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Desde a década de 70, quando o uso etanol começou a ser incentivado pelo governo do Brasil, por conta da crise do petróleo, ele é visto como “o combustível do futuro” e um diferencial de nosso País.
Atualmente, o combustível extraído da cana-de-açúcar é apontado como uma das principais soluções para descarbonização mais rápida dos veículos brasileiros e alternativa mais barata aos carros elétricos.
No entanto, dependendo do ponto de vista, oetanol pode trazer mais desvantagens do que vantagens.
A grande questão é que as políticas pró álcool nunca emplacaram de verdade aqui.
Apesar da maioria dos nossos carros ser flex, para que tenham o incentivo da legislação, que busca fomentar o uso do biocombustível, a maior parte dos brasileiros prefere a gasolina -já que, via de regra, é mais vantajosa financeiramente.
Para se ter uma ideia, 15,5 bilhões de litros de etanol foram consumidos em 2022, contra 43 bilhões de gasolina.
Carro flex no meio do caminho
A grande questão é que, levando em consideração que a maioria das pessoas não abastece com álcool, ter um carro flex tem suas desvantagens.
Como explica Fabio Uema, diretor da AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva), os carros flex geralmente buscam um meio-termo na taxa de compressão para funcionarem bem tanto com etanol quanto com gasolina – combustíveis com densidades energéticas diferentes.
Ficar no meio do caminho faz com que o motor não atinja a máxima eficiência, sobretudo em termos de consumo, diferentemente do que se fosse projetado para “beber” somente álcool ou o combustível derivado do petróleo.
Outra questão é que o uso do etanol pode reduzir a vida útil de alguns componentes dos veículos.
Renato Romio, chefe da Divisão de Motores e Veículos do Centro de Pesquisas do Instituto Mauá de Tecnologia, explica que em alguns carros as montadoras recomendam, para quem sempre usa álcool, abastecer com gasolina eventualmente para manter a saúde do motor.
O etanol tende a desgastar mais componentes internos como as válvulas. Por esse motivo, as montadoras costumam produzi-las, juntamente com outras peças do motor, com um material diferente para lidar com esse desgaste maior” Renato Romio, engenheiro do Instituto Mauá de Tecnologia
Segundo Romio, isso acontece porque a combustão do etanol não produz carbonização interna como a gasolina e isso pode ser prejudicial – a ponto de causar, com o tempo, danos no propulsor.
E o meio ambiente?
O etanol, de fato, é considerado um biocombustível, mas não tem a ver com poluir menos.
A emissão de vários gases poluentes é bem semelhante à da gasolina, mas o diferencial do etanol é que entre 80% e 90% das respectivas emissões de CO2 podem ser absorvidas pelas plantações de cana-de-açúcar, a matéria-prima predominante desse combustível no Brasil.
De fato, usar etanol é mais limpo do que gasolina.
No entanto, é preciso subtrair dessa conta a porcentagem maior de combustíveis fósseis consumidos porque os veículos são flex – portanto, “bebem” mais do que “beberiam” se fossem movidos a apenas um dos dois combustíveis.
Além disso, de que adianta ser melhor se, por razões econômicas pouca gente usa?!
Só se fala em etanol?
Parece estranho dizer que o etanol é um problema justamente no momento em que executivos de montadoras tratam o combustível vegetal como uma solução para redução de emissões.
Voltando ao primeiro parágrafo, depende do ponto de vista. A grande crítica é à forma como esse combustível é tratado atualmente.
Enquanto o preço da gasolina é ajustado de acordo com parâmetros internacionais, o valor do etanol depende da disponibilidade da cana.
Ou seja, depende de safras e entressafras. Como passamos recentemente por uma crise hídrica no Brasil, e estamos cruzando uma das entressafras, o álcool fica ainda menos vantajoso, e não há políticas tributárias a contento para resolver o problema.
As montadoras apostam em híbridos flex como um caminho mais rápido para a descarbonização do que investir diretamente em elétricos. [
Mas, se nada mudar do ponto de vista econômico e legislativo, será mais uma estratégia “para inglês ver”, já que a maioria continuará usando gasolina.
Vamos seguir lidando com o ônus sem usufruir do bônus, que seria redução da poluição.
Uso limitado
Segundo Éverton Lopes, diretor de Tendências Tecnológicas da AEA, apenas 30% da distância percorrida de carro no país é a etano.
Para driblar essa situação, ele acredita em uma nova postura governamental.
“No mundo inteiro, a consciência do usuário é o bolso. O etanol carece de competitividade na bomba em relação à gasolina. A tributação é parte da conta, mas é uma estratégia fraca, pois uma renúncia fiscal não duraria muito tempo. A melhor opção é ativar o mercado do crédito de carbono, para que o cidadão, à medida que use etanol, consiga ter benefícios e descontos”, explica.
O crédito de carbono é a moeda utilizada no mercado de carbono. Nesse mercado, empresas que possuem um nível de emissão muito alto e poucas opções para a redução podem comprar créditos de carbono para compensar suas emissões. O crédito é oferecido por pessoas que reduzem as emissões usando combustíveis limpos, por exemplo. O sistema teria de ser popularizado no País.
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