Fonte: Valor Econômico
O programa de desinvestimentos da Petrobras na área de refino marca um novo ciclo de abertura do mercado brasileiro. Segundo especialistas consultados pelo Valor, o principal desafio da estatal será vencer a desconfiança dos investidores em relação ao passado de controle de preços no Brasil.
A iniciativa privada passou por idas e vindas no país ao longo da história. O anúncio da venda de ativos da Petrobras acontece, aliás, no mês em que a nacionalização do refino, que ainda na era Getúlio Vargas afugentou os investidores estrangeiros do país, completa 80 anos. Hoje, apenas 1% da capacidade de refino nacional está nas mãos de empresas privadas.
O consultor João Carlos de Luca, que foi presidente da Repsol YPF no Brasil, último grande investidor privado no parque de refino nacional, explica que a política de controle de preços no governo PT foi o motivo pelo qual a hispano-argentina resolveu sair do país. A companhia era sócia da Petrobras na Refap (RS), mas resolveu vender em 2010 sua fatia de 30% no ativo.
"Nossa principal recomendação [para o sucesso da venda de ativos da Petrobras] é garantir a liberdade de preços", afirmou.
Diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Décio Oddone destaca que a lei garante preços livres no país desde 1997. "Não é por falta de lei [que o Brasil não atrai investimentos], e sim por falta de confiança e de prática [de liberdade de preços]", afirmou.
Consultor da Datagro e um dos membros do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), Plínio Nastari acredita, por outro lado, que a venda do controle das quatro refinarias anunciadas pela Petrobras funcionará como uma espécie de "vacina" contra a volta da intervenção de preços no país.
"Se há controle por uma empresa privada, fica mais difícil o sócio [a Petrobras, controlada pela União] querer interferir em preços", afirmou Nastari.
O presidente da Petrobras, Pedro Parente, reconhece que atrelar os preços da empresa à cotação internacional do petróleo é "peça-chave" para atrair investidores.
"Temos que mostrar que o país está convicto sobre a política de preços [da Petrobras], porque é uma variável fundamental, peça-chave [para atrair investimentos]. A empresa não tem outro caminho. Sem ela [atual política de preços], ou a companhia toma prejuízo ou perde 'market share'", disse.
Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), diz que as grandes petroleiras estrangeiras têm, em geral, reduzido sua atuação no mercado mundial de refino, mas que os ativos da Petrobras têm potencial para atrair comercializadoras (tradings). Nos últimos anos, elas aumentaram a presença no país, de olho na importação de combustíveis.
O potencial do mercado nacional de derivados, o sétimo maior do mundo e que tem previsão de crescimento de 1,8% ao ano até 2030, segundo a Petrobras, é apontado como um atrativo.
"Não há lugar no mundo melhor que no Brasil [para investimentos em refino]... Estamos exportando 1 milhão de barris/dia de óleo cru e importando 600 mil barris/dia de derivados", disse o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix.
Para o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP) existem desafios a serem enfrentados, para possibilitar a atração de investidores. Um deles é a necessidade de uma revisão "pontual" do regime tributário, de forma a reduzir a evasão fiscal no país. Outro é que a regulação sobre o livre acesso às instalações ociosas garanta os direitos do proprietário, além de respeito aos contratos.
Outro desafio para o modelo de parcerias em refino será o processo eleitoral este ano.