Artigo: O preço do combustível e o etanol de milho

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Correio Braziliense

JOSÉ SÉRGIO GABRIELLI DE AZEVEDO – Economista, professor titular aposentado da Universidade Federal da Bahia(UFBA), ex-presidente da Petrobras e pesquisador do Ineep
NATHÁLIA PEREIRA DIAS – Engenheira química, mestre em engenharia da nanotecnologia, pós-gradu Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep)

O Brasil possui um gigantesco potencial na produção de biocombustíveis. Todavia, a expansão dessa fonte na matriz energética está condicionada a uma série de fatores. Destaca-se o fato de a atual política de preços para os combustíveis fósseis gerar incertezas de longo prazo, principalmente para o etanol. Além disso, a adoção de estratégias para impulsionar a indústria de biocombustíveis, particularmente do etanol, se mostra cada vez mais necessária.

O atual governo, preocupado apenas com sua reeleição, tem forçado a redução de preços da gasolina para elevar sua popularidade. Essa política, sem uma contrapartida para o segmento de etanol, provoca uma grande incógnita para o futuro desse combustível no Brasil. Na primeira semana de outubro, por exemplo, os produtores de etanol já foram obrigados a elevar em 0,89% o preço médio do etanol hidratado para sustentar a rentabilidade do setor.

O mercado de biocombustíveis, principalmente do etanol, coloca o Brasil em destaque no ranking dos países que mais consomem combustível limpo no mundo. O etanol é obtido, principalmente, da cana-de-açúcar e biodiesel do processamento da soja, mas também do milho.

No último ano, mesmo com os impactos negativos na produção do etanol, a partir da cana-de-açúcar, aquela advinda do milho segue, ao contrário, tendência de crescimento expressivo. O preço do grão está tão atrativo aos produtores que os investimentos têm se intensificado nesse segmento. Tanto que, a expectativa do Conab (2022) é de que a produção do combustível limpo a partir do processamento do cereal seja elevada em até 30,3% nesta safra, devido à forte entrada das usinas localizadas em Mato Grosso do Sul no mercado de etanol.

Para a safra de 2022/2023, o país já conta com 17,2 milhões de hectares de área para cultivo do milho, garantindo o fornecimento da principal matéria-prima usada no processo de obtenção do etanol atualmente, além de haver grande potencial de expansão, uma vez que a área utilizada para o plantio de soja também pode receber o cereal. Há indícios de que a oferta de milho está garantida até 2024.

Entretanto, ainda que a produção esteja avançando, o etanol vem enfrentando dificuldades em termos de comercialização, uma vez que as questões tributárias, por conta das mudanças. promovidas pelo atual governo, provocaram a perda da competitividade do biocombustível frente aos demais até, pelo menos, o fim de 2022. O preço do etanol, para ser competitivo, necessita custar 70% do preço da gasolina, tornando-o uma fonte energética tomadora de preço e não formadora como no caso do fóssil.

Com a política de cortes forçados nos preços da gasolina, a partir da redução dos tributos federais e estaduais, os produtores estão em alerta com receio de ter sua rentabilidade afetada no longo prazo. A expectativa do setor é que, como essas medidas têm data para terminar, eles possam voltar a ter uma folga para reajustar o valor do etanol. Todavia, enquanto a questão do preço dos combustíveis fósseis não tiver uma estabilidade, esse problema continuará afetando os produtores de etanol.

Há saídas para contornar o cenário atual: estimular a produção de etanol proveniente do milho, visto o alto potencial do segmento em impulsionar o mercado de biocombustíveis; promover a equalização tributária etanol-gasolina, a fim de reduzir às disparidades e melhorar a competitividade do combustível limpo junto ao mercado consumidor; propor um modelo de venda da cana do tipo flex para conduzir melhor o mercado, caracterizado pela venda da cana via acoplagem e/ou agregação de planta de milho, viabilizando o retorno da produtividade da cana-de-açúcar para equilibrar a oferta; e retomar o programa RenovaBio que tem oportunidades efetivas para suportar as discussões sobre o papel estratégico dos biocombustíveis na matriz energética brasileira. Mas, pelo que temos visto, essa não parece ser a prioridade do atual governo.

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