Bosch e Mercedes unem-se para testar veículos no Brasil

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Fonte: Valor Econômico

Fazia três anos que o engenheiro Besaliel Botelho havia começado a trabalhar na Bosch quando, em 1988, a injeção eletrônica chegou ao Brasil. O sistema que aposentou o velho carburador foi uma verdadeira revolução nos automóveis. Ele lembra que os testes com os carros eram feitos na rua. O Brasil dispunha de poucas opções de pistas específicas para testar veículos porque as novas tecnologias eram desenvolvidas fora do país. Tanto que um ano depois, o então candidato à Presidência da República, Fernando Collor de Mello, ganhou projeção ao comparar os carros brasileiros a carroças.

Aos poucos, o cenário mudou. Pistas de testes começaram a surgir nas montadoras e autopeças à medida que o país conseguia ter alguma participação em novos projetos. A necessidade de testes intensivos para desenvolver uma solução tropical, o carro com motor flex, levou a Bosch a construir sua própria pista em 2007.

O Brasil ainda está longe de se tornar uma referência em desenvolvimento veicular. Mas, aliado ao avanço do conteúdo tecnológico em automóveis e veículos de carga, o programa que concedeu incentivos fiscais para pesquisa e desenvolvimento na indústria automotiva, o Rota 2030, deu um empurrão nesse sentido.

Botelho, que há oito anos ocupa o cargo de presidente da Bosch na América Latina, celebrou ontem, ao lado do presidente da Mercedes-Benz na região, Philipp Schiemer, uma parceria inédita. As duas gigantes alemãs uniram-se para construir um centro de testes veiculares no Brasil.

Num investimento de R$ 70 milhões, dividido entre as duas empresas, o centro será construído junto à pista de provas que a Mercedes inaugurou no ano passado em Iracemápolis, no interior de São Paulo. A parceria terá o formato de um consórcio, com gestores de ambas as empresas, e duração de 20 anos.

Com previsão de inauguração em 2021, o complexo agregará 400 mil metros quadrados à atual pista da Mercedes, com mais cinco pistas, além de laboratórios e escritórios, com boxes conjugados.

Para divulgar à imprensa a novidade, que começou a ser discutida em 2016, Schiemer e Botelho fizeram uma apresentação conjunta, ensaiada e sincronizada, ontem, em São Paulo. Ambos destacaram a necessidade de agilizar os testes para atender às novas regras de redução de poluentes, economia de combustível e segurança, estabelecidas pelo Rota 2030, além de exigências que aparecerão quando o Brasil se inserir no contexto de carros elétricos e autônomos.

Além dos próprios testes, a dupla planeja vender os serviços do centro a outras empresas, do Brasil e outros países. Despesas e receita serão divididas entre Bosch e Mercedes. “Quando o cinto aperta todo o mundo fica criativo”, disse Schiemer.

Para o executivo alemão, um dos principais atributos de ter centros e pistas de testes no Brasil é reduzir custos e o tempo que normalmente se gasta quando peças e veículos são desenvolvidos nas matrizes das empresas.

Segundo ele, a pista de testes da Mercedes em Iracemápolis antecipou em um ano o lançamento da nova geração do Actros, caminhão recentemente apresentado ao mercado brasileiro.

Botelho e Schiemer estimam que os primeiros trabalhos no novo centro estarão voltados ao chamado controle eletrônico de estabilidade. O chamado ESP, na sigla em inglês, é um conjunto de sensores programados para ativar os freios em situações de risco em curvas e, assim, manter o carro na trajetória. O sistema passará a ser obrigatório nos veículos produzidos no Brasil a partir de 2022.

Schiemer foi taxativo ao comentar sobre os incentivos fiscais que serão usados no investimento do novo centro. “Países como Estados Unidos e Alemanha incentivam a pesquisa e desenvolvimento. Isso ajuda a construir o Brasil; não é subsídio. Quero deixar isso claro para não ficar a impressão de que a industria recebeu uma colher de chá”.

Os dois executivos preparam-se para fazer da apresentação de ontem um evento de boas notícias. E evitaram comentar as más. Reconheceram, porém, preocupações em relação a algumas questões, como o câmbio. “O problema não é o dólar, mas uma variação cambial que não nos permite planejar”, disse Schiemer.

Como outros exportadores, as duas empresas sofrem os efeitos da crise econômica na Argentina e os conflitos no Chile e Colômbia. Segundo Schiemer, os problemas nesses mercados menores ainda não afetaram a produção. “Mas a situação preocupa”, destacou.

Os mercados chileno e colombiano eram a esperança de a indústria automobilística compensar parte das sucessivas perdas de encomendas da Argentina.

Segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), de janeiro a outubro as exportações de veículos recuaram 34,7% na comparação com os dez meses de 2018. Na mesma comparação, a participação da Argentina nos embarques de automóveis e comerciais leves caiu de 72% para 51%.

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