Valor Econômico
O programa federal RenovaBio, de estímulo a biocombustíveis e que estabelece metas de descarbonização para as distribuidoras, “tem inimigos e corre riscos”, alertou hoje, em evento online da consultoria Datagro, um dos principais criadores da política, Miguel Lacerda de Oliveira, exonerado na quinta-feira da Diretoria de Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME). Entre os problemas apontados está a incerteza que permanece sobre a tributação dos Créditos de Descarbonização (CBios).
O primeiro risco ao RenovaBio é o desmonte das equipes responsáveis pela gestão do programa no governo, disse. Ele afirmou que, no MME, já houve redução de nove para três do número de pessoas responsáveis – além do corte no orçamento. Segundo Oliveira, na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) também houve saída de diretores ligados ao mercado de biocombustíveis que “patrocinavam” o programa na agência reguladora. Um dos diretores próximos do programa que saiu da agência era Aurélio Amaral.
Outro risco se refere às incerteza tributárias que ainda cercam o programa, ressaltou. Apesar da derrubada do veto presidencial ao artigo da MP do Agro que tratava do assunto, Oliveira disse que ainda há lacunas, como a não regulamentação da tributação sobre pessoas físicas que queiram operar no mercado de CBios.
Também pode haver problemas para as usinas que emitem CBios porque não está claro na lei qual é a base de cálculo para a aplicação de imposto de renda, nem sobre o cálculo de PIS/Cofins ou da possibilidade de modificação de IOF no mercado secundário dos CBios.
Oliveira disse que sua equipe escreveu um projeto de lei e entregou ao MME para resolver as arestas de tributação sobre os CBios, com apoio de equipes de juristas da USP, mas que o projeto ainda não foi para frente.
Outro risco é a não punição dos distribuidores que não cumprirem suas metas ou de usinas que mentirem na certificação de sua produção, avaliou. Ele defendeu que o governo faça um acordo com o Ministério Público para garantir uma “punição exemplar” para quem descumprir as regras.
A lei do RenovaBio prevê que os distribuidores que não cumprirem suas metas de descarbonização devem ser multados e ter a parcela não cumprida das metas de compra de CBios acumulada para o ano seguinte.
Outro risco é a alteração das regras no longo prazo que descaracterizem o programa, como a própria definição das metas. “Construímos uma meta decenal. Aquelas metas são suficientes para um preço razoável e para uma transição energética para cinco a seis anos. Se no ano que vem, na resolução do CNPE que define a meta do ano subsequente, a meta for reduzida ou se houver mudanças na oferta de CBio, vai ter impacto muito negativo sobre preços”, alertou.
Ele também criticou uma proposta já feita por distribuidoras no processo de regulamentação do RenovaBio relacionada à criação de um preço-teto para os CBios, ou ao estabelecimento de um prazo para que as usinas coloquem seus CBios em oferta no mercado após a comercialização do biocombustível.
Oliveira defendeu, finalmente, que os CBios não devem alterar o de forma significativa o preço final dos combustíveis fósseis ao consumidor. Segundo ele, se o valor de todos os CBios necessários para 2020 e para 2021 fossem alocados apenas no preço da gasolina, o preço do produto teria que subir 1,7 centavo nas bombas para cobrir todas as despesas das distribuidoras com o RenovaBio. “Mas com a movimentação recente do câmbio, como o preço da importação média está menor, o repasse pode ser zero. Não tem justificativa de variação de preço ara o consumidor”, afirmou.