O alto custo da queda dos preços dos combustíveis

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Valor Econômico

O preço dos combustíveis é um tema que mobiliza as sociedades em todo o mundo de forma permanente. Nos momentos de alta, pesa no bolso dos consumidores, gera inflação e prejudica a rentabilidade de diversas categorias. Nos períodos de baixa, questiona-se a razão pela qual as reduções não chegam às bombas. O tema é popular, o que faz alguns países recorrerem a subsídios para evitar os aumentos, alguns gastando mais com combustíveis que com educação, caso de Irã, Venezuela, Equador, Arábia Saudita e Argélia.

No Brasil, os preços da gasolina e do diesel acumularam em 2021 aumentos de, respectivamente, 70% e 65%. A sequência de acréscimos tem impulsionado número crescente de propostas sobre o tema no Congresso. A iniciativa mais madura é o Projeto de Lei (PL) 1.472/2021, que cria fundo de estabilização, altera a política de preços da Petrobras e institui imposto sobre as exportações de petróleo cru. O projeto foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e está pronto para ir a plenário.

Fundos e taxas sobre exportações não se sustentam, contribuem apenas para matar a galinha dos ovos de ouro

O PL determina que os preços domésticos tenham como referência as cotações médias do mercado internacional, custos de produção e de importação, desde que aplicáveis, embora não especifique como se dará essa apuração. O texto estabelece bandas de preço para variação, frequência de reajustes e mecanismos de compensação, a serem definidos pelo Executivo. A proposta institui, ainda, alíquotas progressivas conforme o preço do barril: livre para parcela até US$ 45/barril; entre 2,5% e 7,5% para a parcela entre US$ 45-85; entre 7,5% e 12,5% para a parcela entre US$ 85-100; entre 12,5% e 20% para a parcela acima de US$ 100.

Pelo projeto, o Executivo pode estabelecer alíquotas diferenciadas para quem destinar parte da produção para o refino no mercado interno, criando subsídio indireto para as refinarias brasileiras. Além da taxa de exportação, o fundo teria como fontes: 1- dividendos da Petrobras; 2- participações governamentais destinadas à União; e 3- resultados da gestão das reservas cambiais. A proposta também delega ao Executivo fixar as bandas de flutuação dos preços de gasolina, diesel e GLP.

À primeira vista bem-vindas para conter a alta dos combustíveis, essas iniciativas foram tentadas muitas vezes, ao longo de décadas, mas não funcionaram em nenhum país. A despeito disso, esse movimento se repete em muitas nações. Diante de um problema real, surgem medidas bem intencionadas com o objetivo de controlar mercados artificialmente. Contraproducentes, essas iniciativas usualmente escamoteiam o problema no curto prazo e trazem consequências graves para o setor de petróleo, gás e derivados e para a economia, além de custos para a sociedade no médio prazo.

A volatilidade dos preços dos derivados de petróleo é fenômeno global, estrutural e crescente, inerente a essa indústria. Já vimos esse filme. A tentativa de controlar o preço por meio da Petrobras, por exemplo, além de prejuízo à empresa, teve como resultado a ausência de investimento privado em refino, pois empresa nenhuma produziria para durante certos períodos vender a preços abaixo daqueles praticados no mercado. A manutenção de uma estrutura de mercado de refino altamente concentrada, a dificuldade que tivemos para ampliá-la adequadamente, aliada ao contexto de o país ter se tornado um exportador importante, impõe um “passeio logístico” – exportar petróleo cru, sem agregar valor, e importar derivados – que em nada ajuda a resolver a questão. Essa imprevidência expõe ainda mais o Brasil ao que se pode chamar de “novos choques do petróleo”.

Outras nações já testaram soluções similares e encontraram não apenas dificuldades na implementação, com poucos resultados. O Chile pôs em prática um fundo de estabilização que compensava os refinadores e importadores nas épocas de altas e recolhia deles quando os preços declinavam no mercado internacional. Funcionou por um certo tempo e depois, quando ocorreram oscilações em patamares não imaginados, o fundo fracassou e a ideia foi abandonada. Em outros países, os fundos levaram ao aumento do déficit público.

Para se ter uma ideia da complexidade de constituir e gerenciar um fundo desse porte, basta dizer que para cada centavo em subsídios no preço final dos principais derivados consumidos em 2020 (gasolina C, diesel B, GLP), seria necessário um colchão de aproximadamente R$ 1 bilhão de reais anuais. Num cenário fiscal como o nosso, qualquer erro poderia levar o Brasil ao fundo do poço. Em suma, essa é uma empreitada muito arriscada. Em tempos de pandemia e crise econômica, algo temerário. Não à toa que 80% dos países optam pelas regras de livre mercado na formulação de preços.

Adicionalmente, a mera sinalização de uma taxa sobre as exportações – o que lembra as medidas tomadas pela vizinha Argentina – pode gerar uma onda de retração no setor de petróleo brasileiro, em especial no segmento de exploração e produção (E&P), que já paga um ´government take´ (tributos, royalties e participação especial) na casa dos 70% sobre o que produz.

Se acrescentarmos a esse quadro o cenário de transição energética – cujas bases já estão postas -, podemos causar uma reação em cadeia: os investimentos no Brasil diminuem, os projetos de E&P desaceleram, caem os royalties e perde-se o interesse nos novos leilões e campos de produção. É preciso ter claro que o interesse pelas licitações brasileiras de blocos exploratórios se insere neste contexto, e que insegurança jurídica e regulatória são sinônimos de ativos encalhados, desemprego e queda da renda.

Justifica-se, nessa conjuntura, com o propósito de controlar preços no curto prazo, arrastar o país para uma aventura, com efeitos potencialmente perversos? A obtenção de patamares justos para os combustíveis requer a manutenção de mecanismos de preços transparentes, tributação simples e eficaz e avanços na agenda de desconcentração de mercados e de estímulo a competição. Um ambiente de negócios saudável e atrativo, com mais atores, é a forma adequada de impulsionar o setor e beneficiar os consumidores na ponta.

Fundos e taxas sobre exportações não se sustentam e contribuem apenas para matar a galinha dos ovos de ouro e antecipar a extinção de uma fonte de riqueza duradoura.

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