Projeto bilionário de empresa ligada a fundo de investimento árabe dará início ao cultivo da planta nativa em 2025
Folha de S. Paulo
A Acelen Renováveis vai investir US$ 3 bilhões para produzir combustíveis limpos a partir da macaúba, palmeira nativa do cerrado brasileiro.
A planta é capaz de produzir de sete a oito vezes mais óleo do que a soja, segundo pesquisadores. A empresa é ligada ao Mubadala, um dos principais fundos soberanos de investimentos de Abu Dhabi.
A macaúba (Acrocomia aculeata) é capaz de produzir cerca de 4 toneladas de óleo por hectare sem nenhum melhoramento genético, segundo Sérgio Motoike, professor do departamento de fitotecnia da UFV (Universidade Federal de Viçosa).
‘Nosso trabalho é domesticá-la através da seleção de plantas e desenvolver técnicas de cultivo’, diz.
A instituição é pioneira em pesquisas para transformar a planta em um produto agrícola. ‘Em termos de eficiência, [a macaúba] tem potencial para ser uma commodity de exportação no futuro’, diz. A planta é capaz de produzir em ambientes mais secos, áreas degradadas, sistemas agroflorestais e até sistemas de integração com pecuária, segundo Motoike.
Para o pesquisador, a principal desvantagem em relação às culturas de outros países é que ela precisa de seis anos para atingir a idade produtiva.
O mercado ainda pouco explorado da palmeira atraiu a atenção da Acelen. A empresa já tem cerca de 3 milhões de mudas da cultura armazenadas em viveiros terceirizados. Entretanto, os agricultores ainda não foram incorporados à cadeia de produção. A expectativa é que o cultivo comece em 2025 na Bahia e no norte de Minas Gerais.
‘Queremos cultivar a macaúba em 180 mil hectares de pastagens degradadas’, afirma Marcelo Cordaro, diretor de operações da empresa. Nos próximos anos, a companhia quer produzir cerca 20 mil barris por dia de SAF (Combustível Sustentável de Aviação) e diesel renovável, em sua primeira biorrefinaria na Bahia.
O estado foi escolhido pela quantidade de terra degradada e por facilitar a logística do processo, já que a refinaria de Mataripe fica em São Francisco do Conde, região metropolitana de Salvador.
Além disso, a cultura da macaúba foi incluída no Zarc (Programa Nacional de Zoneamento Agrícola de Risco Climático), anunciado em fevereiro de 2024 pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
O Zarc é usado como referência para a concessão de crédito a pequenos agricultores por meio do Plano Safra. A nova cultura está sob o interesse do plano de transição energética e energia limpa do governo federal.
Além da ferramenta, a Embrapa pesquisa modelos de integração da macaúba a sistemas pecuários para o mercado de crédito de carbono. ‘A união pode resultar em emissão negativa de carbono, devido à alta capacidade de retenção tanto no solo quanto na biomassa abaixo do solo’, afirma Simone Favaro, pesquisadora da Embrapa.
‘Isso para o comércio de biocombustível é fundamental, seja como uma renda extra para o mercado de crédito de carbono, seja para obter crédito de financiamento’, afirma a pesquisadora.
Mercado não está consolidado
O MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) concede benefícios para incentivar a inclusão da agricultura familiar na cadeia de produção de combustíveis renováveis. O selo Biocombustivel Social é uma ferramenta de identificação que dá prioridade nas vendas para produtores de biodiesel e acesso a alíquotas reduzidas de PIS/Pasep e Cofins.
Para receberem o selo, as empresas devem incluir os agricultores familiares de maneira qualificada, seguindo critérios estabelecidos pelo governo. Também devem assegurar assistência técnica gratuita e se comprometer a adquirir matéria-prima para biocombustíveis produzidos por pequenos agricultores.
A empresa S.Oleum é uma das pioneiras na produção de óleo de macaúba e emissão negativa de carbono. Para Francisco de Blanco, cofundador da empresa, empreender em um mercado que não é consolidado tem suas vantagens, mas é desafiador. ‘O agronegócio brasileiro não produz nenhuma cultura nativa em larga escala. Com o aumento das evidências científicas, não vai demorar para outras empresas aderirem’, afirma.
Os empreendedores da nova cadeia produtiva têm boas perspectivas para o futuro. Francisco acredita que a implementação de tecnologias para a produção vai atrair novas empresas e o mercado vai se consolidar, seguindo um caminho semelhante ao da soja no Brasil. ‘Não tenho medo de falar que o Brasil vai produzir macaúba em 1 milhão de hectares a partir de 2030’, afirma.