ICMS é mesmo culpado por gasolina custar mais de R$ 7, como diz Bolsonaro?

Gasolina nunca foi tão cara no Brasil, mas por quê? Entenda o que faz o preço disparar
30/08/2021
Entenda por que o preço dos combustíveis subiu tanto este ano
30/08/2021
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UOL

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem atribuído o preço alto da gasolina e de outros combustíveis a um imposto estadual, o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Bolsonaro chegou a afirmar que o valor tem subido por uma “ganância” de governadores. O litro do combustível já passou de R$ 7 em algumas regiões.
Dados oficiais, porém, mostram que o fator que mais pesou para o aumento do preço nos últimos meses não foi o ICMS, mas sim os reajustes feitos pela Petrobras. O imposto estadual compõe uma parte importante do valor que os motoristas pagam nos postos, mas os percentuais cobrados não sofreram alterações recentemente.
O que compõe o preço da gasolina O preço da gasolina comum é composto por cinco itens, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis): Preço do produtor (refinarias da Petrobras e importadores); Preço do etanol – o combustível que chega aos postos tem 73% de gasolina A e 27% de etanol; Tributos federais – PIS, Cofins e Cide; Imposto estadual – ICMS; Distribuição, transporte e revenda.
A ANP divulga planilhas mensais que mostram qual foi a participação de cada um destes itens no preço médio do litro de combustível pago pelo consumidor. Os dados são compilados a partir do Relatório do Mercado de Derivados do Petróleo, produzido pelo Ministério de Minas e Energia, do governo federal.
As informações mais recentes são de abril de 2021. Segundo o levantamento, 28,1% (ou R$ 1,53) do preço da gasolina na bomba correspondia ao valor do ICMS. O componente que mais pesou, porém, não foi o imposto, e sim o valor cobrado na refinaria: o item respondeu por 35,6% (R$ 1,95) do valor médio pago pelos motoristas em abril (R$ 5,47).
O mesmo compilado feito pela ANP mostra que a fatia equivalente ao preço na refinaria vem aumentando nos últimos meses. Em janeiro, por exemplo, o preço nas refinarias respondia por 30,6% (R$ 1,43) do valor da bomba (R$ 4,69). Só entre janeiro e abril, deste ano a alta foi de cinco pontos percentuais ou R$ 0,52.
Na comparação entre abril de 2021 e abril de 2018 (primeiro ano em que os dados estão disponíveis no site da ANP), o aumento é ainda maior, de quase seis pontos percentuais ou R$ 0,69.
Política da Petrobras é determinante para altas
Carla Ferreira, pesquisadora do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, ligado à Federação Única dos Petroleiros), diz que a parte mais importante dos aumentos no preço ao consumidor está vinculada às altas promovidas pela Petrobras.
Segundo ela, os reajustes são um efeito da política de preços da empresa, adotada em 2016. A diretriz vincula os preços praticados no Brasil ao valor do barril de petróleo no mercado internacional, cobrado em dólares. Com o dólar alto, os preços no Brasil também sobem. Desde o início do ano, a gasolina acumula alta de 51% nas refinarias.
É claro que, como o ICMS é um percentual sobre o preço final, quando o preço sobe, a arrecadação aumenta. Mas ele não é o vilão das altas de agora. A grande questão é esse preço que sai da refinaria, que vem da política de paridade de importação”
De acordo com Ferreira, um exemplo de que a tributação não é o fator determinante para as altas recentes foi o baixo impacto que a isenção de PIS e Cofins, dois tributos federais, teve sobre o preço do diesel. Apesar de o corte no imposto ter sido de R$ 0,31, a redução no preço da bomba foi de apenas R$ 0,03.
Postos criticam modo de cobrança do ICMS Paulo Miranda Soares, presidente da Fecombustíveis (Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes), reconhece que os aumentos da Petrobras pesaram no preço.
“Eu acho que a forma como a Petrobras está fazendo hoje é a mais adequada. O petróleo é uma commodity, e a empresa tem que seguir isso. O nosso azar é que o dólar está alto. A má administração do país acaba impactando negativamente o cidadão. Insegurança jurídica, desarmonia do governo, tudo isso influencia o valor do real. Se houvesse mais estabilidade econômica e política, provavelmente o dólar estaria em um patamar mais razoável”. Paulo Miranda Soares
Ele também faz críticas aos estados: segundo Soares, além de a alíquota do ICMS ser alta (os percentuais variam de 25% a 34%, dependendo do estado), a metodologia de cobrança não é adequada. Hoje, o valor do imposto é calculado sobre uma média dos preços cobrados nos postos, que é atualizada quinzenalmente.
“Uma reforma tributária com racionalização do ICMS poderia amenizar um pouco o problema ou dar mais estabilidade ao preço. (…) A gente tem tentado impulsionar a reforma, mas estamos perdendo a esperança. Paulo Miranda Soares.
Os governos estaduais, de outro lado, argumentam que qualquer mudança no ICMS é complexa porque o imposto responde pela maior parte da arrecadação.
“Os combustíveis representam mais de 20% da arrecadação do ICMS. É um item importante para o equilíbrio fiscal dos estados. Para compensar uma redução na gasolina, outros produtos precisariam ter mais imposto. André Horta.
O presidente Jair Bolsonaro chegou a enviar ao Congresso um projeto de lei que altera a forma de cobrança do ICMS sobre combustíveis. A proposta foi criticada por que o ICMS não é um imposto da União, ou seja, não caberia ao governo federal propor mudanças em sua forma de cobrança, e também porque poderia aumentar o preço em alguns estados. À época, o governo não se manifestou sobre essas críticas. O texto está em análise na Câmara dos Deputados.
O que diz a Petrobras Em nota encaminhada ao UOL, a Petrobras afirmou que há um “alto investimento das empresas produtoras para que a gasolina e outros combustíveis cheguem até as pessoas”. Segundo a empresa, os custos são bilionários, e “os produtos vendidos [os combustíveis] precisam remunerar o investimento e garantir que as empresas mantenham as operações funcionando com segurança e qualidade”.
A Petrobras disse ainda que o preço da gasolina na refinaria atualmente é de R$ 2,04, em média, e que o ICMS é a maior parcela da carga tributária incidente sobre o combustível.
Cabe lembrar que o ICMS não é uma parcela fixa no valor final do combustível, mas, sim, um percentual sobre o valor total, o que, na prática, eleva a arrecadação estadual com o tributo toda vez que o preço do combustível na refinaria é ajustado”, completa o texto.
A nota conclui afirmando que a Petrobras evita repassar imediatamente ao consumidor a volatilidade dos preços no mercado externo, e que os valores praticados nas refinarias seguem buscando um equilíbrio com o mercado internacional.
“O alinhamento dos preços ao mercado internacional é fundamental para garantir que o mercado brasileiro siga sendo suprido sem riscos de desabastecimento”, conclui.

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