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A diretoria da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) aprovou por unanimidade, nesta quinta-feira (23/11), a resolução que regulamenta a importação de biodiesel para uso na mistura obrigatória ao óleo diesel no Brasil, atualmente em 12%. O setor produtivo nacional é contra a medida.
De acordo com a ANP, a importação de biodiesel vai competir com apenas 20% da produção nacional, uma vez que 80% do biocombustível comercializado no país precisa ser adquirido de produtores rurais detentores do Selo Biocombustível Social. O país deve produzir cerca de 7,4 bilhões de litros em 2023.
“Todo o debate diz respeito a 20% do biodiesel que integra o mandato. Significativamente, quer dizer que nós não estamos em nenhuma medida comprometendo o desenvolvimento da indústria nacional produtora de biodiesel, isso já está assegurado em políticas públicas nos termos do que deve ser contratado dentro do Brasil, os 80% do selo combustível social”, disse a diretora Simone Araújo.
O diretor Fernando Moura disse que a regulamentação da importação aumenta a concorrência e as opções de compra para cumprimento do mandato. Segundo ele, isso é importante já que há indicações de aumento do percentual de mistura. A indústria nacional, no entanto, reclama de ociosidade e diz que pode atender essa elevação, até 15%, com a capacidade instalada.
“O cronograma [de mistura] está posto, aprovado, e se fala num eventual encurtamento, podendo ir a B13 e B14 no final do ano que vem. A se comprovar essas ideias, faz sentido falar em aumento da oferta e redução das barreiras de entrada do biodiesel no Brasil”, disse Moura. O diretor Cláudio Jorge disse que o “mercado brasileiro já está maduro o suficiente para que isso [importação] ocorra”.
O relator, diretor Daniel Maia Vieira, disse que a proposta aprovada nesta quinta-feira apenas cumpre o papel da ANP de regulamentar as decisões tomadas pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Em 2020, o colegiado aprovou uma resolução que, no entendimento da agência, retirou a vedação à importação do biocombustível.
“Em que pese ter ciência das discussões sobre potenciais consequências que a importação pode gerar no mercado de biodiesel nacional, a proposta aqui é desprovida de avaliação de custo-benefício da opção política do CNPE, política no sentido de política pública”, disse Vieira durante a sessão. “Limito a implementar a escolha adotada pelo CNPE, fazendo cumprir a missão da ANP”, apontou.
A proposta de regulamentação da importação de biodiesel estava em discussão na ANP há um ano. Em junho, foi retirada de pauta após ser levantada a possibilidade de o CNPE alterar novamente as diretrizes sobre a comercialização e voltar a impedir a importação, o que não ocorreu.
“A liberalização das importações de biodiesel pelo Brasil poderá dar acesso ao produto no mercado internacional, com diferentes origens alternativas, trazendo potenciais benefícios aos consumidores brasileiros”, disse a agência, em nota.
Os diretores da ANP rebateram apontamentos feitos durante a consulta pública da matéria sobre a possível prática de dumping nos países com potencial de exportar biodiesel para o Brasil. Outro questionamento foi em relação à qualidade do biocombustível importado, já que a produção nacional obedece regras rígidas. Durante o processo de regulamentação também foi levantada a necessidade de realização de Análise de Impacto Regulatório (AIR) da importação, dispensada pela agência por estar apenas cumprindo determinação no CNPE.
Durante a votação da resolução, os diretores comentaram que as questões de comercialização, qualidade e concorrência estão totalmente contempladas nas normais vigentes no país. “A agência avaliou que as resoluções que tratam de normas de comercialização de produtos importados são 100% aderentes a essa matéria. Sobre a habilitação de agentes de comércio exterior, produtores, distribuidores, não faz sentido limitar agente que pode importar, muito menos o próprio volume. A limitação está vinculada ao volume do selo biocombustível social”, disse o relator, Daniel Maia Vieira.
A resolução aprovada nesta quinta-feira altera pontualmente a Resolução ANP nº 777/2019, que limitava a comercialização do biodiesel importado apenas para fins de consumo próprio do adquirente ou para uso experimental autorizado pela agência, já que agora o produto importado poderá ser usado para cumprimento do mandato obrigatório de adição ao diesel fóssil.
A norma também altera a Resolução ANP nº 857/2021, para inserir o agente de comércio exterior na prática de comercialização do biodiesel por spot market, e retirar a limitação da comercialização do biodiesel importado.
Setor produtivo reclama da decisão
O setor produtivo do biodiesel reagiu contra a decisão da ANP desta quinta-feira (23/11), que regulamentou a importação do biocombustível.
A União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio) pretende reverter a autorização para as importações via Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). A abertura de mercado para o biocombustível estrangeiro está prevista, no entendimento da ANP, em uma resolução do colegiado de 2020.
“Certa do apoio dos atuais membros do CNPE, diferentemente da orientação do governo passado que gerou uma resolução contrária à Lei 9.478/97 (Política Energética Nacional), tem confiança na reversão da decisão para assegurar segurança jurídica do setor e o interesse nacional”, disse a Ubrabio, em nota.
Segundo a entidade, a decisão tomada pela ANP “diverge de todos os princípios que rezam sobre o interesse nacional, uma vez que a medida fatalmente resultará em efeitos nocivos à economia brasileira, tendo em vista a importância do biodiesel para a segurança alimentar, energética, econômica e de saúde pública para o Brasil”.
A entidade reforçou que a indústria nacional tem capacidade instalada para suprir a demanda com o aumento da mistura e disse que a liberação da importação pode criar entraves para a transição energética, com a geração de uma “competição predatória” entre players internacionais “fortemente subsidiados no campo da exportação e sem o compromisso com as obrigações legais seguidas pelas usinas nacionais”.
Já a Associação dos Produtores de Biocombustíveis (Aprobio) disse que a importação coloca em risco a estratégia de investimento e de recuperação do emprego na indústria nacional, que tenta reverter a ociosidade de 50% das empresas produtoras devido à “quebra de previsibilidade” da política de aumento da mistura obrigatória no diesel fóssil nos últimos anos.
“O produto importado, muitas vezes subsidiado, gera emprego no exterior, não atende aos mesmos requisitos de produção nacional e impacta a agricultura familiar beneficiada pelo Selo Biocombustível Social. O setor não é contra a abertura do mercado, mas entende que isso deve acontecer em igualdade de condições. Esperamos que a decisão seja revertida na próxima reunião do CNPE”, disse, em nota, Francisco Turra, presidente do Conselho de Administração da Aprobio.
Fonte: Globo Rural