‘Governo nunca tentou intervir na Vale; na Petrobras é diferente’, diz Silveira

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O Estado de São Paulo

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirma que, apesar da recente troca no comando da Petrobras e do vaivém sobre o pagamento de dividendos extraordinários, não há sobressalto nos rumos da companhia. “O nosso governo não tem sobressalto. Todos sabem o que o nosso governo quer da Petrobras”, disse, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast.
“(O governo) quer a Petrobras mais competitiva na exploração de petróleo, que ela invista no parque de refino para que ele não continue sendo sucateado como no governo anterior. E não é justo e não é correto com esse País ele não ter condição de ser, no mínimo no médio prazo, autossuficiente em fertilizante”, afirmou.
Analistas e investidores afirmam que investimentos feitos pela companhia em algumas dessas áreas, como em fertilizantes, são pouco rentáveis, o que deveria desestimular incursões da Petrobras. Silveira afirma enxergar de maneira diferente: “Pode ser menos rentável, agora uma empresa de economia mista controlada pelo governo altamente rentável, ela precisa ser a mais rentável do planeta prevalecendo sobre o interesse nacional?”.
O ministro diz que tem conversado pouco com investidores, o que explicaria divergências sobre o que eles pensam das ações do governo. Ele promete ampliar a presença na Faria Lima. “Para entenderem que o ministro não é nada disso que muitas vezes está sendo construído. Não é intervencionista, não é estatista, não tem nenhum radicalismo”, afirma.
Nesta entrevista, ele explica o que vê de diferenças entre o tratamento do governo com a Petrobras, Vale e Eletrobras. Em todas elas, analistas veem tentativas de intervenção estatal, o que provocou depreciação dos papeis das companhias.
Enquanto ele defende a participação nos planos de investimentos da Petrobras, na Vale ele sustenta que o governo tem obrigações como formulador de políticas públicas na gestão dos direitos minerários. “Não interviemos na sucessão da Vale, senão seria intervencionismo. Na Petrobras é diferente: é participação”, afirmou.
Já sobre a Eletrobras, o objetivo é ampliar participação no conselho para participar das discussões da empresa. “Não quero mudar a rota das decisões tomadas por maioria, mas eu posso participar dessas discussões e posso tentar fazer o convencimento”, disse, sobre a companhia.
Veja a seguir trechos da entrevista.
• Em declarações recentes, o senhor afirmou não ver como intervenção estatal a troca do presidente da Petrobras e comparou o cargo ao de um ministro de Estado. Isso não é inapropriado no caso de uma empresa com acionistas privados?
A compreensão que eu tenho é que é plenamente possível convergir os interesses dos acionistas sérios, de médio e longo prazo, que é o que interessa numa empresa como a Petrobras, com o interesse do acionista controlador. Por que eu não considero intervenção? Porque quem indica a maior parte do conselho da Petrobras é o presidente, assim como toda a diretoria. Então o investidor, quando ele decide aplicar os seus recursos numa empresa com a natureza de economia mista, com governança própria e controlada pela União, ele já estudou isso. Agora, intervir no plano de investimentos através dos seus representantes no conselho não é uma intervenção, é uma participação. O nosso governo não tem sobressalto. Todos sabem o que o nosso governo quer da Petrobras.
• O que o governo quer da Petrobras?
Quer a Petrobras mais competitiva na exploração de petróleo, que ela invista no parque de refino para que ele não continue sendo sucateado como no governo anterior. E não é justo e não é correto com esse País ele não ter condição de ser, no mínimo no médio prazo, autossuficiente em fertilizante. Tudo isso, repito, com planos de viabilidade econômica desses projetos.
• Essas mudanças de rota, como a troca de presidente, não afugentam investidores?
