Fonte: Valor Econômico
Com a compra da rede de postos de combustíveis e atividade de refino e lubrificantes da Shell na Argentina por US$ 950 milhões, a Raízen Combustíveis deu seu primeiro passo fora do Brasil. A companhia brasileira, terceira maior no mercado nacional na venda de gasolina, etanol, diesel e outros combustíveis, assume a vice-liderança no país vizinho e a segunda maior refinaria local.
A Raízen vinha negociando o ativo com a Shell, que é sua co-controladora junto com o grupo Cosan, há quase dois anos. A expectativa é que a transação seja fechada no segundo semestre, e até a conclusão da cisão dos ativos de exploração e produção de petróleo da Shell na Argentina, que não estão incluídos no negócio com a empresa brasileira.
"É a nossa primeira experiência de internacionalização, assumindo um ativo de grande porte, após sete anos de existência da Raízen", afirmou Luiz Henrique Guimarães, presidente da Raízen, ao Valor. A Raízen Argentina, como será rebatizada, vende 6 bilhões de litros ao ano, um quarto do volume comercializado pela distribuidora no Brasil.
Segundo o executivo, a operação argentina tem uma presença local forte pela marca Shell, além de aspectos similares com a brasileiras em logística, marketing e lojas de conveniência. "Houve um processo competitivo e apresentamos melhor oferta pelo ativo."
De acordo com uma fonte graduada do grupo brasileiro, a compra da operação representou uma oportunidade pontual de expansão e não está alinhada a uma estratégia de internacionalização dos negócios na América do Sul, ao menos por enquanto. O mercado sul-americano não tem porte suficiente para justificar um plano mais agressivo nesse sentindo, conforme essa fonte.
"Vamos dar um passo de cada vez", afirmou Guimarães, lembrando que a operação argentina tem potencial para crescer com embandeiramento (compra de postos já existentes de pequenas redes), melhoria na qualidade dos produtos na refinaria e investimentos em logística (novos terminais de combustíveis).
A empresa usará recursos do caixa para fazer frente ao negócio e, mais adiante, poderá recorrer a outra estrutura de financiamento. Há potenciais sinergias logísticas, mercadológicas e financeiras. O executivo Teófilo Lacroze, presidente da Shell Argentina, seguirá à frente da operação, reportando-se ao principal executivo da Raízen.
Operações adquiridas tiveram em 2017 receita de US$ 3,3 bilhões; com negócio, ação da Cosan subiu 4,63% na B3
Com o veto imposto à compra da Alesat pela Ipiranga, ficou claro o posicionamento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a novas operações que envolvam a BR Distribuidora, Ipiranga, Raízen e AleSat, donas de 75% do mercado brasileiro. Diante disso, a alternativa que sobra às grandes nesse segmento é o embandeiramento de postos independentes ou uma eventual ida para o exterior.
Depois do Brasil, a Argentina é o segundo maior mercado de combustíveis na região - no país vizinho, a Shell é vice-líder em distribuição, com cerca de 20% de participação. Aqui, a Raízen disputa ponto a ponto o segundo lugar no ranking com a Ipiranga, do grupo Ultra. Cada uma tem em torno de 20%. A líder de mercado é a BR Distribuidora, controlada por Petrobras, com aproximadamente 30% da venda total.
Com a aquisição, a Raízen vai incorporar vendas de cerca de 6 bilhões de litros por ano, uma rede com 645 postos em 20 províncias, uma refinaria, uma planta de lubrificantes, três terminais terrestres, duas bases de abastecimento em aeroportos e ativos de gás liquefeito de petróleo (GLP). A refinaria, uma novidade no portfólio da companhia brasileira, responde por 17% da capacidade de destilação de petróleo da Argentina. No país, ao contrário do Brasil, as distribuidoras têm suas próprias refinarias.
No ano passado, as operações na Argentina registraram receita líquida de US$ 3,3 bilhões (pró-forma). O Ebitda (resultado antes de juros, impostos, depreciação e amortização) tem potencial no primeiro ano de operação de US$ 250 milhões.
Em 2017, segundo dados do balanço da Cosan, a Raízen Combustíveis teve receita líquida total de R$ 72,8 bilhões e Ebitda ajustado de R$ 2,94 bilhões.
O anúncio foi bem recebido pelos investidores, especialmente pelo preço a ser pago pela Raízen, que não inclui assunção de dívidas. O BTG Pactual estima que os ativos na Argentina podem valer US$ 1,7 bilhão, 80% acima do valor da transação, considerando-se uma geração de Ebitda similar às dos postos de combustíveis no Brasil. Na bolsa paulista, as ações da Cosan subiram ontem 4,63%, cotadas a R$ 39,55 no fechamento.
O negócio da Shell na Argentina atraiu uma série de interessados, entre os quais a chilena Luksic, Trafigura, Vitol, PetroChina, Pluspetrol e Southern Cross Group. Outra brasileira, a Ipiranga, chegou a avaliar a oportunidade, mas não entrou no processo de concorrência.
No Brasil, a rede Shell encerrou 2017 com 6.272 postos. A empresa distribui aproximadamente 25 bilhões de litros de combustíveis para os segmentos de transporte, indústria e varejo.
A transação ainda está sujeita à concretização de determinadas condições precedentes, como o desinvestimento parcial dos ativos relacionados à operação de exploração e produção de produção, bem como outras usuais para operações como essa, informou a Raízem em comunicado. (Colaborou Marcelle Gutierrez)