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Valor Econômico

O governo federal começou a articular um plano para atrair investimentos verdes que tendem a não serem mais realizados nos Estados Unidos, depois de o presidente americano, Donald Trump, cancelar uma série de políticas adotadas por seu antecessor, Joe Biden. As conversas envolvem atores como Ministério da Fazenda, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que é o gestor do Fundo Clima, e Ministério de Minas e Energia.

Segundo o Valor apurou, investidores e representantes de fundos também já comunicaram ao Palácio do Planalto que, diante da perspectiva de menos subsídios e juros reduzidos para programas verdes nos Estados Unidos, o Brasil pode atrair recursos na área. Parte desses recados foi dada no contexto da sanção da lei que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), realizada na quarta-feira 22.

Outra aposta é a estruturação, o mais rápido possível, do mercado de crédito de carbono. A lei que institui esse sistema foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de 2024, mas ainda faltam algumas regulamentações administrativas que não precisam passar pelo Congresso.

Uma das possibilidades que vêm sendo trabalhadas pelo Executivo é a criação de uma secretaria específica para tratar do mercado de carbono, o que poderia, na visão de autoridades ouvidas pelo Valor, dar tração a esses procedimentos. Um dos desenhos possíveis é que essa secretaria fique inicialmente dentro do Ministério da Fazenda.

O governo tem se baseado em estudo publicado em 2020 pelo Banco Mundial o qual afirmava que, com a regulamentação desse mercado, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro poderia alcançar em 2030 um patamar 2,2% superior ao previsto sem a regulamentação. O estudo também calcula que, nesse caso, a renda real dos 20% mais pobres da população seria 25% maior no começo da próxima década. O desemprego também cairia, de acordo com o estudo.

Criação de secretaria específica para tratar do mercado de carbono está em estudo pelo governo

Outra iniciativa considerada importante nos bastidores é a conclusão da taxonomia sustentável, uma espécie de sistema de classificação para ativos e projetos sustentáveis ambientalmente, conduzida em parceria com o Banco Central (BC). Tanto a regulamentação do mercado de carbono quanto a conclusão da taxonomia fazem parte das 25 prioridades para os próximos dois anos apresentadas na semana passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em reunião ministerial. Outras sete medidas consideradas prioritárias por Haddad também são ligadas à sustentabilidade ambiental.

Uma fonte destaca que as políticas adotadas por Biden, embora fossem “positivas do ponto de vista climático”, eram “extremamente protecionistas” e acabavam atraindo grande parte dos recursos para os Estados Unidos. Com a reversão dessas políticas, a tendência é que parte desses investimentos sejam transferidos para o Brasil.

De acordo com essa fonte, a discussão dentro do governo federal no fundo envolve como aproveitar o novo fluxo de recursos “para dar potência” para o Plano de Transformação Ecológica. Coordenado pelo Ministério da Fazenda e contendo mais de cem ações diferentes para serem implantadas gradualmente até 2026, o plano tem o objetivo de, ao mesmo tempo, “descarbonizar” a economia brasileira e impulsionar o crescimento econômico. Entre essas ações, estão a própria regulamentação do mercado de carbono e a emissão, que já teve início, de títulos soberanos para financiar políticas públicas de combate às mudanças climáticas.

Como publicou o Valor no começo da semana passada, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, recebeu orientação do próprio presidente para apresentar o Brasil no Fórum Econômico Mundial de Davos como um destino seguro de investimentos em energia renovável. A ideia era justamente fazer um contraponto aos Estados Unidos de Trump.

Na Suíça, Silveira se reuniu com o diretor-executivo da Agência Internacional de Energia, Fatih Birol, o comissário europeu para Energia e Habitação, Dan Jorgensen, o CEO global da empresa espanhola de energia Iberdrola, Ignacio Galán, e o fundador da Microsoft, Bill Gates. Silveira inclusive convidou Gates para participar da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP) 30, que será realizada em novembro, em Belém (PA).

Reportagem publicada na semana passada pelo jornal “Financial Times” calculava em US$ 300 bilhões o total de investimentos verdes já congelados por causa das ações de Trump. Entre elas, está a reversão de US$ 1,2 trilhão que seria destinado para o aprimoramento de sistema de transporte e US$ 370 bilhões que seriam destinados para projetos sustentáveis.

Uma nota técnica divulgada na última quinta-feira pelo Centro de Liderança Pública (CLP), instituto de avaliação de políticas públicas, destaca positivamente as propostas de regulamentação do mercado de carbono e de taxonomia. No caso da primeira medida, o CLP se diz “favorável com ressalvas”, afirmando que a regulamentação poderá “impulsionar investimentos em tecnologias limpas, valorizar ativos ambientais e fomentar a redução de emissões de gases de efeito estufa”. Mas diz que também será necessário, por exemplo, “estabelecer parâmetros unificados para registro e validação de créditos [de carbono], garantindo transparência e participação de todos os agentes”, além de “definir metas setoriais factíveis, sob pena de desestimular a competitividade de indústrias que operam em bases mais sustentáveis”.

No caso da taxonomia, o CLP é favorável à medida, sem ressalvas, afirmando que ela “tem grande potencial para direcionar fluxos de capital privado e público a projetos de alto impacto socioambiental positivo, ao definir critérios claros e científicos sobre o que se enquadra como ‘sustentável’”.

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