Valor Econômico
A crise de confiança detonada pela interferência do governo na Petrobras prejudicou a correlação entre as ações da estatal e os preços de seu principal produto de exportação, o petróleo. Apesar do cenário quase ideal para qualquer outra petroleira no mundo – de câmbio depreciado e commodities em alta -, analistas afirmam que os movimentos de mercado da Petrobras são direcionados em grande medida pelo vaivém em Brasília. Dessa forma, o risco é de que o descompasso continue e possa até emendar com o início do ciclo eleitoral.
Neste ano, as ações da Petrobras acabam perdendo a oportunidade de aproveitar o rali dos preços de petróleo. Enquanto as ações ordinárias da estatal acumulam desvalorização de 27,78% em dólares e 19,24% em reais, os contratos futuros de petróleo estão em caminho quase oposto. Uma das referências no mercado internacional, o barril de Brent registra valorização de 24,65% neste ano, cotado a US$ 64,57.
“Até o começo do ano, as ações da Petrobras vinham se comportando como o esperado em um cenário de alta de commodities e se valorizavam de acordo com as mudanças na curva dos contratos futuros de petróleo. Mas, com a crise, a política de preços de combustíveis da Petrobras passou a ter um efeito muito maior na cotação”, explica William Leite, sócio-fundador da Helius Capital.
O desgaste em torno da Petrobras começou na virada entre janeiro e fevereiro com críticas de parte do mercado sobre a defasagem entre os preços de combustíveis aplicados pela estatal no Brasil e as cotações do petróleo no mercado internacional. Vale lembrar que a Petrobras não é apenas exportadora de petróleo, mas também importa parte do insumo para a demanda interna. Logo, suas margens de receita tendem a ficar prejudicadas quando a empresa não repassa os preços internacionais ao mercado local.
O problema é que o ajuste nos preços de combustíveis também gera atritos internos, como as ameaças de novas greves de caminhoneiros. Não à toa, o “dilema do diesel” ganhou proporções ainda maiores quando a companhia anunciou uma série de ajustes nos preços, elevando os valores de combustíveis no país. O presidente Jair Bolsonaro fez críticas públicas sobre as decisões da estatal e, em seguida, indicou um novo CEO para substituir Roberto Castello Branco no comando da empresa.
“A maneira como a troca de gestão ocorreu não nos permite diminuir a percepção de risco em torno de possíveis mudanças na Petrobras. Será uma surpresa se tudo ficar como estava”, alerta Gabriel Fonseca, analista de energia e petróleo e gás na XP Investimentos, que segue com recomendação de “venda” para as ações.