O Estado de São Paulo
Uma forte escalada do preço do petróleo no mercado internacional, desta vez impulsionada por um novo pacote de sanções contra o setor energético russo, chega ao Brasil em um momento em que a Petrobras está com os preços bastante defasados. O descompasso atinge patamares semelhantes aos que obrigaram a companhia em agosto de 2023 a reajustar o diesel em 25,8% e a gasolina em 16,2%. Um eventual aumento agora, para reduzir ou anular essa defasagem, teria impacto na inflação de 2025, principalmente a de fevereiro, mas traria alívio para importadores e produtores de etanol, que estão perdendo espaço nos postos de abastecimento diante dos preços estagnados dos combustíveis concorrentes.
Perguntada sobre um possível reajuste nos preços dos combustíveis, a Petrobras respondeu ao Estadão/Broadcast que evita o repasse da volatilidade externa para os preços internos, conferindo assim períodos de estabilidade para os clientes (leia mais abaixo).
Segundo dados da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a defasagem média do diesel nas refinarias da Petrobras, em relação ao preço praticado no Golfo do México, chegou a 22% na sexta-feira, 10, enquanto a da gasolina ficou em 13%. Mesmo na Refinaria de Mataripe, que reajusta seus preços semanalmente, o óleo diesel está sendo vendido 11% abaixo do mercado internacional; e a gasolina, a um preço 7% inferior.
O preço do diesel não é reajustado há 383 dias nas refinarias da estatal, e da gasolina, há 188 dias. No dia 1º de janeiro a estatal elevou o querosene de aviação (QAV), cujos reajustes mensais são por contrato, em 7%.
O presidente da Abicom, Sérgio Rodrigues, critica a Petrobras por “trabalhar com uma defasagem tão alta”. “Prejudica não só importadores como produtores de etanol”, afirmou Rodrigues ao Estadão/Broadcast. “O câmbio não tem expectativa de redução enquanto não houver equilíbrio fiscal, e o petróleo só aumenta. Se a companhia praticar um preço só um pouco abaixo da defasagem já ganha muito dinheiro.”
Qual seria o impacto na inflação?
Para o economista e coordenador do Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) da Fundação Getulio Vargas (FGV), André Braz, será difícil a petroleira evitar um reajuste diante dessa defasagem por muito tempo. Segundo ele, a expectativa é de que os combustíveis sejam reajustados em breve, o que vai pesar na inflação de janeiro e principalmente de fevereiro.
No caso do índice oficial de inflação, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a maior preocupação é a gasolina, que compromete 5% do orçamento familiar no Brasil.
“Várias pressões inflacionárias estão se acumulando, já tivemos aumentos importantes no transporte público, teremos alta nas mensalidades escolares e no IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores). Acredito que a gasolina, que compromete 5% do orçamento familiar, terá reajuste em breve. A desvalorização cambial acumulada e a nova tendência de alta do petróleo indicam que isso deve acontecer”, explicou Braz ao Estadão/Broadcast.
Segundo ele, porém, em janeiro o impacto inflacionário não será tão grande, graças ao bônus da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que permitirá que a conta de energia caia 13% em média. “Isso fará o IPCA recuar algo em torno de 0,50 ponto porcentual em janeiro, o problema será em fevereiro”, explicou, ressaltando que em fevereiro as mensalidades escolares terão subido e a conta de luz voltará ao normal. “O IPCA de janeiro poderá ficar em torno de 0,2% e a de fevereiro acima de 1%”, estimou Braz.
Para ele, o cenário da inflação dos próximos meses também dependerá do comportamento do câmbio, que se por um lado estimula as exportações, o que é bom para a balança comercial do País, por outro turbina os preços internos. “Ao exportar, a oferta doméstica reduz o que pressiona a inflação, e torna mais caro tudo o que importamos, como trigo e gasolina”, explicou Braz.
O que a Rússia tem a ver com a alta do petróleo?
“Na tentativa de restringir e limitar os ganhos que o governo russo tinha com as exportações de petróleo, derivados e gás natural, as novas restrições acabam englobando produtores de petróleo e gás importantes, além de adicionar 183 navios, traders, seguradoras e outros agentes que estão envolvidos na movimentação de produtos russos no comércio internacional a essa lista de sanções”, explicou a analista de Inteligência de Mercado da StoneX, Isabela Garcia.
Ela observou que esse movimento aumenta os riscos e a dificuldade de se negociar, transacionar os produtos russos no mercado internacional e que já existe uma preocupação da disponibilidade do petróleo russo no mercado internacional, num contexto de um balanço de oferta e demanda global já apertado, considerando que Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) tem feito restrições sobre a oferta do grupo no começo deste ano.
