Entre as promessas futurísticas para controlar a emissão de gases de efeito estufa, a geotermia é uma das mais interessantes. O conceito é simples: o centro da Terra tem uma temperatura absurdamente elevada, como a da superfície do Sol (6.000ºC). Significa que, quanto mais profundo for um poço, maior será a temperatura da rocha circundante. Em locais com geologia favorável, é possível atingir 500ºC com um poço de “apenas” 5 km.
Dois poços paralelos e conectados, um para injeção de água fria e outro para produção de vapor ou água quente, forçariam um movimento contínuo, de cima para baixo no poço frio e de baixo para cima no quente, por efeito da diferença de densidade. Haveria uma conexão horizontal entre os dois poços para a água líquida em movimento absorver o calor da rocha circundante.
Esse processo poderia substituir a queima de combustíveis fósseis como fonte primária de energia na produção de eletricidade. Poderia também ser usado, com alguma adaptação, nas usinas existentes atualmente movidas a carvão.
Diferentemente do carvão, que só é encontrado em alguns locais e é fóssil (não renovável), qualquer ponto da crosta terrestre poderia ser candidato à perfuração profunda, de até 20 km, tornando-se uma fonte inesgotável de energia. Naturalmente, de início seriam selecionados os locais geologicamente atraentes, já mapeados.
Ao contrário da energia eólica ou solar, que são fontes renováveis, mas intermitentes, ou da fonte hídrica, que, apesar de controlável, depende das condições hidrológicas, a geração pela fonte geotérmica teria a vantagem adicional de estar sempre disponível.
Atualmente, não existe tecnologia economicamente viável para perfurar poços tão profundos. Porém a indústria de óleo e gás começa a olhar com interesse para o desafio. Uma das possibilidades é pulverizar a rocha com um dispositivo denominado girotron, que emite micro-ondas de altíssima potência. Se funcionar, poços profundos poderão ser escavados com custo unitário (R$/metro) que independe da profundidade, o que não ocorre com os métodos tradicionais.
Há mais de cem anos eletricidade é produzida em regiões vulcânicas, onde água quente e vapor de água emergem naturalmente pelas fraturas das rochas. Mas, como há poucos locais com essas características, atualmente apenas 0,5% da eletricidade produzida globalmente tem origem na geotermia.
Se o girotron ou alguma outra inovação disruptiva funcionar, a energia geotérmica será um poderoso instrumento no controle das emissões de gases de efeito estufa. Essa nova fronteira tecnológica é talhada para ser pesquisada pela indústria de óleo e gás. É a chance de ela se transformar de patinho feio em cisne.
Mudando de assunto. Um mês atrás, tratei neste espaço do imbróglio relativo à Âmbar no contexto da contratação emergencial de energia feita pelo governo no fim de 2021. Opinei que, como a empresa tinha descumprido o edital, o correspondente contrato deveria ser cancelado, com economia de R$ 10 bilhões para a sociedade.
Felizmente, o processo de conciliação que estava em curso no TCU foi recentemente arquivado. Se fosse aprovado, permitiria a substituição de quatro usinas novas, que não estavam operacionais no prazo contratual, por uma usina velha de guerra, a UTE de Cuiabá. Seria um flagrante desrespeito ao edital.
Resta agora aguardar que a Justiça, aonde o assunto certamente vai chegar, decida contrariamente à tentativa de chamar urubu de meu louro.