Folha de S. Paulo
Depois de negar à Raízen (Shell) o acesso a informações de postos que a delataram por sugerir ou determinar os preços cobrados do consumidor final, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) avalia agora atender a empresa parcialmente.
A ideia é entregar à distribuidora dados agregados, que, em tese, não permitam identificar os varejistas denunciantes.
O que interessa a Shell é um anexo sigiloso de um inquérito que apura se ela adota práticas abusivas, entre elas a de indicar aos revendedores de sua rede qual preço devem praticar nas bombas.
Para essa investigação, o Cade ouviu de 144 postos consultados relatos da suposta conduta. Entre eles, 40 informaram ainda que a empresa retalia aqueles que não seguem sua indicação, aumentando o valor de custo do combustível fornecido.
A companhia tentou acesso às informações sigilosas duas vezes, sob o argumento de que isso seria necessário para exercer seu direito de defesa.
Primeiro, pediu para recebê-las integralmente, o que incluiria as respostas dadas pelos comerciantes e sua identificação. O Cade negou, ante o risco potencial de os denunciantes serem retaliados.
Diante da negativa, a Shell pediu que lhe fosse entregue o mesmo conteúdo, mas sem a lista dos varejistas delatores, constando apenas os municípios em que estão instalados. Foi quando se deu o recuo no Cade.
Em petição anexada ao processo, a Associação Brasileira de Revendedores de Combustíveis Independentes e Livres (Abrilivres) alertou que a empresa poderia chegar aos nomes dos revendedores sabendo apenas seus municípios, por meio de cruzamento de dados.
Na última quinta (28), o superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto, negou o segundo pedido feito pela distribuidora. O despacho foi publicado no sistema e mantido até a última segunda (1), quando foi cancelado e retirado do processo por “erro material”.
Segundo pessoas com acesso ao processo, ouvidas pela coluna reservadamente, a negativa será mantida, mas o órgão avalia uma forma de entregar as informações sem que seja possível identificar algum posto.
A situação é delicada para o próprio Cade, uma vez que eventual descoberta dos nomes descredibiliza o órgão em futuras consultas a integrantes do mercado que possam contribuir com investigações.
Os relatos dos postos foram feitos em resposta a questionários enviados pelo Departamento de Estudos Econômicos (DEE) do Cade a postos da rede Shell em nove estados.
O processo ainda não tem prazo para ser julgado.
Na quarta (3), a Shell apresentou defesa ao Cade, pediu o arquivamento do caso e reiterou seu interesse nas informações sigilosas do processo.
“A negativa de acesso a tais informações, além de ferir direitos constitucionais, limita a habilidade da Raízen de apresentar outras justificativas para os fatos narrados e de afastar equívocos e interpretações enviesadas que possam estar prejudicando o esclarecimento desta autoridade sobre os fatos e o funcionamento do mercado”, escreveu.
Consultada, a Raízen não quis comentar o caso.