Valor Econômico
Com um discurso de que o Brasil será outro daqui para frente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), desembarcou ontem em Davos, nos Alpes suíços, com um tênis All Star verde-claro e uma agenda pró-mercado, comprometido com a responsabilidade fiscal e otimista para a aprovação da reforma tributária ainda no primeiro semestre.
Em um tom confiante, Haddad acredita que o Brasil poderá retomar o crescimento neste ano, mesmo com um cenário de recessão global. “Se o Brasil tomar as providências que precisa, e é preciso uma sensibilização dos Três Poderes, o Brasil não tem como não decolar.”
Para ele, contudo, há coisas que a Fazenda não controla. “Tem um cenário de inflação global, juros altos nos EUA, abertura ou não da China, petróleo.”
Com Bernard Appy na sua equipe econômica, Haddad vê chances de a reforma tributária avançar rapidamente. E sinalizou para a indústria que a decisão de não reonerar o IPI é o forte comprometimento do governo com essa agenda.
“[A reforma] é essencial para buscar justiça tributária e para reindustrializar o país porque a indústria paga hoje quase um terço dos tributos no Brasil e responde por 10% da produção. Há um desequilíbrio muito grande. O caminho é esse”, disse.
Segundo o ministro, há maturidade para o tema tanto na Câmara dos Deputados como no Senado. “Nós entendemos que é preciso chegar num consenso. Se depender do governo, vamos votar a reforma no primeiro semestre”, defendeu Haddad.
Representante do governo brasileiro em Davos ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), Haddad se reuniu ontem com Achim Steiner, chefe do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), e Ilan Goldfajn, presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Esses encontros, segundo Haddad, foram importantes para o governo brasileiro, que busca financiar projetos, sobretudo de energia limpa.
“Nós temos oportunidade aqui de nos reaproximarmos de alguns organismos que estavam distantes do Brasil nos últimos tempos. O Pnud é um deles. Quando era ministro da Educação, tinha uma proximidade com Pnud, Unicef e Unesco. No BID, tive oportunidade de conversar com o Ilan, que se colocou à disposição de financiar projetos dessa natureza. O Brasil está atrás de financiamento para produzir energia limpa e o BID se colocou à disposição de se financiar esses projetos”, disse.
O ministro da Fazenda terá uma agenda mais intensa nesta terça-feira, com participação em um almoço privado no Itaú, um jantar com BTG Pactual e junto com a ministra Marina Silva comandará um painel no Fórum Econômico Mundial para falar dos desafios para o Brasil nos próximos anos.
Haddad disse que o governo brasileiro tem três importantes recados para passar para a comunidade internacional. “O primeiro é o político. Vamos dar suporte para as jornadas democráticas que o mundo está vivendo, sobretudo na América do Sul, mas reforçando o compromisso do Brasil no combate a todo tipo de extremismo, que vem dando a tônica no último período.”
O segundo ponto a ser debatido no evento em Davos será a questão econômica. “É a retomada do crescimento com sustentabilidade fiscal, ambiental e justiça social”, disse Haddad. Segundo ele, esse é o modelo de economia que o governo Lula defende.
Junto com Marina Silva, o ministro da Fazenda também quer mostrar ao mundo a dimensão que a sustentabilidade ambiental ganhou e que o Brasil tem muito a oferecer. “Não apenas em termos da retomada dos compromissos históricos do Brasil no combate ao desmatamento e energia renovável, mas também na pauta do desenvolvimento. Nós podemos pensar na reindustrialização do Brasil com base na sustentabilidade”, disse.
Nos encontros privados com o empresariado e mercado financeiro, Haddad deverá explicar o plano econômico do governo. O setor privado e o mercado financeiro estão tentando entender as principais diretrizes fiscais do novo governo.
O ministro reforçou o compromisso do governo brasileiro com a responsabilidade fiscal e diz entender a ansiedade do setor privado, financeiro e dos investidores. “A ansiedade vai ser controlada com as medidas que serão tomadas e vão na direção que o presidente Lula anunciou na campanha”, afirmou.
O ministro também criticou os movimentos golpistas de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que se recusam a reconhecer o resultado das urnas, mas disse que as instituições brasileiras agiram de forma rápida.
“O fato de que, no dia seguinte, houve uma intervenção na segurança pública do Distrito Federal, o afastamento judicial do governador Ibaneis Rocha (MDB), a visita dos 27 governadores a Brasília, que se reuniram com os Três Poderes da República num gesto de compromisso com a Constituição e agenda democrática, mostra uma resposta muito rápida”, afirmou o ministro. “Além do repúdio popular. Em 24 horas, a coisa estava sob controle e mais de 90% da população, pelas enquetes feitas, repudiou o gesto dos terroristas. Não é uma coisa trivial. É uma demonstração clara que o Brasil tem compromisso com resultado eleitoral, com as regras democráticas, com as liberdades individuais, respeitadas as garantias constitucionais.”
O ministro da Fazenda considera o gesto como uma demonstração de maturidade institucional que foi dada logo na inauguração do mandato do presidente de Lula. “Na minha opinião, deveria ser recebida com o mesmo grau de surpresa que foi o gesto dos derrotados em fazer aquilo de maneira totalmente indesculpável.”
Haddad vê o Congresso com muita receptividade depois dos atos golpistas e não acredita que a oposição possa criar dificuldades em relação aos planos econômicos do governo.
Para o ministro, o presidente Lula está mais fortalecido depois dos protestos. “E a agenda internacional do Lula vai reforçar muito isso”, disse Haddad.