Volto a dizer que não haverá sobressalto na Petrobras e podem cobrar de mim. Porque o que nós entendemos que é o melhor para Petrobras e para o País é que ela cumpra o plano de investimentos aprovado pelo conselho para os próximos cinco anos. Como nós conseguimos duramente, participando do debate, aprovar um plano de investimentos que contempla gás, fertilizante, refino e muito investimento em exploração de óleo cru, se esse plano for cumprido nós nos damos por satisfeitos. O resto é especulação.
• Mas alguns investimentos como em fertilizantes e gás já se provaram pouco ou nada rentáveis para a Petrobras. O senhor defende esses investimentos?
Menos rentáveis, não pouco rentáveis. Menos rentáveis do que a venda de óleo cru, mas a Petrobras no todo, ela sempre vai ser extremamente atrativa para o investidor. Pode ser menos rentável. Agora, uma empresa de economia mista controlada pelo governo altamente rentável, ela precisa ser a mais rentável do planeta prevalecendo sobre o interesse nacional?
• Então a Petrobras tem que atender ao interesse nacional?
Não tenho dúvidas. A natureza da empresa leva em conta na Constituição e na Lei das Estatais que ela deve convergir o interesse do investidor com a visão estratégica do País.
• Mesmo que isso signifique pagar menos dividendos para o próprio governo?
É uma opção. Vamos fazer um reconhecimento aqui, nessa relação do Estado com o setor privado, independente de ser Petrobras, eu tenho uma crítica construtiva ao mercado. Há um exagero na tentativa de se vender que o formulador de política pública, o regulador, que é o Estado brasileiro, de que ele não deve participar em nada do diálogo com as grandes corporações nacionais. Qual a lógica de nós só sermos procurados pela segunda maior empresa do Brasil, que é a Vale, e sermos apenas reativos nas políticas públicas minerais? Eu vou ter que ficar aqui olhando o setor mineral cometendo um monte de equívocos e afrontas ao interesse nacional do ponto de vista, por exemplo, da exploração das nossas jazidas de minerais críticos? E não é apenas a Vale, mas empresas internacionais, como é o caso da BHP, que tem 476 direitos minerários no País e explora só 19. É uma empresa internacional que registra o direito mineral no País, aproveitando de uma brecha legal, e eu tenho que ser apenas reativo? Eu sou formulador de política, eu tenho o direito de discutir com o Congresso Nacional para elaborar uma lei para mudar esse status quo e impulsionar o crescimento de setor mineral do País.
• Qual é o limite da atuação do governo? Porque o governo tentou influenciar na sucessão da Vale e também questiona a sua participação no conselho da Eletrobras.
Eu volto a dizer, o governo nunca tentou intervir na Vale. Estou doido para a empresa ter o seu CEO (da sigla em inglês para presidente), porque um CEO em situação precária e já com a data marcada para sair, ele naturalmente cria um vácuo de poder que prejudica não só a empresa mas também o País. Agora não interviemos na sucessão da Vale, senão seria intervencionismo. Na Petrobras é diferente: é participação.
• E na Eletrobras?
Nossa discussão nada tem a ver com nenhum assunto operacional da empresa. Nunca discutimos “ah, tem que ampliar mais geração e diminuir em transmissão; tem que aplicar mais em transmissão e menos em hidrogênio verde”. Nunca discutimos nada porque ela virou uma “corporation”. Nós entendemos que o processo de capitalização é frágil e deixou brechas que provocaram uma discussão jurídica sobre pontos diversos na correlação de forças acionárias na empresa. Há brechas para que a gente busque legitimamente junto ao Judiciário a discussão de mérito sobre a privatização.
• O governo quer ampliar a participação no conselho de um para três ou quatro assentos. Caso o governo consiga, qual será o próximo passo? Qual o objetivo do governo na Eletrobras?
Eu me julgo, agora, na obrigação de me aproximar um pouco mais para que as pessoas conheçam o ministro de Minas Energia, o que ele pensa. Eu fui convidado para dezenas de eventos na Faria Lima, para dezenas de jantares com investidores e eu não pude participar.
• Vai começar a ter encontros, então?
