O Estado de S.Paulo
A transição energética para uma economia sem emissões de gases efeito estufa não será rápida, principalmente em países emergentes como o Brasil, na avaliação de Viviana Coelho, gerente executiva de mudanças climáticas da Petrobrás. A função foi criada recentemente pela estatal para reforçar a imagem de sustentabilidade das suas operações, em um momento que investidores pressionam por políticas mais sustentáveis. Ela acredita que o petróleo ainda terá espaço por muitas décadas para produtores eficientes.
Há 18 anos na Petrobrás, a executiva, que até outubro ocupava a gerência de Emissões, Eficiência Energética e Transição para Baixo Carbono, afirma que há mais de uma década a Petrobrás tem a transição energética no radar, com perfeita consciência da tendência de redução da demanda e do preço do seu principal produto, o petróleo. Mas, diferentemente de algumas de suas rivais, a opção, neste momento, é não entrar na produção de energias renováveis e continuar apostando no petróleo.
Os esforços são para manter em seu portfólio apenas projetos resilientes ao novo cenário de preços baixos. A seu favor, a empresa tem reservas gigantes da commodity no pré-sal, de baixo custo e baixo teor de carbono, garantindo, no entender de Coelho, uma vida longeva para os negócios da empresa.
“Em todos os cenários da Agência Internacional de Energia, você enxerga a desaceleração do consumo do petróleo, e eventualmente, em algum momento, uma retração nesse mercado. A gente não trabalha com uma data específica para o pico (do petróleo), o que fazemos é tentar ter um portfólio resiliente até para o pior caso. Trabalhamos com curva do preço do petróleo, e este ano revisamos essa curva, o que exige que nossos projetos tenham uma perspectiva de resiliência a US$ 35 (por barril)”, explica. Ela destaca que até os cenários mais agressivos mantêm o petróleo ainda por duas ou três décadas, com demanda significativa em 2040.
Nova geração. Ao mesmo tempo, diz, a empresa lançou em setembro o programa de Biorefino 2030, que prevê projetos para a produção de uma nova geração de combustíveis mais sustentáveis, como o diesel renovável e o bioquerosene de aviação. “Isso foi um exemplo prático de como a Petrobrás busca estar preparada para entrar em mercados que têm competência para ser o melhor player”, explica. “Existe uma transição em curso, mas não a ruptura completa, o petróleo não vai sumir de uma hora para outra, principalmente em países emergentes.”.
A executiva vê uma grande diferenciação no ritmo da redução do uso de combustíveis fósseis entre os países. “Teríamos cenários fracos se a gente não enxergasse que uma das tendências consolidadas do mundo é a expansão da mobilidade elétrica.
É um fator que pressiona a redução do mercado. Por outro lado, você vê no Brasil, por ser um País em desenvolvimento, que ainda tem uma previsão de expansão no setor de transporte”, afirma.
Metas de neutralidade de carbono para 2050, como muitas petroleiras têm feito, não fazem parte das pretensões da estatal, por entender que um prazo desse porte passa por muitas condicionantes. “Gostamos de metas bem concretas, que possamos conseguir explicar como vamos chegar lá.”
Estatal faz a opção possível, dizem analistas
Para analistas, a decisão da Petrobrás de não entrar na onda de produção de energia renovável, como muitas de suas concorrentes, é, no momento, a opção possível para uma empresa endividada e com grandes reservas de petróleo debaixo da terra.
“A Petrobrás não tem vantagens competitivas em geração renovável, isso ficou claro. O fato de não terem esse foco, porém, não significa que não tenha avançado em temas perpendiculares a essa pauta”, diz Ilan Arbetman, analista de petróleo e gás da Ativa Investimentos, citando o aumento da importância da redução das emissões no recente Plano Estratégico da empresa, que vai descartar projetos que tenham alta emissão de gás carbônico, entre outros avanços.
A descoberta do pré-sal, antes encarada como uma solução para as mazelas do Brasil, hoje representa um volume imenso de petróleo em um contexto de baixo preço e demanda, que pode até afastar investidores no médio prazo, o que torna o momento ainda mais desafiador para a petroleira brasileira. A vantagem, diz a companhia, é que o petróleo do pré-sal é de alta qualidade e com baixo teor de enxofre, e tem sido bem recebido pelo mercado internacional.
Para Renan Sujii, Estrategista Chefe de Investimentos no Grupo Harrison, a gestão da empresa desde Pedro Parente, em 2016, está olhando para dentro e focada na redução do endividamento. Até que isso seja solucionado, diz, será difícil ver a Petrobras diversificando suas operações. Pelo contrário, a empresa está se desfazendo de tudo que não seja petróleo e gás. Mas ele prevê que depois de resolvidos os problemas financeiros, a companhia deve olhar outros setores.
Declínio. Shin Lai, estrategista da Upside Investor, diz que já há muitos sinais de que a era de declínio do petróleo está em andamento.
“A China anunciou meta de emissões zero em 2060, a Inglaterra vai proibir venda de carros novos a gasolina em 2030 e com a eleição de Joe Biden, nos EUA, essa pressão vai ser ainda maior. Tudo isso coloca pressão sobre as petroleiras, ao mesmo tempo em que não podem acelerar a produção porque não tem demanda”, explica.