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Há quase quatro semanas sem mexer nos preços do diesel e da gasolina, a nova gestão da Petrobras encontrou, até o momento, um ambiente macroeconômico relativamente tranquilo para lidar com os reajustes dos combustíveis – tema caro tanto a Jair Bolsonaro quanto a investidores que viram com desconfiança a troca do comando da estatal, em meio a queixas do presidente da República sobre os preços da petroleira.
O dólar em queda e o petróleo relativamente estável têm permitido ao novo presidente da empresa, o general Joaquim Silva e Luna, segurar reajustes e, ao mesmo tempo, manter os preços próximos à paridade de importação. A questão é saber até quando será possível conciliar os dois.
Estatal mantém preços próximos à paridade de importação, mesmo há 25 dias sem reajustes no diesel e na gasolina
Desde que Silva e Luna tomou posse, no dia 19 de abril, o barril do tipo Brent acumula alta de 3,7%. Por outro lado, o dólar contrabalançou esse aumento, ao recuar 5,6% no período. Em quase 40 dias sob nova administração, a estatal só anunciou, no dia 30 de abril, um único ajuste nos preços: queda de 2% no litro da gasolina e do diesel. Desde então, o Brent acumula valorização de 2,95% e o dólar baixa de 1,6%.
Nada que demande, por ora, grandes ajustes no mercado. Segundo a consultoria Stonex, até a manhã de ontem a Petrobras trabalhava pontualmente com ligeiro prêmio que dava espaço para corte de R$ 0,0169 no litro do diesel. No caso da gasolina, por outro lado, havia espaço para aumento de R$ 0,0138 no litro. A Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), por sua vez, calculava ontem pequena defasagem de 2% para a gasolina e de 3% para o diesel.
Silva e Luna assumiu o comando da Petrobras prometendo reduzir as volatilidades nos reajustes. Segundo uma fonte, a tônica da nova administração tem sido evitar repassar para o mercado doméstico as oscilações internacionais desencadeadas por fatores conjunturais. Um exemplo dessa preocupação, cita, foi o lançamento, este mês, dos novos modelos de contrato de gás natural – com a opção de indexação à referência americana de gás, o Henry Hub, historicamente mais estável que o Brent.
Internamente, a decisão sobre os reajustes é tomada na Petrobras com base num diálogo entre as equipes técnicas das diretorias de comercialização e financeira, que forma o Grupo Executivo de Mercado e Preços (Gemp). Pelas regras, cabe ao presidente intervir em casos de impasse.
A Petrobras esclareceu que o Gemp “mantém a mesma composição e a mesma estrutura decisória sobre preços, sendo assessorado pelas mesmas áreas técnicas das diretorias de Marketing e Comercialização e de Finanças que já vinham prestando suporte”.
O Valor apurou que Silva e Luna tem buscado uma interação próxima junto aos diretores nas discussões sobre os preços. A prática de reajustes sem uma periodicidade definida segue mantida.
Segundo a fonte, o Gemp tem se dedicado a avaliar se as variações internacionais são de âmbito estrutural ou conjuntural, antes de decidir por reajustes. Na prática, essa estratégia pode representar reajustes menos frequentes. Na gestão de Castello Branco, eram comuns mudanças semanais nos preços, embora elas estivessem mais espaçadas pelo menos desde o fim do ano passado.
“Observamos o mercado e, a partir de uma percepção de um realinhamento de patamar, seja de câmbio, seja de cotações, fazemos ajustes, seja para cima, seja para baixo”, explicou o diretor de comercialização e logística da Petrobras, Cláudio Mastella, a investidores, neste mês.
O novo comando da petroleira mantém a premissa de alinhamento ao preço de paridade de importação (PPI), o que não impede que a estatal mantenha seus preços abaixo da referência internacional por um tempo. Em 2020, a petroleira estendeu de trimestral para anual o período limite de apuração do alinhamento ao PPI. Esse prazo foi mantido na nova gestão.
Para o analista da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman, a nova administração da Petrobras tem adotado uma posição “low-profile” (discreta) e se esforçado para não criar ruídos – seja no mercado, seja no Palácio do Planalto. Ele elogia a postura da companhia de reforçar os compromissos com a redução da dívida, aumento do pagamento de dividendos e com o alinhamento aos preços internacionais. O analista questiona, porém, até que ponto as condições macroeconômicas se manterão favoráveis à estabilidade dos preços.
“Hoje temos um cenário estável muito melhor do que o que se desenhara quando fora anunciada a troca [no comando da Petrobras], mas me pergunto sobre a sustentabilidade dele. Com a corrida eleitoral batendo na porta, essa questão dos preços fica latente”, disse. “As mudanças [no comando da estatal] não foram feitas para que vejamos as coisas do mesmo jeito que estavam antes”, completou.
Arbetman vê com ressalvas a estratégia da Petrobras de conter as volatilidades conjunturais. Ele diz que ainda falta clareza sobre os critérios dos reajustes e cita que não há nenhum indício de mudança estrutural no mercado que justifique, por exemplo, a opção pelo corte de 2% nos preços dos combustíveis na virada de abril para maio – o único ajuste feito pela administração de Silva e Luna até o momento.
O líder da área de petróleo da Stonex, Thadeu Silva, também faz ressalvas à estratégia de se aguardar mudanças estruturais para reajustar. Ele alega que identificar quando o mercado está de fato num novo patamar ou quando as oscilações são conjunturais é uma tarefa complexa, de difícil precisão e que pode levar muito tempo. “Eles podem adotar uma estratégia de amortização dos reajustes, mas não têm como saber se o preço vai cair amanhã ou não”, disse.