Eu pretendo começar um diálogo mais próximo, porque ouvir é muito importante e ajuda na tomada de decisões. Eu quero começar, agora, a ouvir um pouco mais as vozes externas e me apresentar um pouco mais para eles entenderem que o ministro de Minas e Energia não é nada disso que muitas vezes está sendo construído. Não é intervencionista, não é estatista, não tem nenhum radicalismo. Ouve, gosta de ouvir, tem humildade de ser convencido a mudar a posição e levar reflexões ao presidente da República. Eu estarei com ele, nas decisões que tomar, incondicionalmente. Quem é o pára-choque do governo é o presidente da República. Quem ganhou a eleição foi ele, ele é o responsável pelas entregas, pelos bônus e o ônus, dos acertos acertos e do resultado final.
• Foi deslealdade ao presidente que derrubou Jean Paul Prates? Dividendos?
Eu não vou acusar. O presidente Lula, com sensibilidade e respeito a sua equipe, jamais tomaria a decisão de retirar qualquer pessoa do governo por um motivo só.
• O senhor fez parte da decisão final sobre a saída do Jean Paul Prates. Por que o ministro Fernando Haddad (da Fazenda) não participou?
Eu não tenho detalhes. O presidente da República tem que ouvir quem ele acha que tem que ouvir, tomar a decisão e comunicar a todos nós. Seria um preciosismo qualquer pessoa achar que o presidente da República é obrigado a consultá-lo. É natural que ele comunique o ministro da pasta. E o presidente da República é o responsável pela tomada de decisões do governo. Eu não sei como o ministro Haddad vê isso, mas vejo com naturalidade. Eu não sei porque (Haddad não foi ouvido), mas eu entendo que é extremamente natural que o presidente da República não tenha que consultar ninguém sobre as decisões que ele maduramente tome, sobre a correção de rota das do seu governo.
• O senhor se reuniu duas vezes com a nova presidente, Magda Chambriard. Ela já antecipou o que vai fazer?
Tenho uma confiança muito grande na capacidade profissional dela. Ela conhece tudo o que aconteceu nesse 1 ano e 4 meses. É uma pessoa madura, técnica altamente conhecida por suas posições fortes e firmes. Ela aceitou o convite com a compreensão de que ela tem um grande desafio pela frente, com as agendas colocadas no plano de investimento.
• E ela se comprometeu a ser leal ao plano de investimentos?
Isso é implícito. Ela sabe, conhece o plano, conhece o que o ministro pensa, conhece o que o presidente pensa, o que os acionistas pensam. Eu, como presidente da Petrobras, me ateria a três grandes focos: me manter, para a preservação da empresa, o mais discreto possível; me dedicaria muito à gestão para que a empresa dê resultados e tenha segurança com relação a sua operação interna; e o equilíbrio entre o interesse dos acionistas nacionais e internacionais e do acionista controlador.
• Magda tem que rever a política de preços da Petrobras?
Não. A política de preços foi revista. Eu não acompanho os detalhes internos. O que o ministério faz é monitorar as oscilações dos preços no Brasil de produtos finais. A política tem que ser vista na média, não pode ser vista pontualmente. As oscilações internacionais e de custo de produção interna são muito dinâmicas. Então, o ministério tem que considerar se na média nacional a Petrobras e as outras refinarias privadas estão praticando uma política de preços equilibrada entre os interesses dos acionistas e a garantia de suprimento.
• Nesta semana, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) desobrigou a Petrobras de vender refinarias. Com isso, a empresa não vai dominar o setor?
Eu atuei fortemente para subsidiar o Cade de que essa era a decisão técnica mais adequada e que não feria o poder concorrencial. Muito pelo contrário. independente da Petrobras ser uma indutora de crescimento, não impede o crescimento das petroleiras independentes. A Petrobras pode ser parceira de outras, pode ser parceira da Iara, pode ser parceira de outras indústrias de fertilizantes, de outros investimentos de gás. Ela não precisa ser exclusivista.

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