de gás para o mercado”, explicou.
A UPGN é apenas parte do Gaslub, destaca Baruzzi. Outras licitações já estão na rua, como as unidades de produção de diesel, querosene de aviação (QAV) e lubrificantes. A nova configuração do empreendimento prevê unidades de Hidrocraqueamento Catalítico (HCC), de Hidrotratamento (HDT), de Desparafinação por Isomerização por Hidrogênio (HIDW), unidades auxiliares, utilidades e off-sites (extramuros). Uma biorrefinaria, porém, ainda está sendo estudada. Os planos são de produzir 12 mil barris por dia de óleos lubrificantes grupo II; 75 mil barris por dia de diesel S10 e 20 mil barris por dia de querosene de aviação de baixo teor de enxofre.
“As obras da parte de refino começam no segundo semestre de 2025″, informou Baruzzi, explicando que a unidade de biorrefino ainda não chegou à sua diretoria porque está sendo avaliada pelas áreas de negócio, “que são as áreas que realmente produzem, desenvolvem os projetos iniciais, e quando já tem alguma coisa um pouco mais firme eles passam para a gente construir”, informou Baruzzi, que além do Gaslub é responsável pela retomada da expansão da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco.
Obras nas áreas de refino e lubrificantes
Com a operação da UPGN garantida no Polo Gaslub, a Petrobras prevê iniciar as obras da parte de refino e lubrificantes no primeiro semestre de 2025, segundo o gerente geral do Gaslub, Candido Queiroz. Previsto para ser concluído em 2029, quando entrar em produção, o empreendimento vai adicionar no mercado o equivalente a 80 mil caminhões com tanque de 150 litros de diesel S10, ou 12 mil metros cúbicos diários, e o suficiente para encher 380 mil botijões de gás de cozinha por dia, entre outros produtos.
“É um marco superimportante o início da UPGN, porque já está trazendo desenvolvimento para toda a região do Sudeste do Rio. Começa a gerar receita também para os municípios e está totalmente aderente ao que está estabelecido no nosso planejamento estratégico”, afirmou Queiroz, ressaltando a importância do empreendimento que ocupa 10% de todo o município de Itaboraí, no Rio de Janeiro, o equivalente a 5.455 campos do Maracanã.
A geração de energia elétrica do polo também vai beneficiar a região, representando oito vezes do consumo do município, e a produção de lubrificante do grupo II (OB G-II), um produto mais complexo e com baixo teor de enxofre, vai representar 80% da produção nacional, ou 1.846 metros cúbicos por dia (m³/d), informou Queiroz. Também está prevista a produção de 3.270 m³/d de querosene de aviação (QAV), o correspondente a 1.500 idas e voltas do Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, ao Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, além de 3.260 m³/d de Nafta.
Queiroz informa que boa parte das obras das unidades de refino está adiantada, remanescentes do projeto original do Comperj, como é o caso da unidade de hidrocraqueamento catalítico (HCC) e para a produção de diesel, que estão 80% prontas. As duas plantas de hidrogênio cinza (a partir do gás natural), com capacidade para 3 milhões de m³/d cada, também estão sendo licitadas, assim como outras unidades auxiliares. Já a produção de lubrificantes vai partir do zero, “mas já está com a licitação na rua”, ressaltou Queiroz.
Ele destacou que a unidade de biorrefino, ainda em estudo, depende das plantas de hidrogênio, mas terá capacidade de processar 1 milhão de toneladas por ano de gordura animal ou óleo vegetal, e deverá produzir biodiesel no futuro, segundo o executivo. “Uma das coisas fundamentais para essa planta do biorrefino, assim como para a de Hidrotratamento (HDT) e a de Hidrocraqueamento Catalitico (HCC) é que precisa de muito hidrogênio”, explicou.
Para ajudar na sustentabilidade do projeto, Queiroz informa que a Petrobras fechou um contrato com a Reuso Itaboraí, uma subsidiária da Águas do Rio, que vai garantir, a partir de 2026, o reuso de 100% da água utilizada no polo para produzir vapor e resfriamento das plantas. A expectativa é de que, em pleno funcionamento, o consumo de água chegue a 1.900 metros cúbicos por hora. No momento, o Gaslub recebe água da Refinaria Duque de Caxias (Reduc), que também fornecerá a matéria-prima (gasóleo) para a produção do Gaslub, e receberá os produtos prontos de volta para comercializar.
“Vamos aproveitar a estrutura que eles (Reduc) têm, para não ter que criar aqui, o que poderia prejudicar também a movimentação na região. Pode até ser que no futuro tenha, porque a gente tem uma área de entorno bem grande aqui. Então, pode ser que no futuro alguma distribuidora queira vir se instalar aqui para facilitar a logística”, avaliou Queiroz.