Fonte: O Estado de São Paulo
O preço do petróleo está muito esticado e deverá tomar um tombo mais adiante. Mais uma vez, a Opep, liderada pela Arábia Saudita, aproveita um momento propício de mercado para privilegiar o curto prazo em detrimento do futuro. Os sauditas querem muito um preço elevado (entre US$ 80 e US$ 100 o barril) porque o jovem príncipe que assumiu o poder no reino tem pressa e grandes planos. Antes de tudo porque deseja abrir parte do capital da Aramco, sua empresa de petróleo. Quanto maior o preço do produto, maior o valor das ações no mercado.
Além disso, o governo tem um ousado plano de gastos que necessita de recursos. Vale observar que o Irã foi atropelado por causa de sua visão mais moderada dos objetivos da política da Opep.
O preço do barril do tipo Brent está sendo negociado na faixa dos US$ 75 e poderá testar até os US$ 80. Como foi possível chegar até aqui?
Existem pelo menos quatro razões para esse movimento. Os EUA cresceram mais que o esperado desde o segundo semestre de 2017, bem como outras regiões do mundo. As projeções do FMI têm sido continuamente revisadas para cima, de setembro até hoje, o que eleva o consumo de petróleo.
No mercado de commodities, essa melhora na demanda estimulou uma grande operação, nos quais os fundos ficaram comprados em petróleo (longos) e vendidos em produtos agrícolas (short), ganhando muito dinheiro com isso. A lógica de vender produtos agrícolas é que o mercado vinha naquele momento muito abastecido, depois de dois anos de sólidas safras nos EUA e na América do Sul. A recente seca na Argentina e a consequente alta nos preços dos grãos levaram a uma redução das posições vendidas.
O terceiro fator foi uma inesperada surpresa: de setembro de 2017 até agora a produção de petróleo da Venezuela tomou um tombo, diminuindo a oferta em mais de 500 mil barris por dia. Aparentemente, esse colapso resultou da falta de pagamento às empresas operadoras de plataformas e da não manutenção de equipamentos em geral, em mais um capítulo da tragédia daquele país.
Finalmente, e para espanto de muitos, a Opep, com a ajuda da Rússia, vinha até setembro cumprindo rigorosamente a meta de corte da produção estabelecida no início do ano passado, de quase 1,2 milhão de barris/dia. Foi nesse momento que a surpresa venezuelana começou a pressionar o mercado e, com a ajuda de outros países do cartel, atingiu-se um corte superior a 1,9 milhão de barris/dia, agora em março, pressionando estoques e cotações.
Essa situação dificilmente vai se sustentar e, como muitas vezes no passado, vai acarretar custos no curto e no médio prazos. No curto prazo, os preços elevados começam a cortar um pouco da demanda (como é o caso do Brasil) e a estimular o aumento de produção em muitos lugares, particularmente nos EUA. Ali, o esforço de produção está crescendo, especialmente na área de rochas conhecida como "shale", onde o número de perfuradoras em operação aumentou de 740, em janeiro, para 820, na semana passada.
Em segundo lugar, os EUA caminham para um esfriamento da economia. O excesso de demanda resultante da expansão fiscal num país já perto do pleno emprego deverá gerar pressões inflacionárias, que estão sendo reforçadas pelo protecionismo. Por exemplo, o preço de bobinas a quente de aço já subiu 37% neste ano. Com isso, os mercados estão antecipando mais três elevações de juros em 2018, e a taxa do papel do Tesouro americano de dez anos atingiu 3% nesta semana.
Em algum momento do futuro próximo, os preços do petróleo perderão a sustentação. Olhando mais adiante, a expansão da energia renovável (eólica e solar) e a esperada massificação do carro elétrico deverão antecipar o momento de pico da demanda global de petróleo, para algum momento entre 2025 e 2030. Essa é a nova visão de importantes atores, como a Shell. É claro que a alta atual do óleo vai acelerar esse final.
Com essa perspectiva, muitas empresas do setor estão se encaminhando para virar produtores de energia sustentável. Da mesma forma, o modelo de partilha existente no Brasil fica ainda mais equivocado, pois seu objetivo é aumentar o "take" do governo em óleo, o que só ocorre muitos anos após o início da exploração dos campos. Teremos mais petróleo, mas a que preço?
José Roberto Mendonça de Barros - Economista e sócio da MB Associados