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O Globo | Míriam Leitão

Há vários equívocos nas propostas que tramitam no Congresso para tentar reduzir o preço dos combustíveis. Uma das ideias é mudar a fórmula de cálculo do ICMS para ser um valor fixo e não um percentual. Em geral, os impostos são percentuais sobre alguma coisa: lucro, renda, valor adicionado. O PIS/Cofins sobre combustíveis é dos poucos que é valor fixo. Os estados tiveram aumento de arrecadação, mas não foram ‘culpados’ pela alta dos preços, aliás, o governo federal também aumentou sua arrecadação em todos os tributos no ano passado.

O principal erro das propostas é achar que o país deve subsidiar combustíveis fósseis. Isso incentiva o uso de um grande emissor de gases de efeito estufa. Sendo um subsídio linear é ainda pior. Com o diesel mais barato, estamos dando dinheiro para o caminhoneiro autônomo. Mas também para a empresa que tenha frota de transporte, para a lancha, para o iate e os SUVs. A gasolina mais barata ajuda a família que tem apenas um carro e cujo orçamento está apertado com a escalada dos preços. Mas o benefício irá também para os ricos com a garagem cheia de carros de luxo.

A proposta de segurar o preço dos combustíveis é um fetiche que captura partidos de todas as tendências. Tanto que a ideia de que o ICMS deve ter valor fixo é defendida pelo presidente Jair Bolsonaro, e o senador que está relatando esse projeto é do PT, Jean Paul Prates.

O senador relata dois projetos. Um deles cria uma conta para atenuar as altas de preços, o outro transforma em valor fixo a cobrança do ICMS. Prates defende os seus projetos argumentando que nenhum dos dois envolve desoneração, por isso não haveria problema com a lei eleitoral, que impede esse tipo de benefício perto das eleições.

O problema é que eles tiram recursos dos cofres públicos. O fundo seria financiado com parte dos royalties de petróleo, da participação especial e dos bônus de assinatura. Recursos que deixariam de entrar no Tesouro para ir para os consumidores. Outra ideia, que já enfrenta uma série de emendas contrárias, é de criar um imposto de exportação de petróleo para capitalizar esse fundo.

Um especialista na área de petróleo explica que o principal efeito de um imposto de exportação de petróleo é desestimular novos projetos de investimento e a recuperação de campos de produção.

– A nascente indústria de produtores independentes de petróleo formada por pequenas empresas privadas, em grande parte nacionais, tem como principal destino a Petrobras. A estatal vai repassar o imposto na forma de preço mais baixo na compra do petróleo. A maior parte dessas empresas opera no Nordeste, onde foram muito bem recebidas pelos prefeitos porque estão investindo e gerando empregos. Elas é que teriam perdas com esse imposto – explicou.

Sobre a ideia de que o erro está em o ICMS ser um percentual, em vez de um valor fixo, e que isso teria elevado a arrecadação estadual, é bom dar uma olhada nos números federais. A arrecadação federal de todos os impostos cresceu 17,36% em termos reais no ano passado, em relação ao ano anterior. Os dois impostos que arrecadam mais são Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre Lucro Líquido. Ambos são um percentual sobre o lucro. O IRPJ é dividido com os estados, e a CSLL, não. Juntos tiveram um crescimento real de 31%.

Como explicou um tributarista, o padrão de tributação no Brasil é alíquota como percentual. O PIS/Cofins sobre os combustíveis é fixo, mas sobre outros produtos é percentual. Os estados fazem na tributação dos combustíveis o mesmo que fazem no ICMS de todos os produtos. Mas alguns estados têm alíquotas mais baixas, como São Paulo. Isso quer dizer que se for adotado um valor fixo, pode ter aumento de preço em alguns lugares.

Toda essa discussão começou porque o governo quer ajudar os caminhoneiros. O total de caminhões registrados é de 2.513.943. Destes, 1.552.193 caminhões pertencem a empresas de transporte. Os caminhoneiros autônomos têm 929.011 veículos. Ou seja, 61,74% dos caminhões rodando pertencem às frotas das empresas e 36,95% são dos autônomos. O restante, 1,3%, é de cooperativas.

A gasolina e o diesel subiram pela alta do petróleo e do dólar. Aliás, a moeda americana está caindo este ano. Mas todos os produtos afetados pelo dólar subiram também, como o trigo, o óleo de soja, remédios e a energia de Itaipu. Por que gastar dinheiro público especificamente com combustíveis?

Com Alvaro Gribel (de São Paulo)

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