Valor Econômico
Os democratas americanos têm um problema. Eles enfrentam as eleições de meio de mandato em novembro com a inflação superando o crescimento dos salários, o que significa que os padrões de vida estão caindo. Mas há muito pouco que qualquer presidente ou partido político possa fazer sobre isso.
É impossível os eleitores não perceberem a inflação, com os preços ao consumidor subindo 9,1% em junho em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo uma pesquisa da consultoria Morning Consult, mais da metade dos eleitores culpam as políticas do presidente Joe Biden, que vem fazendo do combate à inflação sua principal prioridade econômica.
Outra pesquisa da Morning Consult mostra que uma porcentagem maior dos eleitores acredita que o presidente tem muito controle sobre o gerenciamento da inflação; mais do que o Federal Reserve (cuja instrução oficial inclui a estabilidade dos preços), o Congresso ou grandes empresas.
Não admira que o presidente tenha declarado a inflação “a maldição da nossa existência”. Há algumas políticas fiscais que o governo poderia implementar para esfriar a inflação, mas elas apenas reduziriam os preços nas margens – mais um sinal de virtude do que impacto de fato.
A alegação de que o estímulo fiscal de Biden em 2021 superaqueceu a economia e elevou os preços, não é muito correta. Um estudo do Fed de San Francisco constatou que cerca de metade do aumento inflacionário veio de fatores de oferta: problemas nas cadeias de suprimentos, os lockdowns na China por causa da covid-19 e a guerra da Rússia contra a Ucrânia. Apenas cerca de um terço veio do aumento da demanda. Mesmo que o estímulo tivesse estimulado a inflação, isso está sendo desfeito este ano. Os Estados Unidos passam pela segunda maior retração fiscal de sua história, o que vai esfriar a demanda.
Mas com os preços da gasolina nos EUA subindo mais de 40% ao longo do último ano e os preços dos alimentos aumentando mais de 10%, os eleitores ainda não perceberam. Os preços da energia são responsáveis por cerca de metade do aumento da inflação nos EUA, mas nenhum presidente poderia ter as ferramentas necessárias para derrubar esses preços até o dia da eleição. O anúncio feito em abril pela Casa Branca, de que iria liberar mais de 1 milhão de barris de petróleo por dia das Reservas Estratégicas de Petróleo, estabilizou os preços por um tempo. Mas a Agência Internacional de Energia (AIE) estima que isso substitui apenas cerca de um terço da oferta perdida com a guerra na Ucrânia.
O governo também está conclamando outros produtores a aumentar a oferta. Biden enviou funcionários graduados para visitar o líder venezuelano Nicolás Maduro, e estaria considerando amenizar as sanções contra o país em troca de petróleo. Biden então foi para a Arábia Saudita para negociar com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, o governante de fato do reino. Ele saiu sem um compromisso público saudita de aumentar a produção.
Até agora, o mundo não assinou o teto de preço proposto pelo governo dos EUA para o petróleo russo. Embora pudesse ajudar a reduzir os preços do petróleo, sem dúvida haveria vazamentos. Índia e China talvez comprassem petróleo a preços um pouco acima do limite e a Opep+ ficaria ressentida com os cortes nos preços.
Mais petróleo deveria significar preços menores. Os produtores dos EUA começam a aumentar a perfuração, mas o desejo dos democratas de aumentar as fontes alternativas de energia limita os incentivos para se investir em ativos de carbono. Um problema com todos esses esforços é que o petróleo é vendido em um mercado global. O subinvestimento crônico nos combustíveis fósseis e o afastamento da Europa da energia russa significam que os preços do petróleo serão maiores durante anos, e não meses. Além disso, muitas refinarias foram desativadas quando a demanda caiu durante o lockdown da covid-19. A falta de capacidade significa que os preços da gasolina permanecerão altos mesmo quando os preços do petróleo baixarem.
O Congresso poderia votar para aumentar o imposto de renda, desferindo um golpe na demanda. Mas em vez disso, está considerando suspender o imposto federal sobre a gasolina – ele é de cerca de 18 centavos de dólar por galão, o que não é muito se comparado ao preço médio por galão de cerca de US$ 4,50. Os motoristas não teriam todos os benefícios, pois as empresas de energia pagam parte do imposto. Reduzir os impostos sobre a gasolina também gera uma demanda maior, puxando os preços para cima.
Biden dispensou as regras ambientais, permitindo a adição de etanol na gasolina no verão americano. Mas apenas 2.300 postos de gasolina do país oferecem essa mistura. Analistas agrícolas temem que a maior demanda por milho para a produção de etanol possa levar os agricultores a deixar de produzir trigo para produzir milho, alimentando a inflação dos alimentos.
Além do petróleo e do gás, o governo Biden quer reprimir a manipulação dos preços por empresas em setores que carecem de competitividade. Uma análise da Casa Branca, por exemplo, constatou que a alta concentração no setor frigorífico eleva os preços. Uma pesquisa feita este ano mostrou que mais de metade dos eleitores culpam a inflação pela falta de concorrência entre as empresas, mas cerca de dois terços dos economistas discordam. A concentração de mercado foi elevada em vários setores nos EUA durante anos sem provocar uma aceleração da inflação.
Biden poderia cortar as tarifas. Segundo um estudo do Peterson Institute, remover as tarifas de Trump sobre US$ 360 bilhões em importações chinesas poderia reduzir a inflação nos preços ao consumidor em 1 ponto percentual. Isso pode não valer a pena para ceder influência à China nas negociações comerciais. Uma redução maior de 2 pontos percentuais nas tarifas poderia reduzir o Índice de Preços ao Consumidor em 1,3 ponto percentual. Mesmo assim, o impacto seria principalmente sobre as mercadorias, e não onde a inflação atinge mais duramente – combustíveis, alimentos e moradia.
Isso torna o primeiro ponto de Biden em seu plano de combate à inflação o movimento mais eficaz para os democratas: deixar para o Fed combater a inflação. Isso levará tempo e há o risco de o Fed provocar uma recessão fatal para os votos. Mas, se derrubar a inflação é a maior prioridade, essa é a única coisa que certamente funcionará. (Tradução de Mário Zamarian).