“Se tem preocupações de que os países que dependem muito do petróleo russo, como Índia e a China, se voltem para outros fornecedores nesse curto prazo para atender a necessidade doméstica, enquanto se tem um cálculo ou esperam maiores direcionamentos dos próprios governos e buscam também alternativas para as novas sanções”, afirmou a analista, lembrando que o movimento contra a Rússia era especulado havia um tempo no mercado, e já se tinha preocupações de que o novo governo de Donald Trump poderia endurecer sanções contra países como a Rússia, Venezuela e Irã.
O que o comando da Petrobras tem dito sobre preços?
No final do ano passado, quando o petróleo ainda não tinha batido os US$ 80 o barril, a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, disse em entrevista ao Canal Livre, da Band News, que não havia intenção em mexer nos preços, e que a empresa estava ganhando dinheiro mesmo com os preços “abrasileirados”.
Também em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast no último dia do ano, o diretor financeiro e de relações com investidores da Petrobras, Fernando Melgarejo, afirmou que não havia “correria para reajustar os combustíveis”.
Nesta segunda-feira, 13, a Petrobras afirmou ao Estadão/Broadcast que “segue observando os fundamentos de mercado e, por questões concorrenciais, não pode antecipar suas decisões”.
A empresa afirmou, também, que não é responsável pela comercialização de combustíveis nos postos revendedores e que o preço praticado nas suas refinarias é apenas uma das parcelas que compõem o preço percebido pelo consumidor nas bombas.
“Portanto, o preço final de revenda pode ser influenciado pelos preços praticados por outros fornecedores, e ainda inclui o custo da mistura obrigatória de biodiesel no diesel, tributos, e custos e margens de distribuição e revenda, sobre os quais a Petrobras não possui qualquer influência”, explicou a companhia.
A empresa lembrou que, em 2024, o único reajuste no preço de venda de gasolina A da Petrobras para as distribuidoras ocorreu em julho, e foi equivalente a R$ 0,15 a cada litro vendido nas bombas. Atualmente, em média, a parcela do preço de venda da Petrobras para as distribuidoras é equivalente R$ 2,21 a cada litro abastecido nas bombas.
Sobre o diesel, o último aumento nos preços de venda da Petrobras para as distribuidoras ocorreu em outubro de 2023. Depois disso, a Petrobras ainda fez duas reduções de preços em dezembro de 2023. E, em 2024, não fez nenhum reajuste nos seus preços de venda para as distribuidoras. Hoje, a parcela da Petrobras no preço ao consumidor é, em média, R$ 3,03 a cada litro vendido na bomba, informou.
Qual é a cotação de fechamento do petróleo no dia?
Os contratos futuros de petróleo fecharam novamente em forte alta nesta segunda-feira, 13, ainda repercutindo as novas sanções dos EUA contra a Rússia e deixando em segundo plano o possível acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas.
Na New York Mercantile Exchange (Nymex), o petróleo WTI para fevereiro fechou em alta de 2,93% (US$ 2,25), a US$ 78,82 o barril, enquanto o Brent para março, negociado na Intercontinental Exchange (ICE), avançou 1,56% (US$ 1,25), a US$ 81,01 o barril.
A commodity alcançou nesta segunda-feira, 13, os maiores níveis desde agosto passado. Em resposta às sanções dos EUA — que incluem bloqueios a grandes empresas de petróleo e gás —, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou que a Rússia procurará maneiras de reduzir seus efeitos sobre seu setor.
Os analistas da Citi estimam que as medidas poderiam cortar o fornecimento em 800 mil barris por dia (bpd) no pior cenário, mas, embora seja difícil, a Rússia conseguiria atenuar o impacto para uma perda de 300 mil bpd se operar suas refinarias com mais força.
Há um potencial de aumento dos preços do petróleo após o anúncio das novas sanções, já que a possível queda na oferta cria um risco de alta nos preços, diz o Morgan Stanley. Os analistas do banco agora preveem que o Brent terá uma média de US$ 77,50 o barril no primeiro trimestre e US$ 75 o barril no segundo trimestre, ambos com um aumento de US$ 5 em relação à perspectiva anterior, acrescentando mais evidências à teoria de que 2025 será um ano de alta para o petróleo.
Investidores acompanham também os desdobramentos do possível acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que pode resultar na soltura de 33 pessoas em sua primeira fase, além da retirada gradual das forças de defesa israelenses de Gaza. Todavia, o ministro das Finanças de Israel chamou o possível acordo de “catastrófico” e defendeu “força total” até a rendição do Hamas.