Estudo indica que mudanças no mercado de combustíveis propostas pela ANP podem prejudicar setor e consumidores

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Instituto Combustível Legal

Um estudo encomendado pelo Instituto Combustível Legal (ICL) a pesquisadores do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostra que uma série de medidas propostas para mudar o mercado de combustíveis no país pode afetar negativamente os consumidores e a concorrência no setor.
As alterações da regulamentação foram propostas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em maio e discutidas em audiência pública no dia 7 de julho.

Entre as sugestões da ANP, estão a inclusão de serviços de delivery de combustíveis no mercado, por meio de caminhões que levariam os produtos até o público consumidor, competindo com os postos revendedores.
A marca permite você rastrear o combustível. Se estiver adulterado, tem como rastrear para trás, [saber] onde na cadeia ele foi adulterado. Ao eliminar a marca, você também elimina esse ponto da concorrência
Outra proposta é a retirada da fidelidade da bandeira, ou seja, o estabelecimento vinculado a uma determinada marca poderia vender combustíveis, também, de outra empresa. A legislação atual determina que, sempre que um revendedor varejista optar por exibir a marca comercial de uma empresa distribuidora, este somente poderá adquirir, armazenar e comercializar combustível automotivo fornecido pelo distribuidor da marca em questão.

Outra proposta é a liberação da venda de gasolina-C e etanol hidratado por Transportadores-Revendedores-Retalhistas (TRR) que, hoje, só podem comercializar, transportar e revender óleo diesel, óleos lubrificantes e graxa envasada. Com a permissão para a venda de gasolina C e etanol hidratado, os TRRs passariam a concorrer com as empresas distribuidoras de combustíveis nesses mercados, sob o argumento de promover maior concorrência no setor. Todas as medidas propostas pela ANP visam, segundo a agência, a aperfeiçoar os regulamentos para o segmento.

Os professores Helder Queiroz e Marcelo Colomer Ferraro assinam o estudo encomendado pelo ICL para avaliar o impacto das medidas no país. De acordo com eles, as mudanças sugeridas pela ANP para o mercado de combustíveis mostram-se incongruentes com as novas e boas práticas regulatórias internacionais.
As propostas da ANP são preocupantes. Entendemos que é abrir a porta para irregularidades como sonegação fiscal e problemas de qualidade

Mesmo que a agência tenha feito um estudo de impacto regulatório, eles destacam que a minuta de Resolução, tal como proposta, pode colocar em risco as condições operacionais, a segurança do abastecimento e o próprio padrão de concorrência vigente no segmento de distribuição e revenda.

“A marca permite você rastrear o combustível. Se estiver adulterado, tem como rastrear para trás, [saber] onde na cadeia ele foi adulterado. Ao eliminar a marca, você também elimina esse ponto da concorrência”, critica Helder. Ele complementa afirmando que, atualmente, a ANP tem dificuldade para fiscalizar os mais de 40 mil postos de abastecimento que existem no Brasil, e que seria ainda mais difícil passar a fiscalizar caminhões revendedores.

O estudo aponta ainda que o uso de bombas não exclusivas nos postos “tem grande potencial de enganar o consumidor e a fiscalização nesse tipo de posto irá aumentar muito o custo de fiscalização da ANP e de todos os demais órgãos de defesa do consumidor”, já que uma nova modalidade de fiscalização surgiria, a de monitorar bombas de diferentes distribuidoras em um mesmo ponto de venda. Em relação à venda por TRRs, o documento ressalta que podem aumentar as brechas para sonegação de ICMS com a criação de mais um elo na cadeia de suprimentos.
O governo deveria fazer primeiro a privatização das refinarias e ver se vai ter algum gargalo. Entendemos que o processo está invertido. O governo está simultaneamente tentando promover mais concorrência onde já existe muita

Especialistas em direito apontam danos aos consumidores

A pedido do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), os professores e especialistas em direito, Claudia Lima Marques e Bruno Nubens Barbosa Miragem, analisaram as propostas da ANP, especificamente sobre a questão da marca exibida nos postos. Em um documento de mais de cinquenta páginas, eles analisaram detalhadamente as mudanças pretendidas pela agência.
Eles afirmam que os casos de violação ao direito de uso exclusivo de marca, em alguma medida, sempre representam prejuízo aos interesses do consumidor, porque vão resultar na possibilidade de confusão entre as marcas. Além disso, mostram que as mudanças entram em conflito com diversos artigos do Código de Defesa do Consumidor que tratam de transparência e direito à informação.

Presidente da Fecombustíveis vê medidas com preocupação

Paulo Miranda Soares, presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis), também lista uma série de críticas às propostas da ANP. Segundo ele, as medidas vão acabar prejudicando os consumidores e sua relação com os postos de abastecimento.
“As propostas da ANP são preocupantes. Entendemos que é abrir a porta para irregularidades como sonegação fiscal e problemas de qualidade”, diz o presidente da Fecombustíveis. Conforme destaca, a agência deveria ter proposto mudanças no mercado a partir da privatização de refinarias da Petrobras, em vez de concentrá-las sobre a revenda. “O governo deveria fazer primeiro a privatização das refinarias e ver se vai ter algum gargalo. Entendemos que o processo está invertido. O governo está simultaneamente tentando promover mais concorrência onde já existe muita”, critica.

Para ele, a proposta da minuta para retirar uma casa decimal das três que hoje são usadas para informar o preço dos combustíveis é um “populismo regulatório”.
Sobre o delivery de combustíveis, Soares afirma que é prática adotada em poucos países, com riscos de segurança. “Como vai fiscalizar milhares de caminhonetes?”, questiona. “Considero impossível, porque a ANP não tem braços para isso”. Em relação aos postos com mais de uma bandeira, ele diz que “não deu certo em lugar nenhum do mundo”.

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