O petróleo e a emergência climática no Brasil

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Folha de São Paulo (Opinião)

É de há muito sabido que a queima de petróleo e de outros combustíveis fósseis libera gases de efeito estufa, incluindo o dióxido de carbono (CO2), que causam aquecimento superficial do planeta. Das 2,4 trilhões de toneladas de CO2 emitidas pela humanidade entre 1850 e 2019, quase metade (42%) o foram desde 1990.

Não por acaso, o aquecimento médio global disparou desde então, atingindo no ano passado 1,55ºC acima do período pré-industrial. A Terra já esteve muito mais quente milhões de anos atrás. Os registros paleoclimáticos, contudo, mostram que ela jamais aqueceu na velocidade atual (0,24ºC por década no período 1995-2024), o que inviabiliza a adaptação da maior parte das espécies —inclusive a nossa.

No Brasil, desde 2012, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), todos os anos (com exceção de 2022) foram mais quentes que a média do período 1991-2020. O ano de 2024, o mais quente da série do Inmet desde 1961, foi entre 1,5ºC e 2ºC mais quente do que os anos 1960-1979. Em 2024, 6 milhões de brasileiros em 111 cidades viveram cinco meses sob calor intenso.

Os impactos desse aquecimento estão se agravando. Um levantamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação (MCTI), da Unifesp e da Unesco mostra que “o Brasil teve 64.280 desastres climáticos desde 1990, e há aumento, em média, de 100 registros por ano”. Entre 2013 e maio de 2024, 94% dos municípios brasileiros decretaram estado de emergência ou calamidade pública, segundo a Confederação Nacional de Municípios (CNM). Carlos Nobre, José Marengo e Wagner Soares (“Climate Change Risks in Brazil”, 2019) projetam que “num cenário de altas emissões de gases de efeito estufa, o país tem alta probabilidade (acima de 70%) de aquecimentos maiores do que 4ºC antes do fim do século”.

Dada essa trajetória funesta, é interesse máximo do Brasil assumir a liderança da COP30, em Belém, em vez de ampliar sua produção de petróleo, provocando ainda mais aquecimento. Essa ampliação precisa merecer a mais veemente oposição da sociedade brasileira. E tanto mais quando se trata de perfurações exploratórias numa região ecologicamente tão rica e sensível como é o bloco FZA-M-59 da margem equatorial, situado na bacia da Foz do Amazonas.

Quatro fatores justificam essa oposição:

1 – O Ibama caracterizou tal atividade nessa região como de “risco máximo”. Mesmo se o risco fosse baixo, ele deveria ser evitado porque o impacto de um acidente nessa região, por improvável que seja, é imenso e irreversível;

2 – Os povos Karipuna, Palikur-Aruk Wayne, Galibi Marworno e Galibi Kaliña, que vivem no norte do Amapá, não foram consultados pelo governo, como obrigam a lei e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho;

3 – O Ibama é um órgão do Estado brasileiro investido da autoridade máxima quando se trata de licenciamentos ambientais;

4 – Por fim, a ciência e o bom senso já demonstraram que o petróleo, mesmo na ausência de vazamentos, é hoje agente de destruição sistêmica dos equilíbrios planetários. Abandoná-lo, obviamente, implica sacrifícios. Mas a poluição e os impactos climáticos por ele causados já são, e serão cada vez mais, incomensuravelmente maiores do que as renúncias impostas pela inadiável transição energética.

(Opinião por Oded Grajew – Presidente emérito do Instituto Ethos, conselheiro do Instituto Cidades Sustentáveis e membro do Pacto Nacional pelo Combate às Desigualdades e Luiz Marques – Professor aposentado do Departamento de História da Unicamp)

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